Como na época das competições “inclusivas” desejadas por São Pio X, entre 1905 e 1908, também hoje as Paraolimpíadas são um passo à frente na promoção de uma percepção diferente da deficiência. Tem início nesta terça-feria, dia 24 o evento no Japão, o artigo de Giampaolo Mattei no L’Osservatore Romano fala sobre o assunto.
“A notícia é que no início do século XX, no Vaticano competiam atletas com deficiências. Quarenta anos antes do início do movimento paraolímpico, que começou a partir dos escombros da Segunda Guerra Mundial. Um projeto que poderia ser relançado hoje através da Athletica Vaticana: um século depois, seguindo o testemunho de Francisco, o primeiro passo da Athletica Vaticana – a equipe do Papa – foi a abertura da seção paraolímpica.
Em setembro de 1908, havia atletas com membros amputados como Baldoni que competia na velocidade (vitória irlandesa, para a crônica). Havia atletas surdos e, no salto em altura, 9 jovens cegos do Instituto Sant’Alessio. Com o vencedor, Cittadini (1 metro e 10 centímetros), entrevistado pelo repórter do “L’Osservatore Romano”. Talvez as Paraolimpíadas – que têm início em Tóquio nesta terça-feira 24 – tenham nascido no “Cortile del Belvedere”, transformado em pista de atletismo, diante do Papa Sarto e do cardeal secretário de Estado Merry del Val. E para aqueles que lhe disseram: “onde vamos parar?” – quando viram atletas correndo nos Jardins do Vaticano – Pio X respondeu em veneziano: “Meu caro, no paraíso!”
Em 1908 “L’Osservatore Romano” seguiu aquelas competições internacionais de atletismo (já o tinha feito na primeira edição em outubro de 1905, que também teve lugar no Pátio de São Damaso) como se fosse… “La Gazzetta dello Sport”: classificação, comentários, entrevistas e até fichas técnicas sobre a equipe médica Fatebenefratelli (incluindo diagnósticos das lesões), notas de serviço para os 2.000 atletas e para a Guarda Suíça e Gendarmaria que se revezaram para receber os atletas, também com suas bandas, inclusive fornecendo informações na Porta de Bronze quando algumas corridas foram adiadas devido à chuva. E as palavras do Papa na primeira página.
Como na época das competições “inclusivas” desejadas por São Pio X, também hoje as Paraolimpíadas são um passo à frente na promoção de uma percepção diferente da deficiência. A crescente cobertura mediática das Paraolimpíadas encoraja uma nova consciência e estimula reflexões inestimáveis tanto sobre o papel social do esporte quanto sobre o conceito de habilidade.
O objetivo do movimento paraolímpico não é apenas celebrar um grande evento, mas demonstrar o que os atletas – mesmo aqueles cujas vidas estão gravemente feridas – conseguem alcançar quando são colocados em condições de fazê-lo. E se isto é verdade para o esporte, deve ser ainda mais verdade para a vida.
Sim, não apenas no esporte – que, no entanto, ajuda por sua capacidade de comunicar e despertar emoções – as pessoas com deficiência devem ser colocadas nas condições de expressar o que podem fazer. Criando a igualdade de oportunidades. Consciente das limitações da deficiência (que existem), mas também do enorme potencial que cada pessoa ainda pode expressar. Se eles tiverem a chance de fazer isso.
O esporte pode ajudar a aumentar a compreensão da deficiência ao ponto de abraçá-la como um recurso. Ver as habilidades de um atleta paraolímpico de alto nível leva inevitavelmente à curiosidade, à pergunta: como ele faz isso, com essas próteses? E se isso pode ser feito no esporte, por que não em um escritório ou em uma sala de aula? O esporte pode – e deve – cultivar a consciência de mudar a percepção da deficiência na vida cotidiana de uma família, de uma escola, de um local de trabalho…
O Papa Francisco, em uma entrevista ao jornal italiano ‘La Gazzetta dello Sport’ no dia 2 de janeiro passado, disse – “maravilhado” – que os atletas paraolímpicos têm “histórias que fazem nascer histórias, quando todos pensam que não há mais nenhuma história para contar”. Histórias de inclusão e “resgate”. Histórias que nos fazem ver a certeza de que os limites não estão nas pessoas com deficiências, mas na mentalidade daqueles que as olham.
Infelizmente, a pandemia não significou apenas uma parada para o esporte. Para muitos jovens com deficiência, isso significou a interrupção de um momento de inclusão fundamental e, às vezes, o único em suas vidas. Com muitas famílias deixadas sozinhas. Sim, estamos longe de perceber que o esporte deveria ocupar um lugar na agenda política, a fim de investir nas pessoas.
O esporte, mais do que qualquer outra experiência humana, é uma “medicina social” para ajudar muitos jovens com deficiências a se reerguerem. “Chama-se ‘resiliência’, e você não precisa explicar isso a um atleta paraolímpico. Recuperando o conceito esportivo de assistência… assistencialismo deve ser aquela experiência de pessoas ajudando umas às outras. É assim que o conceito de assistencialismo pode ser declinado em positivo.
É um pouco louco pensar que podemos mudar a cultura, as mentalidades enraizadas, com o esporte paraolímpico? Talvez, mas sem essa loucura saudável Alex Zanardi não teria se tornado um “incentivador” contagioso de pessoas desesperadas e Bebe Vio teria ficado chorando na cama, sem braços ou pernas.
Então, a partir desta terça-feira, vamos nos preparar para torcer por…. todos, sem olhar para as bandeiras: são mulheres e homens ligados pelo fio-vermelho do sofrimento. E um aplauso especial para os seis atletas da Equipe de Refugiados. Na edição desta segunda-feira, “L’Osservatore Romano” conta suas histórias, juntamente com as de outros atletas.
Mas não é retórico dizer que, contas (de vida) em mãos, não há diferença entre o atleta de alto nível e “a base”, ou seja, aqueles que praticam um esporte para não ficarem fechados em casa. Campeões que conquistam medalhas e batem recordes são testemunhas que atraem aqueles que ainda não encontraram coragem para aplicar sua resiliência.
Pode até parecer óbvio apontar o que significa para tantos jovens que estão em uma cama de hospital ver atletas com deficiência praticando esporte. E poder dizer a si mesmos: talvez eu também possa fazer isso, talvez eu possa fazer isso!
É por isso que os jogos Paraolímpicos são ainda “mais” do que os Jogos Olímpicos, além do sufixo grego “para” escolhido para sancionar que eles são a mesma coisa e no mesmo nível. Mas ao apoiar atletas de alto nível deficientes, um “círculo virtuoso” é colocado em movimento que abraça o jovem que é excluído porque ele é diferente. Em resumo, “uma esplêndida imagem de como o mundo deve ser”, observou o Papa Francisco. A verdadeira vitória da “família paraolímpica” continua sendo a capacidade de criar uma comunidade para criar este movimento que envolve campeões e aquelas crianças que hoje lutam para dar um passo ou levantar um braço. E eles têm vergonha de serem vistos como frágeis. Para não mencionar aqueles que têm um atraso cognitivo…
Fonte: Vatican News – Giampaolo Mattei