Por Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo de Belo Horizonte (MG)
A súplica por uma graça – “Do Céu chova a justiça” – é também alerta para a urgência de se trabalhar pela justiça, à luz do amor maior. A justiça almejada, necessária, deve ser impulsionada pela vivência e pelo testemunho do amor. A justiça é importante, mas o amor é um bem maior. E o Natal do Menino Jesus é o derramamento efetivo do amor maior, inaugurando um novo tempo, que permanentemente renova a história. A vivência do Natal tem força para superar muitas guerras, no local de trabalho, no bairro, em diferentes contextos. Conflitos provocados por inveja e outros sentimentos ruins que contaminam, até mesmo, o coração daqueles que buscam fazer da própria interioridade a manjedoura que é morada do Deus-Menino. O Papa Francisco adverte sobre este mundanismo espiritual que leva cristãos, em celebração do Natal, à alimentação de disputas, com atitudes contaminadas por ódio e rancores – pessoas que encontram qualquer justificativa para agir em busca de poder, prestígio, segurança econômica. É preciso reconhecer que a justiça capaz de salvar o mundo dilacerado por guerras pede o cultivo do amor, único remédio com propriedades terapêuticas para curar o individualismo que alimenta divisões entre os seres humanos.
O testemunho da comunhão fraterna somente se efetiva pela experiência do amor de Deus. Compreende-se, pois, que o Natal é festa da unidade, possibilitando ao ser humano, por graça, exercitar e desenvolver a competência para ser instrumento do especial desejo do Mestre Jesus: “Todos sejam um”. Unidade que ultrapassa o simples sentido de uniformidade. Significa configurar as dinâmicas do viver humano na lógica do amor, alicerce da fraternidade universal que inspira a capacidade para vencer exclusões, para promover o desenvolvimento integral. Só o amor de Deus consegue curar antigas divisões, desencadeando a superação de rancores que impedem a reconciliação. Investir no amor significa agir em conformidade com a real estatura do ser humano: cada um é filho e filha de Deus, a partir do resgate redentor possibilitado pela encarnação do Verbo, Jesus Cristo, o Deus-Menino, que graciosamente vem encontrar a humanidade.
Natal é tempo de perdão, solicitando, assim, de cada pessoa, a disponibilidade para buscar a reconciliação – bálsamo que dissipa muitas dores, força para testemunhar a fraternidade, efetivar gestos de solidariedade, corrigindo rumos. Natal é, acima de tudo, a oportunidade para se compreender e enfileirar-se na Lei do amor, à luz da solidariedade infinita do amor de Deus, que envia à humanidade o seu Filho Amado, o Redentor e Salvador. Trata-se da Lei suprema que pode inspirar a efetivação da justiça, sem a qual acelera-se o desequilíbrio do mundo. Por isso, a confraternização natalina inspira o cultivo do amor uns pelos outros, fazendo valer o princípio evangélico de não se deixar nunca se vencer pelo mal, mas vencer o mal com o bem, conforme ensina o apóstolo Paulo, em carta dirigida aos Romanos. Na verdade, Paulo adverte sobre a importância e necessidade de nunca se cansar de fazer o bem.
Natal é oportunidade de reconciliação, assumindo o compromisso de respeitar e promover os direitos de todos, particularmente dos pobres. Indispensável é, pois, um caminho espiritual de crescimento tendo Deus como horizonte, que leva à verdadeira liberdade. Esse crescimento ocorre a partir da compreensão sobre o sentido e o alcance do Natal: Deus vem ao encontro da humanidade inteira. Compreender o significado genuíno do Natal alicerça a capacidade para bem discernir, abrindo-se à ação do Espírito de Deus. O Natal é, pois, oportunidade para aprender a escutar – virtude essencial aos diálogos que possam promover a justiça. E a fé no Menino-Deus alimenta a convicção indispensável que sustenta o compromisso social, reconhecendo a elevação da dignidade humana pela encarnação do Verbo de Deus.
A redenção que o Natal anuncia não deixa dúvidas sobre a centralidade do amor. Enobrece o ser humano ensinando-o sobre o amor sem limites. Ao celebrar o nascimento de Jesus, desenvolve-se o entusiasmo para lutar pela fraternidade solidária. Nasce e cresce uma sensibilidade social com poder de transformações, a partir de diferentes trabalhos, dinâmicas e legislações que combatem variadas formas de exclusão. Há, pois, um laço indissolúvel entre o Natal do Senhor e o compromisso com a justiça. O Verbo Encarnado, o Menino-Deus, aponta, com sua vinda, este princípio: tudo o que se faz ao menor dos irmãos é a Jesus que se está fazendo. Os augúrios de Natal sejam entendidos e proclamados como súplica e compromisso com a justiça, buscando construir um tempo novo pelas mãos de quem, amorosamente, se faz instrumento do amor maior de Deus. Feliz Natal! Do Céu chova a justiça!
Fonte: CNBB