Óbolo de São Pedro para apoiar a missão da Igreja

Padre Juan Antonio Guerrero (Society of Jesus)

Às véspera da tradicional coleta em apoio à caridade e ao serviço do Papa à Igreja universal, o Prefeito da Secretaria para a Economia ilustra os dados da coleta e do uso dos fundos: “As pessoas têm o direito de saber como gastamos o dinheiro”.

 

“É importante colaborar porque não podemos pensar que a missão da Igreja possa ser sustentada sem a contribuição dos fiéis. A proclamação do Evangelho em todo o mundo, com tudo o que isso implica, pressupõe uma estrutura de apoio”. Na véspera da coleta do Óbolo de São Pedro, o Prefeito da Secretaria para a Economia, o jesuíta Juan Antonio Guerrero Alves, explica nesta entrevista como são utilizados os fundos coletados: as intervenções caritativas e a contribuição para o serviço do Papa às Igrejas no mundo.

Padre Guerrero, muitas pessoas fazem perguntas e querem saber sobre o Óbolo, depois de tantas notícias contraditórias.

Antes de tudo, gostaria de dizer que as pessoas têm o direito de saber como gastamos o dinheiro que nos é dado. Às vezes as contradições surgem da falta de conhecimento, que por sua vez também pode surgir da falta de transparência. Quando comecei meu serviço como Prefeito da Secretaria para a Economia, o Santo Padre me pediu que prestasse atenção especial à transparência. Durante este período na SpE procurei compartilhar com os fiéis os dados econômicos da Santa Sé que conheço e que me pareceram relevantes.

Para que serve, então, o Óbolo?

Fala-se da caridade do Papa, e é assim. A caridade, naturalmente, é oferecer doações às Igrejas locais, instituições, famílias ou pessoas necessitadas. Mas não se trata somente de dinheiro que chega a Roma e que o Vaticano distribui em diversas partes do mundo para obras de caridade. Esta é uma parte da finalidade do Óbolo. Ou seja, há doações para o Óbolo que chegam e são imediatamente distribuídas nos lugares onde há necessidade. Para dar um exemplo do que sei por conhecimento direto: em 2021, desde quando está sob a supervisão e o controle da Secretaria para a Economia, até hoje o Óbolo recebeu 21 milhões de euros em doações (ainda pode haver algumas doações do ano passado que chegaram mais tarde). Destes, 8 milhões de euros foram distribuídos para a evangelização ou para projetos sociais de apoio às Igrejas necessitadas, principalmente em países da África, Ásia e América Latina. O desenvolvimento no primeiro semestre do ano, quando mais doações diretas são feitas, deve ser semelhante ao dos anos anteriores.

Mas o Óbolo não é usado apenas para obras de caridade…

De fato, é também importante explicar e compreender que parte da caridade do Papa diz respeito à sua missão de unidade na caridade, que ele realiza através dos dicastérios e instituições da Cúria Romana a serviço da Igreja universal. Uma parte do orçamento de alguns dicastérios é destinada a ajudar as Igrejas necessitadas e em situações humanas difíceis, mas isso geralmente não é a parte principal de sua missão, que é a de oferecer seu serviço específico à Igreja universal. Estas instituições da Cúria não têm renda própria e geralmente não recebem compensação financeira por seus serviços. Pensemos no serviço da unidade da fé, na liturgia, nos tribunais da Igreja, na comunicação do Papa, no cuidado do patrimônio recebido ao longo dos séculos na Biblioteca ou nos Arquivos, onde documentos importantes da história da humanidade são conservados, as representações papais no mundo, etc., etc. Estes serviços prestados à Igreja universal não geram renda e são parcialmente financiados pela coleta do Óbolo.

Fala-se frequentemente de um fundo milionário do Óbolo. O senhor pode explicar por que parte da coleta do Óbolo é poupada e por que se constitui um fundo?

Quanto à poupança e ao fato de que existe um fundo do Óbolo há décadas, uma explicação básica é que quando entram grandes doações extraordinárias, por exemplo, uma grande herança para a missão do Papa, não parece prudente gastá-la imediatamente durante o ano. Ela pode ser usada posteriormente, para quando houver mais necessidade, ou pode ser criado um fundo para apoiar projetos ao longo do tempo. Economizar nos anos em que menos se precisa, para quando mais se precisa, é algo sensato e prudente. Naturalmente, essas economias devem ser administradas com cuidado, de acordo com os princípios da doutrina social da Igreja, com a prudência de um bom pai de família e com a consciência de que o que recebemos a cada ano não cobre todas as despesas da missão.

A crise econômica causada pela pandemia afetou muito a última coleta do Óbolo?

Notamos uma diminuição na coleta nos últimos anos. Entre 2015 e 2019, a coleta diminuiu em 23%. Além desta diminuição, em 2020, o primeiro ano da COVID, a receita do Óbolo foi 18% menor. É provável que a crise relacionada à pandemia seja sentida novamente este ano. Algumas doações recebidas têm um destino final específico, outras são ofertas para o Santo Padre em geral. Em 2019 a arrecadação do Óbolo foi de 53,86 milhões, distribuídos da seguinte forma: 43 milhões no fundo geral Óbolo e 10,8 milhões com destinos especiais para situações de necessidade na Igreja e no mundo. Em 2020 a coleta foi de 44,1 milhões de euros distribuídos da seguinte forma: 30,3 milhões para o Óbolo geral e 13,8 milhões para destinos especiais.

O senhor pode esclarecer mais precisamente o que quer dizer com “destinos especiais”?

Quando falamos de um destino especial ou específico, falamos de doações específicas, por exemplo, para a construção de igrejas em países do terceiro mundo, serviços sociais como hospitais infantis ou apoio a escolas em áreas de pobreza, apoio à presença de comunidades religiosas em áreas difíceis por causa da violência ou pobreza, formação de agentes pastorais, etc. Os projetos sociais, nestes destinos, recebem a maior parte. Se recebemos uma doação com um propósito já definido e a aceitamos, respeitamos a vontade do doador. Por outro lado, nos orçamentos de alguns dicastérios, neste ano de menor receita, as despesas de apoio às Igrejas em dificuldade aumentaram, como no caso do Dicastério para o Desenvolvimento Humano Integral, que aumentou suas despesas para apoiar algumas situações mais penalizadas este ano.

Padre Guerrero, por que é importante colaborar? Por que doar para o Óbolo?

É importante colaborar porque não podemos pensar que a missão da Igreja possa ser sustentada sem a contribuição dos fiéis. A proclamação do Evangelho em todo o mundo, com tudo o que isso implica, pressupõe uma estrutura de apoio. A Igreja sempre viveu desta maneira. Como disse o Papa Francisco em sua mensagem às Pontifícias Obras Missionárias, a Igreja sempre foi em frente graças ao óbolo da viúva, à contribuição de inúmeras pessoas que são gratas pelo dom da fé e que dão o que podem. Já no início da Igreja, São Paulo promoveu uma coleta em favor da Igreja em Jerusalém (cf. 1 Cor 16,1). Em suas cartas, o Apóstolo dá alguns critérios centrados no princípio da comunhão das diversas comunidades da única Igreja.

O Óbolo foi frequentemente citado pela mídia nos últimos anos por causa de seu investimento no fundo proprietário do edifício Sloane Avenue em Londres: muito dinheiro foi perdido através desta operação?

Esta é uma história dolorosa. É sempre verdade que nos investimentos às vezes se ganha e às vezes se perde. Mas se houveram irregularidades, devemos entendê-las e punir os responsáveis. Os investimentos do Óbolo estavam tradicionalmente junto com investimentos de outros fundos destinados à Secretaria de Estado. Não era fácil dizer que esta parte, estas ações ou este edifício pertencem ao Óbolo e isto pertence a outros fundos. Como eu estava dizendo, a Santa Sé enveredou por um caminho de transparência e este caminho também inclui o esclarecimento de episódios pouco claros. O que pode ser dito, entretanto, é que as desvalorizações e perdas do edifício em Londres – suponho que isto foi feito por respeito às doações dos fiéis – não caíram sobre os fundos do Óbolo, mas sobre outros fundos detidos pela Secretaria de Estado. Isto foi decidido quando foi feita a distribuição da contribuição de cada fundo para as perdas.

Muitos números foram escritos, falou-se de cerca de 800 milhões de euros… O senhor pode nos dizer quanto dinheiro o Fundo do Óbolo realmente tem?

Falar de 800 milhões de euros… me parece uma fantasia! Nas contas que vi, o patrimônio líquido de todos os fundos da Secretaria de Estado nos últimos dez anos sempre foi bem inferior a este montante. O fundo do Óbolo em 2015 era de 319 milhões. Nos últimos anos foram gastos em média 19 milhões de euros a mais do que as entradas. Em 31 de dezembro de 2020, o fundo Óbolo tinha cerca de 205 milhões de euros, parte deles em investimentos pouco “líquidos”, incluindo o famoso edifício de Londres. O fundo do Óbolo foi descapitalizado nos últimos anos devido às despesas dos dicastérios da Cúria, que precisavam de mais do que de quanto estava sendo coletado. É óbvio que não pode mais ser assim. 

Quem administra hoje os fundos do Óbolo?

Até o ano passado, as doações do Óbolo eram recolhidas e administradas pela Secretaria de Estado. Em dezembro de 2020, foi publicado um Motu proprio com o qual os fundos foram transferidos para a APSA. Quanto à coleta, uma grande parte dela ocorre nas Igrejas durante a coleta da Festa de São Pedro, em 29 de junho. No ano passado, em muitos países, devido ao fechamento de igrejas por causa da pandemia, a coleta foi transferida para 4 de outubro, a festa de São Francisco. Este ano acontecerá novamente no dia de São Pedro. As igrejas locais enviam a coleta para as dioceses, e as dioceses a enviam para as nunciaturas, que, por sua vez, a enviam para Roma. Muitos fiéis doam diretamente através da página web ou com transferência direta para as contas da IOR. Quanto ao Motu proprio de dezembro passado, ele corresponde à necessidade de garantir a máxima transparência, na distinção de funções na unidade da missão. A Santa Sé é uma só. Estamos todos a serviço da missão do Papa, Sucessor de Pedro. A gestão e administração do fundo e dos recursos é agora de competência da APSA, ainda que, naturalmente, a Secretaria de Estado, que através das nunciaturas conhece melhor as necessidades das Igrejas e dos países, seja a que designa os projetos a serem ajudados. O controle das receitas e despesas é de responsabilidade da Secretaria para a Economia, onde agora se encontra o Escritório do Óbolo. Esperamos o mais rápido possível poder dar um relato preciso aos fiéis de tudo o que diz respeito ao Óbolo de São Pedro, começando pelas receitas e despesas.

Fonte: Vatican News – Andrea Tornielli

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