Quaresma – história, significado e simbologia

História

A quaresma, em toda a sua história, sempre teve o objetivo de preparar para a páscoa. É importante um tempo de preparação para momentos especiais na vida da gente! Fazer memória…

A celebração da páscoa nos três primeiros séculos da Igreja não tinha um período de preparação. Limitava-se a um jejum realizado nos dois dias anteriores. A comunidade cristã vivia tão intensamente o empenho cristão, até o testemunho do martírio, que não sentia a necessidade de um período de tempo para renovar a conversão já acontecida com o batismo. Ela prolongava, porém, a alegria da celebração pascal por cinquenta dias.

Após a liberdade dada por Constantino, as comunidades começaram a sentir a necessidade de um tempo mais intenso para viver mais coerentemente de acordo com o batismo. No Oriente, encontramos sinais de um período de preparação à páscoa, no princípio do século IV. No Ocidente, temos testemunhos somente no fim do século IV, da existência de um tempo de preparação para a páscoa. No início, uma semana… 4 semanas… depois 40 dias (sentido bíblico).

Sentido

O mais importante da Quaresma é a Páscoa. O protagonista é o Cristo que sobe à Jerusalém, percorre o caminho da Cruz e passa, através da morte, à nova vida que o Pai lhe dá por seu Espírito. A cada ano, a comunidade de fé revive essa experiência pascal.

O sofrimento e a dor fazem parte da condição humana, e a penitência é um elemento importante nas religiões e culturas populares. Negar isso seria alienação. Mas devemos superar a espiritualidade que fez da quaresma o tempo que revive, pela penitência, os sofrimentos de Cristo. O desafio está em assumir a penitência como método de conversão e unificação interior, como caminho pessoal e comunitário de libertação pascal. Em fazer da quaresma um tempo favorável de avaliação de nossas opções de vida e linhas de trabalho, para corrigir os erros e aprofundar a dimensão ética da fé, abrindo-nos aos outros e realizando ações concretas de solidariedade.

Hoje em dia, mais do que nunca, sair de si é assumir o diálogo, a abertura às pessoas e culturas diferentes e descobrir que o sentido da minha vida está no outro (Deus e o irmão, ou irmã).

Duração

A quaresma começa na Quarta-feira de Cinzas e vai até a manhã da Quinta-feira Santa.

Símbolos e atitudes

A cor roxa, as cinzas, a cruz, o jejum… lembram o caráter de conversão e nos convidam a dar mais atenção à Palavra de Deus e a prosseguir no caminho de doação da nossa vida aos irmãos e irmãs. A água, a luz, a insistência sobre a força da vida que vence a morte são elementos que nos convidam a fazer da quaresma um tempo de catequese batismal e renovação do nosso próprio batismo. Quanto à atitude, fiquemos com a que nos sugere São Bento: “Na alegria do desejo espiritual, esperem a Santa Páscoa”

O que é a Quaresma?

“Senhor, como queres que preparemos a Páscoa?” (Cf. Mt 26, 17)

Antes de iniciarmos a Quaresma repetimos esta mesma pergunta que os discípulos dirigiram a Jesus. A pergunta é justamente sobre a forma de “preparar” a Páscoa. Pois bem, para qualquer festa importante, a gente costuma se preparar. E quanto mais importante a festa, mais tempo leva a preparação. Na própria preparação já se começa a viver a festa!

Nós cristãos celebramos todo ano a Festa da Páscoa: a morte e a ressurreição de Jesus e também a nossa. É a maior de todas as festas. A mais importante. Grande demais para ser preparada em apenas três dias ou uma semana. Por isso, estendemos a sua preparação para quarenta dias – da Quarta-feira de Cinzas até a Quinta-feira Santa pela manhã.

Os textos litúrgicos que rezamos durante o tempo da Quaresma são belíssimos e nos conduzem ao verdadeiro espírito deste “tempo favorável”. O Prefácio da Quaresma V é uma síntese de toda esta riqueza:

“Na verdade, é justo e necessário, é nosso dever e salvação louvar-vos, Pai santo, rico em misericórdia, e bendizer vosso nome, enquanto caminhamos para a Páscoa, seguindo as pegadas de Jesus Cristo, vosso Filho e Senhor nosso, mestre e modelo da humanidade, reconciliada e pacificada no amor. Vós reabris para a Igreja, durante a Quaresma, a estrada do Êxodo, para que ela, aos pés da montanha sagrada, humildemente toma consciência de sua vocação de povo da aliança. E, celebrando vossos louvores, escute vossa Palavra e experimente os vossos prodígios. Por isso, olhando com alegria esses sinais de salvação, unidos aos anjos e aos santos, entoamos o vosso louvor, cantando a uma só voz:”

Neste Prefácio encontramos todos os elementos que caracterizam não só a liturgia deste Tempo, mas especialmente a sua teologia, a sua espiritualidade e a sua pastoral. Voltamo-nos para Deus, “Pai Santo, rico em misericórdia”; relembramos a grande experiência do Êxodo, da Aliança, da libertação e da nova terra; assumimos nossa atitude de povo peregrino, ouvintes da Palavra, povo amado e escolhido por Deus; nosso modelo é Cristo, cuja morte e ressurreição celebramos de forma mais intensa neste tempo. Enfim, a Quaresma é um “sinal de salvação” ou, numa expressão usada num artigo de Dom Manoel João Francisco, “sacramento anual de reconciliação”.

É indispensável que recuperamos também a Quaresma como o tempo ideal de fazer a preparação final dos catecúmenos que serão batizados, confirmados e receberão a Eucaristia na Vigília Pascal. O Ritual da Iniciação Cristã dos Adultos (RICA) lembra que “o tempo da purificação e iluminação dos catecúmenos é normalmente a Quaresma. De fato, na liturgia e na catequese, pela comemoração ou preparação do Batismo e pela penitência, a Quaresma renova a comunidade dos fiéis juntamente com os catecúmenos e os dispõe para a celebração do mistério pascal, ao qual os sacramentos de iniciação associam cada um” (Introdução do RICA, n. 21).

Símbolos, ritos, gestos quaresmais:

São vários os símbolos, as atitudes e iniciativas humanas e religiosas que acompanham e enriquecem o tempo da Quaresma, no qual, como em toda preparação, já saboreamos de certa maneira a festa da Páscoa que virá. Por exemplo:

  • A cor roxa, as cinzas e a cruz lembram o caráter de penitência e conversão próprio deste tempo. Isto se manifesta também no visual do espaço celebrativo, sóbrio, despojado.
  • O jejum nos orienta a dar mais atenção à Palavra de Deus. A fome que sentimos (quando fazemos jejum) pode simbolizar e evocar a fome que temos da Palavra de Deus. É tempo forte, portanto, de escuta da Palavra, pois através dela vamos conhecer os desejos de Deus e praticar a sua vontade.
  • Ajudados pela Campanha da Fraternidade, intensificamos a prática da caridade, procurando corrigir e aperfeiçoar, à luz da Palavra de Deus, o nosso jeito, como tratamos as pessoas e com elas nos relacionamos, sobretudo os mais pobres e sofredores, e como procuramos ajudá-los a viver com dignidade.
  • Nesse tempo forte da vida da Igreja intensificamos nossa vida de oração, na forma de súplicas, pedidos de perdão, intercessão, agradecimento, compromissos de fé, melhor participação na comunidade etc. É um tempo próprio para, nas comunidades, a gente participar de alguma celebração penitencial (individual ou comunitária). Sobre estas três atitudes – jejum, esmola e oração – os Santos Padres fazem muitas referências. Recordemos algumas: “O que a oração pede, o jejum alcança e a misericórdia recebe. Oração, misericórdia, jejum: três coisas que são uma só e se vivificam reciprocamente” (São Pedro Crisólogo). “Não tem mérito nenhum negar alimento ao corpo se no coração não se renuncia à injustiça e se a língua não se abstém da calúnia” (São Leão Magno). “A esmola só será autêntica se à ajuda material estiver unido o perdão das ofensas” (Santo Agostinho).
  • Podemos expressar nossa vontade de participar da caminhada sofrida de Jesus (vítima da violência, de ontem e de hoje), participando de procissões (de ramos, do encontro, do Senhor morto etc.), Vias-Sacras, círculos bíblicos etc.
  • Expressamos o “clima” próprio deste tempo forte da vida da Igreja também através da música e do canto. Há uma música própria e cantos que caracterizam este tempo, além do hino da CF. O Hinário dois da CNBB apresenta também um bom repertório de músicas litúrgicas quaresmais. Na introdução do Hinário 2 lemos: “Cantar a Quaresma é, antes de tudo, cantar a dor que se sente pelo pecado do mundo, que, em todos os tempos e de tantas maneiras, crucifica os filhos de Deus e prolonga, assim, a Paixão de Cristo. O canto da quaresma nos inspira e anima a assumir, com mais garra do que nunca, a Cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo. (…) Pela participação em seus sofrimentos, isto é, ‘obedientes ao Pai e comprometidos com os irmãos até o fim’ (cf. Jo 13,1), ‘cheguemos à glória da sua ressurreição’ (cf. Fl. 3, 10-11)”. Para ajudar nesta vivência, é aconselhável também que se evite na Quaresma o toque de instrumentos musicais. Também não cantamos o “glória” e o “aleluia”.

Semana Santa e Tríduo Pascal: conclusão da quaresma

Existe um jeito, um lugar, um momento muito especial no qual aprenderemos a “viver a semana santa”. É o que nos aponta o saudoso Papa Paulo VI: “Se há uma liturgia que deveria encontrar-nos todos juntos, atentos, solícitos e unidos para uma participação plena, digna, piedosa e amorosa, esta é a liturgia da grande semana. Por um motivo claro e profundo: o Mistério Pascal, que encontra na Semana Santa a sua mais alta e comovida celebração, não é simplesmente um momento do Ano Litúrgico: ele é a fonte de todas as outras celebrações do próprio Ano Litúrgico, porque todas se referem ao mistério da nossa redenção, isto é, ao Mistério Pascal”.

“Viver a semana santa” significa fazermos memória destas ações maravilhosas de Deus. Mais, saber que estamos “revivendo” todos estes fatos. “De geração em geração, cada um de nós é obrigado a ver-se a si próprio, com os olhos penetrantes da fé, como tendo ele mesmo estado lá no Calvário, na primeira sexta-feira santa, e diante do sepulcro vazio, na manhã da ressurreição. Hoje, todos nós, aqui reunidos para celebrar a eucaristia, estávamos lá, prontos a morrer na morte de Cristo e a ressuscitar em sua ressurreição. Será exatamente nossa comunhão com o corpo sacramental do verdadeiro Cordeiro que nos tornará realmente presentes àquele eterno presente.”

Pe. Carlos Gustavo Haas

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