Por Frei Almir Guimarães
Imediatamente os ouvidos do surdo se abriram, sua língua se soltou e ele começou a falar expeditamente.
Isaías, o profeta, nos poucos versículos da primeira leitura da liturgia da missa desse domingo, enche os espaços com um brado de esperança: Ele vem, o Senhor, vem para salvar. Os cegos enxergarão e os ouvidos dos surdos se abrirão. E o coxo, pasmem, saltará de alegria. Marcos, em seu evangelho, faz o relato de um surdo curado. Jesus fica sendo conhecido como aquele que “tem feito bem todas as coisas: aos surdos faz ouvir e aos mudos falar”.
Aproximemo-nos mais de perto dos pormenores de Marcos. Jesus está na região pagã da Decápole, das cidades gregas. O pessoal lhe traz um homem que não ouvia e que falava com dificuldade. Terrível quando não ouvimos as conversas à nossa volta e quando gaguejamos para dizer o que se passa em nosso interior. Marcos diz que Jesus vai realizar alguma coisa longe da multidão. Podemos supor que se trata de gesto prenhe de significado. Talvez Jesus não quisesse muito alarido, muito gritaria. Os circunstantes trouxeram-lhe o homem para que Jesus lhe impusesse as mãos. Gesto concreto. Transmissão? Sentimento de proximidade de Jesus com o outro? Curiosamente Jesus continua com procedimentos palpáveis, sensíveis e, para nós, até certo ponto estranhos: coloca os dedos nos ouvidos do surdo, cospe, com saliva toca a língua do doente. Tudo culmina com este desfecho: “Olhando para o céu suspirou e disse: “Efatá”, que quer dizer, “abre-te”. Imediatamente seus ouvidos se abriram , sua língua se soltou e ele começou a falar sem dificuldade”.
Há indícios que tudo isso tem a ver com o batismo, com o ingresso do homem no mundo novo de Jesus. A Igreja retomou elementos desta “cura” inserindo-os no ritual do batismo. Os que querem aderir ao mundo novo de Jesus necessitam ouvir a voz do Mestre que vai penetrando com remédio de uma surdez diferente.
Uma das experiências que fazemos, nós cristãos, diante da proposta que nos é feita de viver e viver segundo os sonhos de Deus que Jesus manifestou é da surdez associada ao mutismo de não sabermos dizer ao Senhor o que precisa ser dito. Surdos e mudos perambulamos vida afora.
Na medida em que entramos em nós mesmos, em que vivemos junto com verdadeiros discípulos de Jesus vamos nos dando conta que as circunstâncias, a indolência e a má vontade foram nos impedindo de ouvir a voz da consciência e os apelos do Evangelho para uma vida nova: vida a partir de nossa verdade, revestindo-nos de singeleza e simplicidade, vida de filhos do Pai que nos ama e nos quer e de irmãos dos que caminham ao nosso lado. Somos surdos aos apelos de recolher os jogados à beira da estrada. Colocamos pedras enormes na sede que começou a se manifestar em nós como busca de plenitude. Fomos endurecendo nosso ouvir do coração.
Jesus suspira e nos toca. Sempre o faz coração da comunidade da Igreja que é o albergue do Ressuscitado. Queremos ouvir o murmurar das páginas do Sermão da Montanha, precisamos ouvir os apelos do pai que está doente, que precisa de nós, dos filhos que andam perdidos, da mulher e do marido que são deixados por vezes ficam de lado durante a dança macabra que fazemos em torno de nós mesmos. “Efata” quer dizer abre-te. Não queremos e não podemos nos instalar numa espécie de estado de surdez ao novo, ao que nos redime, ao que torna vida na terra quase que um paraíso.
Abre-te… é uma exigência para podermos enxergar. A luz do Ressuscitado pode então nos penetrar. Nada de ficar fechado em seu pequeno mundo de convicções, mas auscultar os sinais dos tempos. Os que nos aproximamos de Jesus, fora da multidão, poderemos fazer a experiência da libertação dos ouvidos: “ seus ouvidos se abriram e sua língua se soltou e ele começou a falar sem dificuldade”.
Batismo
Effeta… ainda está no rito atual
Como era como começo da Igreja… uma caminhada…
Normalmente batizavam-se os adultos
Um primeiro momento de conversão
A fé, a oração, as renúncias, a vida nova
O esplendor do batismo descrito em Roma.
A noite santa… mergulhar nas águas.. depois a Eucaristia e o Crisma.
Como fazer para que os que são batizados em criança tomem consciência e vivam a vida nova?
Língua
Ter vontade de comunicar-se, não se fechar
A comunicação é gesto de carinho e de caridade
Pessoas de uma vida bonita falam da abundância do coração
Conversas descontraídas…. certo, mas não banalidades, tolices, futilidades o tempo todo.
Abrir a boca para cantar o louvor do Senhor
Ouvidos
Prestar atenção, fazer lugar em si para ouvir o que o outro tem a dizer.
Saber ouvir com o coração e não apenas com o aparelho auditivo.
Saber ouvir os sons da palavras que Deu nos dirige sem palavras: um momento de consciência do mal que cometemos, uma palavra da Escritura que não nos larga, uma pessoa que diz alguma coisa que nunca poderíamos imaginar.
Fonte: franciscanos.org.br
FREI ALMIR GUIMARÃES, OFM, ingressou na Ordem Franciscana em 1958. Estudou catequese e pastoral no Institut Catholique de Paris, a partir de 1966, período em que fez licenciatura em Teologia. Em 1974, voltou a Paris para se doutorar em Teologia. Tem diversas obras sobre espiritualidade, sobretudo na área da Pastoral familiar. É o editor da Revista “Grande Sinal”.