Sete razões para perdoar

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Por Frei Hipólito Martendal

 

Parte I

1. Introdução – O que é odiar? O que é perdoar?

Interessante que antes de fixar a mente na idéia de perdoar, surge a palavra odiar. Considero um dos temas mais comuns e, ao mesmo tempo, mais fundamentais para qualquer projeto de vida cristã, bem como para qualquer sonho de humanização do ser humano em geral e de suas relações com o outro. O individuo pode ser cristão, seguir outra religião, ser ateu, ou simplesmente declarar-se agnóstico se ele considera impossível chegar-se a verdades que estejam além das ciências.

Infelizmente, uma religião, por mais sublime que sejam seus fundamentos e os ideais por ela propostos, por si mesma não parece contribuir muito para superar ódios e promover boa convivência. Muitas das piores guerras e genocídios que sempre têm atormentado a humanidade foram conflitos religiosos, tinham motivações religiosas entre outras a atiçá-los e torná-los mais cruéis e destrutivos. Parece que para alguém conseguir tornar-se um ser verdadeiramente pacífico necessita avaliar um conjunto de valores e convicções pessoais meditados e treinados exaustivamente por longos anos. Na formação deste patrimônio pessoal de convicções e valores a religião bem vivida tem um papel extraordinário.

2. Definições e conceituação – O que é ódio?

Importante é não confundi-lo com outras emoções como a ira, o ressentimento e, menos ainda, a mágoa.

Ira é a pura emoção, caracterizada por forte descarga de hormônios que mobilizam o corpo para a luta, em geral visando eliminar a fonte da real ou da suposta agressão. O povo fala em sangue quente. Em princípio, nenhum ser vivo gosta de ser contrariado, frustrado em suas expectativas, perder ou ser agredido. Quanto tempo passa entre o registro da suposta violência sofrida e o tal do ferver do sangue? Claro que isso depende da gravidade da agressão e do grau de resistência, ou tolerância que o individuo já desenvolveu às frustrações em geral. Mas a imagem que me vem à mente é da fileira de bolas de bilhar, todas encostadas, umas às outras. Quando uma bola é jogada contra a extremidade da fileira, quanto tempo leva para a última bola da extremidade oposta reagir ao impacto? A reação é instantânea. O povo fala em pavio curto.

A mágoa é uma emoção secundária, no sentido que depende de elementos que ocorrem depois da agressão. A pessoa faz avaliações e considerações sobre a situação e pode imaginar-se injustiçada, traída, preterida, abandonada, desprezada… Um misto de tristeza, raiva e revolta instala-se firmemente em seu coração. Ira e mágoa são emoções e como tais fazem parte da natureza humana, tal como a criou Deus.

Já o ódio é um estado de alma e mente muito mais complexo e cambiante em seus elementos constitutivos. O ódio tem um objetivo e supõe planejamento. Visa à aniquilação do inimigo real ou imaginário, ou, pelo menos, a aplicação de algum castigo, causar-lhe sofrimento ou humilhação. A ação do portador do ódio pode ocorrer em verdadeiras explosões de ira mortífera, como também pode ser executada com cálculo, requinte e frieza inacreditáveis. Não é à toa que o provérbio cínico diz que “a vingança é um prato que se come frio”. Sem emoções, a crueldade e a perversidade são maiores e mais eficientes, o cálculo é mais exato e a margem de erro resulta muito menor.

Normalmente a ira, o ressentimento e a mágoa estão num terreno moral ainda indiferenciado. Podem levar a ações e atitudes moralmente condenáveis, mas podem também levar a manifestações de virtude, como aconteceu com aquela piedosa anciã que confessou ter sentido imensa raiva de fulano. Perguntei-lhe o que havia feito com tanta ira. Confidenciou que havia rezado por ele.

Por sua vez, o ódio é algo duradouro que gera um estado de alma que encarna elementos essenciais do pecado, tais como a perversidade, o julgamento e condenação. O ódio coloca-nos em algum ponto antípoda de Deus, em termos de sua natureza. Ele nos põe em sintonia com satanás.

Mas, vamos ao perdão, o elemento mais importante deste artigo. O perdão situa-nos naquele terreno familiar de Deus, pois é da natureza divina perdoar sempre. Perdoar envolve uma gama muito grande de emoções e elaborações da mente que podem requerer tempo mais ou menos longo em decorrência da capacidade tão variada de cada um perceber a realidade da situação, analisá-la e compreendê-la. Não podemos esquecer também que essas coisas não dependem só da inteligência e sabedoria. Elas têm muito a ver com nosso temperamento, educação emocional e emoções predominantes.

O perdão pode concretizar-se em etapas. O primeiro passo essencial para o perdão é a eliminação do desejo de vingança. Descartada a vingança, a bomba de ódio está desativada. A segunda etapa é mais árdua: assumir a firme determinação de ajudar a quem se está perdoando em suas necessidades, no que puder, como faria com qualquer outra pessoa. Quando o evangelho fala da ordem de amar o inimigo, é exatamente disso que está falando. O cristão não tem outra opção! É comum pessoas dizerem que perdoam, não desejam o mal ao desafeto, mas fazem questão de esquecê-lo, como se ele simplesmente não existisse. Isso representa meio caminho andado para o perdão. A bomba do ódio está desativada, mas o dínamo energético do amor não foi ainda religado.

A terceira etapa exige fazer sua parte no que for necessário para restabelecer laços de relacionamento anterior. Isso refere-se usualmente aos casos de ruptura em famílias, fraternidades religiosas, comunidades de igreja e até equipes de trabalho. Em geral nestes agrupamentos de pessoas não basta conseguir apenas o amor-serviço essencial do Evangelho que devo até ao meu inimigo. Sim, mesmo que eu não odeie, alguém pode odiar-me e tenho um inimigo. Aí é necessário que prospere o amor fraterno, o que supõe troca de gentileza, cortesia e manifestações de real afeto, principalmente em família.

Ainda aqui cabe uma nota. São frequentes os casos de pessoas que dizem perdoar, mas não esquecem. Quem assim fala pode pertencer a um de dois grupos: aos que cultivam ressentimentos e assim procuram justificação por não reconstruir laços anteriores e ainda estão em falta em termos de suas responsabilidades no cultivo do amor cristão; ou fazem parte do grupo dos que pelo simples fato de recordar os acontecimentos sentem-se culpados. Querem esquecer, mas não conseguem. Em geral essas pessoas ainda sentem nas reminiscências algum desconforto como mágoa e tristeza. A rigor, o simples lembrar não constitui erro, não envolve culpa. Até porque ao me colocar o fardo da obrigação de esquecer algum acontecimento perturbador, torno o esquecimento menos provável. Isso acontece porque obrigações geram perigo de falhar e perigos não podem ser esquecidos. O ideal é você poder lembra qualquer acontecimento sem vivenciar coisas desagradáveis. Voltarei ao assunto.

Parte II – SETE RAZÕES PARA PERDOAR

1. Deus proíbe o ódio. Por quê?

Simplesmente porque Deus é Amor, é Vida, é PAZ. E o ódio é o contrário de tudo isso. No ódio encarna-se a morte. O objetivo da encarnação que Deus nos propõe concretiza-se exatamente no ser humano que ama. Deus nos revela que Ele ama sempre o pecador, mesmo que este se volte contra Ele (= inimigo). Aqui vai bem a leitura do capítulo 15 de Lucas. Mas para haver salvação é necessário que o pecador volte a amar seu Deus. Sem a passagem do ódio a Deus para o amor a Ele (= conversão) não pode haver salvação. Não estou falando ou pensando em sentimentos. Mas em atitudes e posturas. Amar Deus é colocar-me a seu favor, é cooperar com a intensidade que levou Jesus a dizer: “Meu alimento e fazer a vontade de meu Pai”.

Surpreendentemente, Deus submete seu infinito poder de conseguir tudo o que quiser ao capricho do ser humano de livremente querer amá-lo ou não. Por natureza, toda relação de amor é necessariamente livre e, no mínimo, bilateral. Por sua vez, o rompimento com Deus é sempre unilateral. Só pode vir da parte do homem.

Assim, também, o reatamento só pode ocorrer com a iniciativa do ser humano. Não podemos esquecer que ao conhecermos a natureza do amor que Deus sempre mantem por nós, amor inalterado, incondicional, não dependente de qualquer circunstância, amor devotado de forma escandalosa (no entender de muitos) ao pecador, descobrimos a impossibilidade de Deus castigar. Entendemos que ele sempre oferece condições e oportunidades para o homem que odeia pare de odiar e dê o passo decisivo para o reatamento. Na parábola do filho pródigo, o Pai insiste que o filho mais velho entre para a festa (= vida eterna), mas essa entrada só pode concretizar-se pelas próprias pernas do filho! O ódio nasce como um desejo de eliminar o inimigo. A vida parece bem melhor sem inimigos a atrapalhar. Mas o ódio acaba voltando-se contra aquele que odeia, forçando-o ao suicídio. Deus não necessita condenar ninguém ao inferno, à morte. O inferno e a morte são opção, escolha do ser humano que odeia.

2. Ódio é oposto do ser cristão

A rigor, nenhum motivo a mais precisamos procurar para não odiar. Mas encarar os desdobramentos desta desgraça suprema que pode assaltar nosso coração pode-nos ser benéfico. Os sinais de perigo tornam-se mais claros e presentes. O perfil básico de qualquer seguidor de Jesus pode ser identificado em sua capacidade de viver constantemente o amor fraterno com todas as pessoas com as quais convive. O amor fraterno caracteriza-se por um contínuo cuidado e desvelo pelo outro; na disposição de ajudar, socorrer, amparar, consolar, confortar e mesmo no prestar pequenos serviços não necessários, por pura cortesia. Desavenças, rupturas, desejos ruins, nem pensar.

Por outro lado, uma coisa que nos pode fortalecer na determinação de viver envolvidos sempre no amor fraterno é descobrir quanto bem nos faz tal vida. Passar semanas, meses, até mesmo anos sem detectar um aborrecimento sequer entre as pessoas que formam grupos de base da vida cristã, seja uma família, uma fraternidade religiosa ou uma equipe de trabalho, é um bem inestimável. Tenho a graça de ter passado por tal vivência por bons e não curtos períodos. É muito gratificante, é muito saudável para a alma e para o corpo. Que gostosa satisfação e sadio orgulho vi nos olhos de um casal amigo ao revelar que por mais de 30 anos os dois são cumpridores do propósito de nunca dormir sem antes resolver algum aborrecimento ou desencontro ocorrido durante o dia. Nego-me a aceitar a falsidade expressa por pessoas que, para consolar-se, espalham a ideia de que brigas são inevitáveis e que necessariamente vão ocorrer sempre. Isso não é verdade!

3. Nosso Deus, nosso Mestre, Modelo e Senhor, perdoa

“Sete vezes setenta” (= sempre). Mesmo que Deus não desse mandamento algum sobre o amor, mesmo que Jesus não nos tivesse brindado com seu “novo mandamento” (isso não é um peso, é um presente de Páscoa), a simples revelação dessa característica do Pai seria suficiente. Isso porque a relação entre duas pessoas para ser perfeita é necessário que haja sintonia, harmonia de valores básicos e de vontades. Se Deus perdoa sempre e eu quero viver no seu amor, é metafisicamente impossível que eu não aprenda a também perdoar sempre. Neste terreno, nada é negociável, explicável ou aceitável que possa tornar a exigência menos radical.

4. Ódio leva à vingança

A vingança gera verdadeiras cadeias sem fim, ou se quiserem, círculos viciosos de violência e morte em que cada elo é causado pelo anterior. Esse processo diabólico pode durar muitas gerações, até que algum elemento muito forte intervém para interromper o ciclo. Ainda assim a interrupção pode ser temporária. Não é fácil convencer uma população inteira das vantagens da paz com o inimigo. Sementes de ódio podem ficar latentes e rebrotar por qualquer incidente, muitas vezes por meros mal entendidos, Os humanos tem infindáveis recursos para alimentar e ressuscitar ressentimentos e ódios. E o quadro fica ainda mais diabólico quando motivos religiosos são invocados para justificar violências, acertos na justiça e mortes. Não podemos esquecer que para muita gente sentenças judiciais nada mais são que vinganças legalizadas.

Casos de violência gerada por evocação de razões religiosas constituem verdadeiros pecados contra o Espírito Santo. Eles envolvem trocas de sinais revelados por Deus de sua natureza por sinais diabólicos. Quando Jesus foi acusado de fazer o bem (livrar pessoas do poder do diabo) pelo recurso ao poder do mal, Ele qualificou essa acusação de pecado contra o Espírito de Deus. É exatamente o que ocorre sempre que alguém procura em Deus razões para fazer o mal. Satanás espertamente ajuda a quem odeia a acreditar que é bom o mal que ele pratica. A maioria das vezes, a vingança recebe etiqueta de justiça. Se o individuo for religioso, ele fixa em Deus, ou naquilo que ele imagina ser Deus, o rotulozinho onde se lê: “Deus é justo”.

5. Ódio destrói a paz

Instala a barbárie. Não me alongarei neste ponto, pois a história das guerras e revoluções que envolveram os povos em todos os tempos falam por si. Todo o esforço em entender a guerra palestino-israelense é muito difícil. As vendetas entre famílias longamente inimigas, entre gangues rivais são incontáveis. Por isso, o primeiro bom desejo que Jesus expressa ao aparecer ressuscitado no cenáculo é: “A paz esteja convosco…”.

6. O ódio destrói quem odeia

Literalmente destrói. Costumo dizer que a vingança perfeita seria levar alguém a odiar intensamente e, ao mesmo tempo, garantir que nunca conseguisse vingar-se de forma alguma do inimigo. O ódio tem o poder de penetrar e corroer tudo o que constitui a humanidade de quem odeia.

Todos os místicos acreditam em centelhas divinas que penetram e atuam no mais íntimo do ser humano. Elas levam o homem a superar seus limites, sua finitude e abrir-se ao infinito, ao divino. Estamos falando de nossa dimensão espiritual transcendente, da alma cristã. É aí que se enraíza toda vida religiosa e toda a espiritualidade autênticas. Como vimos acima, o ódio compromete nossa própria compreensão e percepção de Deus. As cabeceiras da ponte que transpõe o abismo que nos separa do criador são destruídas do nosso lado pelo ódio. Para nossa sorte, do lado de Deus a ponte é sempre a mesma, sólida, indestrutível. Para restabelecer o contato entre quem odeia e Deus é só parar de odiar. As cabeceiras da ponte do nosso lado se refazem como um passe de mágica. Vida religiosa com ódio é impensável. A verdadeira dimensão humana que nos eleva acima dos brutos, das bestas e dos primatas é destruída pelo ódio mortal. Do projeto humano restam ruínas.

7. O ódio fere também profundamente nosso psiquismo

Torna a pessoa que odeia mais cega e mais burra. Não consegue enxergar elementos positivos e qualidades óbvias para qualquer outro olhar. Os defeitos, sejam ele reais ou simples frutos de preconceitos, são amplificados. Qualquer avaliação torna-se inviável. A inteligência e a sabedoria parecem evaporar. A verdade a respeito da pessoa odiada? Mas que verdade? Para quem odeia só resta sua certeza, fruto de elementos distorcidos por sua mente ferida e atormentada de morte.

Uma de minhas experiências mais perturbadoras ocorreu quando fui procurado por uma pessoa que sofria muito e odiava alguém que profissionalmente a prejudicara severamente. Os encontros terapêuticos iam bem. Sua forma de educar uma criança adotada pra preencher a lacuna do bebê que morrera antes do parto, por displicência médica, apresentava erros psicopedagógicos gritantes. Ela precisava perdoar o médico para reparar distorções severas que aparentemente impediam até de engravidar novamente. Parou a terapia sem qualquer reclamação ou explicação. Aparentemente, ela intuíra que tinha necessidade daquele ódio e ressentimento amargo para tocar adiante aquele projeto de vida que montara para si. A compreensão do erro e a superação do ódio levaria a uma revisão de seus próprios erros e planos absurdos. Isso tudo apresentava-se muito perturbador. O ódio parece que se transformara num princípio vital para levar avante sua maldita existência. Temo que isso ocorra com mais frequência que imaginamos.

8. Por fim, o ódio é a mais densa e corrosiva forma de estresse

Entramos aqui nos desdobramentos biológicos e orgânicos do ódio. Ele compromete a saúde física. Todas as emoções têm componentes biológicos. O espaço limitado obriga-me a poder dizer poucas palavras sobre o elemento mais conhecido e mais comprometedor que vem com o séquito de coisas ruins que o ódio nos traz. Trata-se do assim chamado hormônio do estresse, ou cortisol. Ele é essencial em circunstâncias de grande perigo e salvou a vida de nossos antepassados inúmeras vezes. Prepara o organismo para a defesa, o ataque ou a fuga, visando a sobrevivência. Mas esse tsunami hormonal deveria só ocorrer em situações extremas e por períodos curtos. O cérebro reage a tais situações desligando muitos circuitos necessários no dia-a-dia, mas que agora comprometeriam o plano de salvação da vida. Um dos circuitos desligados é o da racionalidade. O desgaste sobre o sistema circulatório e o coração é brutal. Casos de colapso não são raros. Literalmente, pode-se morrer de ódio. Quem odeia tem níveis de colesterol cronicamente mais elevados que o normal. Todo o organismo paga seu preço.

Tudo que foi escrito a partir do nº 6 torna-se mais claro agora. Vale uma releitura.

9. Para facilitar o perdão apresento algumas recomendações

A rigor poderia parar aqui e os objetivos esperados, razões para perdoar, estariam atingidos. Está mais do que evidente que o ódio é coisa realmente destrutiva e má. Basta ter algum bom senso para nos engajar na luta conta ele, principalmente não deixando que o ódio se instale em nosso coração.

Como esclarecimento, quero ainda dizer que escolhi “sete razões para perdoar” por causa da simbologia bíblica do número sete. Na verdade podemos procurar muito mais razões para perdoar. Mas o número sete representa todas as razões e eu não teria a pretensão de conhecer muitas outras além destas aqui apresentadas. Considero-as mais que suficientes.

Como uma espécie de pós-escrito ao texto quero abordar apenas uma estratégia para facilitar o controle do ódio. Propositalmente, não estou lançando mão a nenhum recurso religioso ou espiritual. Claro que a oração e a meditação podem ser uma poderosa ferramenta para atingir nosso objetivo de vencer o ódio. Mas os antigos nos ensinam que a graça supõe a natureza. É exatamente essa natureza que abordarei brevissimamente.

A grande arma anti-ódio que Deus nos confiou, depois da mais poderosa de todas que foi revelar sua natureza de amor e perdão, tem a ver com sua sabedoria comunicada a nós. Precisamos compreender mais e mais como funciona nossa própria natureza. É importante que consigamos compreender o como e os incontáveis porquês que levam alguém ao ódio. Nada acontece na vida de ninguém sem razões.

Costumo afirmar que o ser humano em qualquer situação tem tanta necessidade de compreensão como a tem de amor. Aliás, a compreensão é condição necessária para o amor se firmar. Por sua vez, a estratégia mais eficiente para se chegar à compreensão do outro é um exercício de empatia. Empatia em grau superior é atingida quando alguém é capaz de mergulhar firme, corajosa e suavemente no mundo vivencial do outro, sem qualquer preconceito, no sentido literal da palavra, sem tentação de julgar e, em hipótese nenhuma, de condenar, por mais que possa parecer monstruosa a perversidade do outro. Tenho certeza que geralmente as pessoas recorrem ao mutismo, à ocultação e à mentira pelo medo de serem julgadas e condenadas.

Para terminar, falta ainda a chave de ouro, aquilo que julgo a maior descoberta prática no mundo tão complexo e perturbador das relações interpessoais. Trata-se de a gente tentar imaginar-se no lugar e na situação do outro que me odeia, ou do outro a quem eventualmente eu odeio. Por favor, de nada vale imaginar-me no lugar do outro com o meu eu, com minha inteligência, experiências e vivências. É indispensável imaginar-me no lugar do outro desligado do meu eu, do meu mundo etc., mas ligado ao eu dele, ao mundo vivencial e experiencial dele! Fascinado descubro que ele não é pior do que eu não sou melhor do que ele. Somos apenas diferentes. Descubro que posso até amá-lo.

Asseguro com toda certeza que esta vivência é profundamente libertadora. Ela dissolve mágoas, ressentimentos, tristezas, iras e o ódio mais mortífero. Quiçá essa seja um dos maiores milagres de Deus operados em humanas criaturas. Isso pode revelar-se uma magnífica experiência de Deus.

Fonte: Franciscanos

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