No episódio Escutar, segundo da série especial CF 2022 promovida pela Pascom Brasil, o coordenador-geral Marcus Tullius conversa com a doutoranda em Educação, membro do Grupo de Trabalho sobre o Ensino Religioso da Comissão Episcopal para Cultura e Educação da CNBB e da Pastoral da Educação do Regional Leste 1, Beatriz Leal, e o bispo auxiliar de Belo Horizonte, presidente da Comissão Episcopal Pastoral para a Comunicação da CNBB e reitor da PUC Minas, dom Joaquim Mol. Eles ajudam na compreensão dos elementos de interpelação da educação formal no Brasil, os desafios postos pela pandemia de covid-19 e a pedagogia da escuta no processo educativo.
Para conferir o episódio, basta acessar o Spotify e outros agregadores de podcast, como Anchor, Apple Podcasts, Google Podcasts, dentre outros. Confira a íntegra do bate-papo:
A professora Beatriz Leal destaca que o escutar é fundamental no momento que estamos vivendo.
“O escutar requer proximidade e é isso o que estamos precisando cada vez mais na educação. Estamos passando neste momento em que tantos alunos tiveram perdas de familiares próximos, perda de contato com os professores e colegas da escola. Então, neste momento, o escutar é fundamental para nós educadores e para a Igreja. Ele traz esta proximidade e nos remete à pedagogia de Jesus, nosso mestre e educador por excelência.”
Sobre a mudança das palavras no método indutivo, que aparece no texto-base da Campanha da Fraternidade 2022 como escutar – discernir – agir, dom Mol afirma que este não pode ser um modismo, mas deve ser compreendido na sua profundidade. “Eu acredito que o escutar envolve os outros sentidos. O escutar tem que ser olhando, não podemos dispensar o olhar porque estamos escutando. Há coisas que a gente só escuta com os olhos, tocando, cheirando, saboreando”, destacou.
“Os sentidos elevam o ser humano à condição de ser único na natureza. Essas cinco maneiras completamente integradas de captar a realidade, para devolver ações bem feitas, é algo muito importante. Portanto, o escutar proposto pela Campanha da Fraternidade e também proposto para a Assembleia Eclesial da América Latina e Caribe, para os Sínodo, para os conselhos pastorais, devem sempre envolver os cinco sentidos.”
Beatriz Leal, que atuou como Coordenadora Estadual do Ensino Religioso na Secretaria de Educação do Estado do Rio de Janeiro de 2010 a janeiro de 2022, partilhou a responsabilidade de decisão enquanto gestora pública no início da pandemia. “A gente sempre fala da escola do século 21, que precisávamos derrubar os muros, que elas deveriam ultrapassar os muros, e isso aconteceu de uma hora para outra. A escola do século 21 teve que ser implementada, a educação on-line teve que entrar em nossa vida. As casas se tornaram escolas e tudo isso nos trouxe uma lição de que reinventar é possível e é necessário.”
A professora ainda destaca que no início da pandemia, em março de 2020, a Igreja no Brasil celebrava a Campanha da Fraternidade que trazia o tema Dom e Compromisso, e a necessidade de implantar a escuta na prática pastoral, especialmente para apoiar aqueles que estão retomando suas atividades.. “E agora nós temos este compromisso de rever o papel da educação, do educador, dos gestores para acolher os nossos alunos que estão voltando de um período de tantas fragilidades. O nosso professor que está voltando de um período com tanta fragilidade”, reforçou.
O bispo auxiliar de Belo Horizonte destaca que, no Brasil, a população atingida diretamente pela educação é maior do que a população total de muitos países e a responsabilidade coletiva. Contudo, ainda há um percentual baixo de jovens que ocupa os espaços escolares. “A pandemia fez a gente acordar que quem trabalha com educação constitui-se numa multidão de pessoas. Portanto, não se trata de uma escola aqui, outra ali. Qualquer medida que for impactar minimamente, mexe com a vida de milhões de pessoas.
“A educação não é como um rio, em que a gente se coloca de um lado e vê o outro lado da margem. A educação é como o mar, que a gente se coloca na margem e não consegue ver o outro lado, da tamanha vastidão que nos impacta, e impacta muito”, comparou dom Mol.
Interrogada sobre a recuperação dos prejuízos da pandemia, Beatriz respondeu esperançosa e convicta de que é possível “com toda certeza”. Mesmo com o aumento das desigualdades nestes dois anos mais intensos da pandemia, há uma lacuna muito grande. A professora, que tem formação em História, ressalta que nós já passamos por outras pandemias em épocas diferentes, mas que é possível recuperar. “A sociedade como um todo já passou por duas grandes guerras. Imagina o impacto das outras pandemias, da primeira e da segunda guerra mundial para a educação? Com certeza, foi muito grande. E essa sociedade precisou ressignificar e reinventar valores para tentar correr atrás dos prejuízos. Essa Campanha da Fraternidade, assim como o Pacto Educativo Global, vem nos mostrar que é possível, mas não é dever e missão só dos educadores. É de toda a sociedade, principalmente das famílias, que estiveram mais próximas da educação formal neste tempo.”
Dom Mol endossa o entusiasmo da professora Beatriz e relata que isso alenta profundamente o interior. “Nós precisamos reafirmar isso. Fácil não é, mas não é impossível. Eu quero agradecer esta afirmação forte e esta convicção com que esta afirmação é dita.”
“Este tema é o acendimento da luz.” É assim que dom Mol começa respondendo sobre a necessidade de uma formação integral e uma educação humanista. Recorrendo ao Papa Francisco, em um discurso sobre educação, afirma que “estamos vivendo uma profunda crise antropológica, porque nossas sociedades são completamente desumanizadoras e porque nós temos uma pobreza de interioridade muito grande”.
“Qual é o estatuto existencial de cada pessoa, ou da condição humana? Refletir sobre isso em uma sociedade que desumaniza e que está cheia de pessoas que estão com uma pobreza de interioridade enorme. […] Negar-se à vacinação não é uma questão ideológica, de polarização, é que pobreza de interioridade. É algo realmente muito delicado, mas aqui é a perspectiva da luz que se acende. Todo educador tem que ser acendedor de luz, deve ser soprador de brasa para que o fogo não se apague.”
De forma propositiva, o reitor da PUC Minas acena para três características para a construção de um novo humanismo: educar para a solidariedade; educar integral e inclusivamente; educar para o encontro e a fraternidade.
Confira a série CF 2022, publicado em 1º de fevereiro de 2022, acessando o canal da Pascom no Spotify e outros agregadores de podcast. Para escutar o primeiro episódio, clique aqui.
Fonte: CNBB