Por José Antonio Pagola
Ao chegar ao lago de Genesaré, Jesus vive uma experiência muito diferente da que viveu em seu povoado. As pessoas não o rejeitam, mas “se aglomeram ao seu redor”. Aqueles pescadores não procuram milagres, como os moradores de Nazaré. Querem “ouvir a Palavra de Deus”. É disso que precisam.
A cena é cativante. Não acontece dentro de uma sinagoga, mas no meio da natureza. As pessoas ouvem da margem; Jesus fala a partir das águas serenas do lago. Não está sentado numa cátedra, mas num barco. De acordo com Lucas, neste cenário humilde e simples Jesus “ensinava” às pessoas.
Esta multidão vem a Jesus para ouvir a “Palavra de Deus”. Intuem que ele lhes fala da parte de Deus. Não repete o que ouve outros dizerem; não cita nenhum mestre da lei. Essa alegria que sentem em seu coração só Deus pode despertá-la. Jesus os põe em comunicação com Deus.
Anos mais tarde, nas primeiras comunidades cristãs, diz-se que as pessoas se aproximam também dos discípulos de Jesus para ouvir a “Palavra de Deus”. Lucas volta a utilizar esta expressão audaz e misteriosa: as pessoas não querem ouvir deles uma palavra qualquer; esperam uma palavra diferente, nascida de Deus. Uma palavra como a de Jesus.
É o que se deve esperar sempre de um pregador cristão. Uma palavra dita com fé. Um ensinamento arraigado no evangelho de Jesus. Uma mensagem na qual se possa perceber sem dificuldade a verdade de Deus e na qual se possa ouvir seu perdão, sua misericórdia insondável e também seu apelo à conversão.
Provavelmente muitos esperam hoje dos pregadores cristãos essa palavra humilde, sentida, realista, extraída do Evangelho, meditada pessoalmente no coração e pronunciada com o Espírito de Jesus. Quando nos falta este Espírito, brincamos de profetas, mas na realidade não temos nada de importante a comunicar. Frequentemente acabamos repetindo com linguagem religiosa as “profecias” que se ouvem na sociedade.
Fonte: Franciscanos
JOSÉ ANTONIO PAGOLA cursou Teologia e Ciências Bíblicas na Pontifícia Universidade Gregoriana, no Pontifício Instituto Bíblico de Roma e na Escola Bíblica e Arqueológica Francesa de Jerusalém. É autor de diversas obras de teologia, pastoral e cristologia. Atualmente é diretor do Instituto de Teologia e Pastoral de São Sebastião. Este comentário é do livro “O Caminho Aberto por Jesus”, da Editora Vozes.