Rezar, jejuar e amar

Imagem: PxHere

Por Dom Leomar Antônio Brustolin
Arcebispo de Santa Maria (RS)

 

A quaresma propõe alguns exercícios que evidenciam o caráter de conversão. Na Quarta-feira de cinzas escuta-se o Evangelho de Mateus (Mt 6,1-8.16-18) onde Jesus faz referência à esmola, à oração e ao jejum. São posturas que visam uma nova relação do ser humano consigo mesmo, com os outros, com as coisas criadas e com Deus. 

A oração, portanto, não é considerada como uma tentativa de pedir a Deus que cumpra a nossa vontade, mas é uma entrega total e generosa nas mãos do Pai. Intensificando a oração, o cristão tem maior abertura para Deus, não apenas para pedir ou agradecer, mas para escutá-Lo. Quem reza percebe que nenhuma tribulação ou euforia desse mundo duram para sempre. Em tempos de tanta agitação e ativismo, muitos esquecem de cultivar essa comunicação amorosa com a Trindade. Na oração quaresmal recordamos o Cristo que rezava no deserto, na montanha, no jardim. A oração é um diálogo com Deus. Falamos e escutamos.  Sem a oração não nos convertemos.  

A prática do jejum quaresmal, especialmente na quarta-feira de cinzas e na Sexta-feira Santa, bem como a abstinência de carne nas sextas-feiras, são gestos externos que devem revelar uma conversão interior. Não se trata de um formalismo, pois é inútil abster-se de alimentos sem mudar a mentalidade e rejeitar o que nos afasta de Deus. Aqui não há um desprezo do corpo, nem das realidades do mundo. O que é visível e material é necessário para o equilíbrio da vida. O princípio fundamental do jejum não é o sofrimento em si mesmo, mas a dor transformada em amor. É como o grão de trigo que morre para produzir muito fruto (Jo 12, 24). Esta prática permite unificar o nosso ser e a nossa relação com as coisas criadas. No comer e beber nos apropriamos das coisas. A comida e a bebida simbolizam tudo o que envolve o ser humano. Abster-se de um pouco delas revela que não nos deixamos escravizar pelas coisas deste mundo. Jejuar é controlar-se, é esvaziar-se de si para dar espaço para Deus e para os valores que estão além do mundo visível. Trata-se de buscar uma liberdade e um domínio sobre a natureza e o mal capazes de vencer as tentações.  

Enfim, não há conversão a Deus sem atenção ao amor fraterno.  A esmola, portanto, pode ser traduzida em gestos de caridade e transformação social. Ela visa melhorar o nosso relacionamento com o próximo. Dar esmola é dar de graça, sem pensar na recompensa. É uma atitude de compaixão. Através deste ato, rompem-se as barreiras do individualismo egoísta, do narcisismo e do fechamento. Celebra-se o compromisso comum de viver a partilha e a comunhão. Este amor gratuito não doa apenas coisas, mas também tempo, disponibilidade, serviço, talento e acolhida ao outro. A esmola pode não superar todos os problemas sociais, mas é um exercício contínuo de promoção humana. Nada mais estranho ao Evangelho do que o cinismo e apatia em relação ao outro. Graças a essa consciência caritativa, nossa Igreja se compromete com a economia solidária, o cooperativismo, o cuidado com a dependência química e com a todas as pessoas socialmente excluídas e moralmente perdidas. 

Fonte: CNBB

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