Por Dom Lindomar Rocha Mota
Bispo de São Luís de Montes Belos (GO)
Jesus propõe uma reorganização na ordem dos mandamentos. Constantemente perguntam se ele os está suprimindo, mas Ele mesmo diz que nem uma vírgula será retirada.
Sendo assim, temos que tentar interpretar esta organização não como uma supressão, mas como um aperfeiçoamento!
Uma sabedoria dominante no pensamento cristão é que Deus é amor (Deus caritas est)! O amor, portanto, é o que melhor define Deus, e, sendo nós mesmos imagens de Deus, também é que melhor nos define.
Vejamos, portanto, as características que o amor reúne para ser o primeiro e mais importante dos mandamentos.
Para começar, o amor é um desejo ativo que busca a união entre quem ama e o amado. Ao contrário de mandamentos proibitivos, que sugere a passividade ante a possibilidade de um movimento ruim, o amor é atividade pura. Quem ama permanece em Deus e Deus permanece nele.
É um desejo que produz a subida da alma para a única coisa que passa a lhe importar. Se Deus é o objeto deste amor, então ele o buscará incessantemente. O amor não descansará nem se aquietará até que tenha encontrado o que ama.
Por amor Deus se moveu para vir nos encontrar. Por amor Ele se aproximou de nós, caminhou conosco e nos falou. Mas o amor incendeia o mundo. O amor incendeia tudo, e, não se contendo mais em si mesmo, Deus se encarnou, e se tornou uma coisa só com aquilo que amava. O amor é terrível e terrificante!
Amando primeiro, Deus pediu daqueles que amava o amor de volta. Apresentou-se como beleza e única coisa que vale a pena. Pesamos na balança do mundo e não encontramos nada mais digno de nosso amor.
Sufocada pelo amor, a humanidade se rendeu a ele. Deus se mostrou amor, e essa visão não pode mais ser suprimida.
O amor é difusivo. É de sua natureza se doar e acontecer por toda parte. Pensamos até que é por ele que o mundo existe. Porque ele se doa.
Ramificado em sua própria difusão o amor a Deus englobou outras coisas. Englobou os irmãos e irmãs. Levando-os a dignidade de merecerem a nossa atenção como se fossemos nós mesmos. O amor a Deus revelou a dignidade do outro. Deus se encarnou e sua encarnação dignificou tudo no mundo.
Ao escolher a imperfeita fraternidade humana para si, Deus a elevou à fraternidade divina, engendrando outro objeto igualmente digno de nossa atenção e apreço.
Quando assume o primado da vida, o amor ajusta o projeto de modo que todos os outros mandamentos se tornem menos importantes, porque já estão contidos no mandamento do amor e são estruturados positivamente; não como empecilho ou negatividade, mas como sentimento que absorve e derrete tudo, como uma forja. Ao final, tudo que passa pela forja do amor se transforma em uma coisa nova. Não em outra pessoa, mas numa pessoa nova.
A forja transforma o ferro em estátua, o aço em espada, e nos transforma em outra coisa.
Forjados no fogo do amor também os mandamentos são reestruturados. Começam a funcionar a partir de um impulso positivo, de uma difusão benéfica que justifica a sua obediência.
Tudo que é divino e humano são forjados pelo fogo do amor, e sem ele tudo se esfria, até se tornar esquálido e insosso. Foi por isso que São Paulo desse: sem amor eu nada seria (1Cor 13). Foi por isso que nosso Senhor determinou: O amor a Deus é o maior mandamento de todos e o segundo é semelhante a ele: amai vossos irmãos com a vós mesmos (Mt 22,37-40). Em ambos os casos, o amor é o que permanece.
Fonte: CNBB