Maria, “Porta do Céu”

Imagem ilustrativa de Frei Fábio Melo Vasconcelos

Por Pe. Johan Konings

 

Nas ladainhas chamamos Maria “Porta do Céu”. Porta para nós subirmos, ou para Deus descer? A festa de hoje confirma as duas interpretações.

“Nascido de mulher, nascido sob a Lei”, assim Paulo qualifica Jesus (1ª leitura).

Jesus nasceu como todo ser humano de uma mãe humana, Maria, e dentro de uma sociedade humana, a sociedade
de Israel, com sua “lei”, regime ao mesmo tempo religioso e sociopolítico. O evangelho narra que Jesus, no oitavo dia do nascimento, foi acolhido na sociedade judaica pela circuncisão e pela imposição do nome, como teria acontecido a qualquer masculino dentre nós se tivesse nascido naquela sociedade.

Maria é, portanto, mãe do verdadeiro homem e judeu Jesus de Nazaré, mas nós a celebramos hoje como “Mãe de Deus”… Como se conjugam essas duas maternidades? Não são duas, são uma só!.

O título “Mãe de Deus” foi conferido a Maria pelo Concílio de Éfeso no ano 431 d.C. Este mesmo concílio insistiu que Jesus foi igual a nós em tudo menos o pecado (cf. Hb 4, 15) e viveu e sofreu na carne de maneira verdadeiramente humana. Vinte anos depois, o concílio de Calcedônia chamou Jesus “verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem”. É por ser mãe de Jesus humanamente que Maria é chamada Mãe de Deus, pois a humanidade e a divindade de Jesus humanamente que Maria é chamada Mãe de Deus, pois a humanidade e a divindade de Jesus não se podem separar. Dando Jesus ao mundo Maria deu Deus a todos nós.

Em Jesus, Maria faz Deus nascer no meio do povo. Maria é o ponto de inserção de Deus na humanidade. Neste sentido ela é “porta do céu”, porta para Deus que desce até nós e pela qual nós temos acesso a Deus. Toda mulher-mãe é ponto de inserção de vida nova no meio do povo. Em Maria, essa vida nova é vida divina. Deus se insere no povo por meio da maternidade que ele mesmo criou.

De maneira semelhante, Deus respeita também a Lei que ele mesmo criou e comunicou ao povo. Seu Filho nasceu sob a Lei e foi circuncidado conforme a Lei. As estruturas políticas e sociais do povo, quando condizentes com a vontade de Deus, são instrumento para Deus se tornar presente em nossa história. Deus mostrou isso em Jesus. E quando as leis e estruturas são manipuladas a ponto de se tornarem injustas, o Filho de Deus as assume para as transformar no sentido do seu amor. Por isso, Jesus morreu por causa da Lei, injustamente aplicada a ele.

Assim como pela maternidade humano-divina Maria se tornou “Porta do Céu”, a comunidade humana é chamada a tornar-se acesso de Deus ao mundo e do mundo a Deus. A vida do povo, suas tradições, cultura e estruturas políticas e sociais devem ser um caminho de Deus e para Deus, não um obstáculo. Por isso é preciso transformar a vida humana e as estruturas da sociedade, quando não servem para Deus e não condizem com a dignidade que Deus lhes conferiu pelo nascimento de Jesus de mulher e sob a Lei.

Fonte: Franciscanos


PE. JOHAN KONINGS nasceu na Bélgica em 1941, onde se tornou Doutor em Teologia pela Universidade Católica de Lovaina, ligado ao Colégio para a América Latina (Fidei Donum). Veio ao Brasil, como sacerdote diocesano, em 1972. Em 1985 entrou na Companhia de Jesus (Jesuítas) e, desde 1986, atuou como professor de exegese bíblica na FAJE, Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, em Belo Horizonte. Faleceu no dia 21 de maio de 2022.  Este comentário é do livro “Liturgia Dominical, Editora Vozes.

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