Por Dom Genival Saraiva
Bispo Emérito de Palmares (PE)
O ser humano revela a face de sua personalidade de muitas maneiras. Constata-se isso, facilmente, na leitura de elementos de foro individual e de caráter comunitário, de comportamentos pessoais e de práticas coletivas. Existe, pois, a marca da personalidade humana em tudo aquilo que faz parte da individualidade e do mundo dos relacionamentos, da convivência. De conformidade com a natureza das coisas, os efeitos são benéficos ou as consequências são prejudiciais, como se entende logo: se perseverar na prática da verdade é um bem, ser inconstante nessa procura tem um efeito negativo, em face do que se espera; persistir na prática do mal, em qualquer circunstância, sempre representa um mal a mais. A perseverança é uma qualidade, mas, segundo a maneira como é cultivada, torna-se uma virtude. Quando vista sob o prisma humano, como qualidade, compreende-se logo que se trata de algo que está ao alcance de qualquer pessoa, como fruto de sua motivação, de sua educação, de seu esforço; daí resulta a conquista de seus objetivos que, via de regra, passa pela superação de obstáculos, de dificuldades. Sob o olhar cristão, a perseverança uma atitude de fé, é uma virtude, cujo fruto é a conquista do Reino de Deus, diz Jesus: “Sereis odiados por todos, por causa do meu nome, mas quem perseverar até o fim, esse será salvo.” (Mt 10,22) Ensina o Catecismo da Igreja Católica, n. 1810: “As virtudes humanas adquiridas pela educação, por atos deliberados e por uma perseverança sempre retomada com esforço, são purificadas e elevadas pela graça divina.”
Nisso consiste, precisamente, a virtude da perseverança. São Gregório Magno, séc. VI, ao se referir à atitude de Maria Madalena, ao ver o túmulo vazio, escreve: “Este fato leva-nos a considerar quão forte era o amor que inflamava o espírito dessa mulher, que não se afastava do túmulo do Senhor, mesmo depois de os discípulos terem ido embora. Procurava a quem não encontrara, chorava enquanto buscava e, abrasada no fogo do seu amor, sentia a ardente saudade daquele que julgava ter sido roubado. Por isso, só ela o viu então, porque só ela o ficou procurando. Na verdade, a eficácia das boas obras está na perseverança, como afirma também a voz da Verdade: Quem perseverar até o fim, esse será salvo (Mt 10,22). Ela começou a procurar e não encontrou nada; continuou a procurar, e conseguiu encontrar. Os desejos foram aumentando com a espera, e fizeram com que chegasse a encontrar. Pois os desejos santos crescem com a demora; mas se diminuem com o adiamento, não são desejos autênticos.” Esse ensinamento de São Gregório Magno é precioso. Uma causa de importância significativa na vida de uma pessoa não cansa, não esfria, não desaparece, com o passar do tempo, se o desejo de alcançá-la é autêntico, é santo. Por outro lado, em face do querer e do agir, identifica-se a marca da inconstância na vida de muitas pessoas, com essa nota muito comum: “O início sempre é empolgante, mas o caminho é cheio de percalços e a grande maioria cansa e desiste. Pra chegar lá e vencer é preciso ter muita força de vontade, ter determinação.” Diante disso, a atitude adequada não pode ser, obviamente, a de “Deixar como está, pra ver como é que fica”. A amizade, a solidariedade, a responsabilidade, o bom senso e a caridade apontam o caminho e apresentam formas de ajuda a quem se encontre nessa situação.
A fé cristã dá consistência espiritual às pessoas, no cultivo e na vivência da virtude da perseverança. Por isso, os desejos autênticos que tocam o coração e as aspirações legítimas que ocupam a mente das pessoas perseverantes encontram “a razão da sua esperança” no tempo de espera da realização de seus objetivos e projetos.
Fonte: CNBB