Mensagem do Cardeal Claudio Hummes aos participantes da Assembleia Eclesial

Cardeal Cláudio Hummes - Vatican News

Mensagem do Cardeal Claudio Hummes

Aos Participantes da Assembleia Eclesial da América Latina e do Caribe

Cidade do México – 27/11/2021

 

Senhoras e senhores,

Irmãos e irmãs,

Os tempos atuais são difíceis, desafiadores, mas também abertos a inovações e novos sonhos, tanto para a família humana global como para a Igreja e a sua missão. Exemplo disto é esta Assembleia Eclesial do Celam que estamos realizando. Podem inspirar-nos hoje palavras do Papa Francisco na homilia da missa que ele celebrou logo após sua eleição com os cardeais do Conclave. Trata-se das palavras caminho e caminhar. A Igreja não pode ficar sentada em casa confiando na segurança dos muros que construiu para se preservar. É preciso derrubar os muros e construir pontes para sair. A Igreja em saída, como se diz! Ir ao encontro dos povos, das comunidades e das pessoas, ao encontro de todos, mas especialmente ao encontro das periferias geográficas e existenciais, para escutá-las e com elas construir novos caminhos. Sim, novos caminhos. Para a missão da Igreja no mundo de hoje, esses caminhos serão caminhos eclesiais, caminhos sinodais. Aliás, a palavra sínodo significa: um caminho feito juntos.

Esses caminhos foram praticados já na Igreja primitiva. Em que à luz do Espírito Santo as comunidades inteiras, pastores e leigos, participavam na construção do caminho. Por exemplo, nos Atos dos Apóstolos se diz: Então, pareceu bem aos apóstolos e aos anciãos de acordo com toda a Igreja e decidimos o Espírito Santo e nós. E nos tempos modernos foi o Concílio Vaticano II que renovou esta eclesiologia. A renovou com o conceito de Igreja, povo de Deus. Esse conceito sabemos se baseia na doutrina do sensus fidei (o sentido da fé), o sensus fidelium (o sentido dos fiéis), significando com isso que todos os cristãos, pastores, religiosos e leigos, pela fé e o batismo recebem do espírito Santo esta qualificação do sensus fidei. Ou seja, o simples cristão, não bispo, também tem o farol para ajudar a identificar o rumo a seguir para viver autenticamente o evangelho hoje e para anunciá-lo hoje. Portanto, cada cristão também tem esse faro e deve poder ajudar a Igreja. Assim se superava a concepção de uma Igreja piramidal, na qual a hierarquia dos pastores é quem dirige e os demais fiéis apenas obedecem.

O Papa Francisco remota essa doutrina do Vaticano II e resgata de forma inovadora a prática do caminhar juntos. Essa prática da, então, chamada sinodalidade. Na construção dos rumos da Igreja hoje e no futuro, dando a este caminhar juntos o nome de eclesial. Uma instituição eclesial significa, portanto, uma instituição pastoral e missionária, constituída não somente de bispos, mas também de representantes das demais categorias do povo de Deus. E assim chegamos à nossa Assembleia Eclesial do CELAM, composta não somente de bispos, mas também de representantes das demais categorias do povo de deus na América Latina e Caribe.

Contudo, na caminhada para chegarmos a esta Assembleia eclesial houve um longo processo, um longo processo, iluminado pelo Espírito Santo e que vale a pena recordar. Esse processo iniciou com uma prática de uma Igreja em saída que derrubou muros e construiu pontes para ir ao encontro de todos, mas especialmente dos mais sofridos e pobres das periferias geográficas e existenciais da Pan-Amazônia com o objetivo de escutar, escutar e escutar. E então, com eles construir novos caminhos.

O Papa Francisco, no início do seu pontificado, esteve no Rio de Janeiro, como todos lembramos, na Jornada Mundial da Juventude, em 2013. E ali em seu discurso aos bispos brasileiros ele disse: a Amazônia é teste decisivo, banco de prova para a Igreja e para a sociedade brasileira. A igreja está na Amazônia não como aqueles que tem as malas na mão para partir depois de ter explorado tudo que puderam. Não! A Igreja desde o início está presente na Amazônia com missionários, congregações religiosas, sacerdotes e leigos e bispos e lá continua presente e determinante no futuro daquela área. Mas gostaria, diz o Papa, de acrescentar que deveria ser mais incentivada e relançada a obra da Igreja ali na Amazônia para consolidar os resultados no campo da formação de um clero autóctone. E consolidar, vejam, consolidar, por assim dizer, o rosto amazônico da Igreja. E sobre isso, dizia o Papa, por favor, peço para serem corajosos, para serem ousados. Ora, esse impulso do Papa foi decisivo para o que viria daí para frente.

Um processo se pôs em marcha por meio de diversas iniciativas e projetos de reunir a Igreja da Panamazônica no tal caminhar juntos. Contudo, o projeto de unir as igrejas particulares, dioceses, vicariatos, prelazias da Amazônia latino-americana, a Panamazônia, já estava em evolução há mais tempo. Pensava-se em reuni-las todas, essas Igrejas, em rede. Reuni-las em rede para que não se sentissem isoladas em seus esforços de evangelizar o seu respectivo território. Situação agravada pela solidão da floresta e a beira dos rios bem como pela enorme quantidade e diversidade de culturas dos povos originários, os indígenas. Os impulsos vinham principalmente de três pontos: a Caritas do Equador, com Mauricio Lopez, depois o Departamento de justiça e solidariedade (DEJUSOL) do CELAM, com seu então presidente, Mons. Pedro Barreto, hoje cardeal e a Comissão Episcopal para a Amazônia, a cuja frente estava eu desde 2011, da CNBB.

Essa Comissão brasileira começou a visitar sistematicamente, uma por uma, as circunscrições eclesiásticas da Amazônia brasileira, começando por aquelas da floresta. Porém, três grandes reuniões foram também decisivas para encaminhar o processo: a reunião da rede amazônica da caritas do Equador, em Puyo, em abril de 2013; a reunião do DEJUSOL do CELAM y CELAC para proporá criação da possível Rede Pan-Amazônica, feita em Lima – Peru, essa reunião em julho de 2013; e a terceira, a reunião da Comissão Episcopal para a Amazônia brasileira com a participação do DEJUSOL e do CELAC em Manaus, no Brasil, em outubro de 2013; e assim se chegou finalmente à Criação da REPAM, Rede Eclesial Pan-Amazônica, em 12/09/2014 numa reunião em Brasília, da qual participaram e assinaram juntos, como co-fundadores, não somente DEJUSOL, CELAC e Comissão Episcopal para a Amazônia brasileira da CNBB, mas também a CLAR, Confederação Latino-americana e Caribenha dos Religiosas e religiosos. Todos eles, esses quatro assinaram a fundação da REPAM. Foi certamente um momento histórico da Igreja na Pan-Amazônia.

Esse fato histórico é que nos fez chegar a este novo momento de estarmos realizando agora não uma VI Conferência Geral do Episcopado Latino-americano e Caribenho, mas por orientação do Papa Francisco, estamos realizando uma Assembleia Eclesial do CELAM, em que não participam e decidem apenas os bispos, mas todo o povo de Deus, segundo o Concílio Vaticano II.

E dentro desse percurso, o período mais recente nos trouxe também a CEAMA, a Conferência Eclesial da Amazônia, que recebeu do Papa, como sabemos, a sua aprovação canônica agora no dia 09 de outubro passado. Eu percebo a partir daí a CEAMA como aquele ponto firme. A aprovação canônica da CEAMA pelo Papa, a CEAMA tornou-se aquele ponto firme irreversível, não apenas para a missão da Igreja na Pan-Amazônia, mas para a Igreja universal global. Ou seja, o Papa pode agora constituir Conferências eclesiais em qualquer outra parte da Igreja no mundo. É um avanço extraordinário! E para terminar quero finalmente confirmar que a CEAMA deve e quer participar plenamente desta nova fase da Igreja na América Latina e Caribe em termos de uma Igreja Sinodal, que se alimenta das grandes propostas de Aparecida e do Vaticano II.

Agradeço-vos pela atenção.

 

Fonte: Vatican News

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