Francisco recebe delegação da Pontifícia Comissão para a Proteção de Menores: “reparar os danos causados às gerações que nos precederam”. O Papa elogia o trabalho realizado pelo órgão presidido pelo cardeal O’Malley, especialmente no que diz respeito às desigualdades nos países mais pobres, onde as vítimas “sofrem em silêncio”. O convite, então, para continuar a melhorar as diretrizes e os padrões de comportamento do clero: “espero um relatório anual sobre isso”.
Por Andressa Collet
“Vocês já fizeram muito nestes primeiros seis meses” de trabalho, disse o Papa Francisco à delegação da Pontifícia Comissão para a Tutela dos Menores recebida na manhã desta sexta-feira (5), no Vaticano. Eles participam até este sábado (6) da segunda assembleia plenária do órgão após o anúncio dos novos membros e justamente para fazer um balanço desse primeiro período. No grupo há de colaboradores provenientes do mundo inteiro, inclusive do Brasil, “que são uma nova e bem-vinda adição”, disse o Pontífice.
Francisco elogiou os planos de formação e de serviço às vítimas pensados para a América Latina, África e Ásia, pois demonstra que a Igreja está se esforçando para enfrentar as desigualdades com as outras áreas mais prósperas do planeta: “espero receber informações sobre esse empenho e um relatório anual sobre o que vocês acreditam que está funcionando bem e sobre o que não está, para que possam ser feitas as devidas alterações”, enalteceu Francisco, ao se referir às diretrizes e os padrões de comportamento do clero e dos religiosos.
O Papa, então, aprofundou o discurso dirigido à delegação tomando como referência “as sementes lançadas há cerca de 10 anos, quando o Conselho de Cardeais recomendou a criação deste órgão”: “nos últimos 10 anos, todos nós aprendemos muito, inclusive eu!”, comentou Francisco. A consciência desse problema se estendeu por toda a comunidade cristã, escandalizando muita gente, pelo fato “de não fazermos o que deveríamos ter feito, especialmente por parte dos líderes da Igreja”:
“O abuso sexual de menores pelo clero e a sua má administração pelos líderes eclesiásticos foram um dos maiores desafios para a Igreja do nosso tempo. Muitos de vocês dedicaram a própria vida a essa causa. As guerras, a fome e a indiferença ao sofrimento dos outros são realidades terríveis do nosso mundo, são realidades que clamam ao céu. A crise dos abusos sexuais, no entanto, é particularmente grave para a Igreja porque prejudica a sua capacidade de abraçar plenamente a presença libertadora de Deus e de ser testemunha. A incapacidade de agir corretamente para deter esse mal e ajudar as suas vítimas deturpou o nosso próprio testemunho do amor de Deus. No ‘Confiteor’, nós pedimos perdão não apenas pelos erros que cometemos, mas também pelo bem que não fizemos. Pode ser fácil esquecer os pecados de omissão, porque, de certa forma, eles parecem menos reais; mas eles são muito concretos e ferem a comunidade tanto quanto os outros, se não mais.”
A espiritualidade de reparação
Ao mesmo tempo, porém, destacou o Papa, “não permanecemos em silêncio ou inativos”. Para reforçar essa atuação da Igreja diante da crise dos abusos sexuais, Francisco traçou três princípios a serem seguidos como parte de uma “espiritualidade de reparação“.
Primeiramente, lembrou Francisco, “onde a vida foi ferida, somos chamados a recordar o poder criativo de Deus para emergir a esperança do desespero e a vida da morte”. Diante da terrível sensação de perda sentida por tantas pessoas devido ao abuso, e até mesmo dos líderes da Igreja “que compartilham um senso comum de vergonha por não terem agido” frente ao problema, “não desanimem”, exortou o Papa, “perseverem, sigam em frente!”.
Em segundo lugar, “o abuso sexual provocou lacerações no nosso mundo e não apenas na Igreja”, inclusive dentro de casa ou no trabalho. A indicação do Papa foi de retomar a relação com as partes envolvidas construindo, assim, um “caminho de reparação e redenção”:
O último e terceiro princípio indicado pelo Papa sobre a espiritualidade da reparação foi de “cultivar o respeito e a bondade de Deus em vocês”, sendo gentis ao agir, “carregando os fardos uns dos outros (cf. Gl 6:1-2), sem reclamar, mas pensando que este momento de reparação para a Igreja dará lugar a outro momento na história da salvação”. Enfim, os princípios de respeito pela dignidade de todos, boa conduta e estilo de vida saudável devem se tornar uma norma universal, concluiu o Pontífice: “afinal de contas, uma cultura de tutela só ocorrerá se houver uma conversão pastoral para esse fim entre seus líderes”.
“Agora é o momento de reparar os danos causados às gerações anteriores a nós e àqueles que continuam sofrendo. Esta época pascal é um sinal de que um novo tempo está sendo preparado para nós, uma nova primavera fecundada pelo trabalho e pelas lágrimas compartilhadas com aqueles que sofreram. É por isso que é importante que nunca paremos de avançar. Vocês dediquem as suas habilidades e conhecimentos para ajudar a reparar uma ferida terrível na Igreja, colocando-se a serviço das várias Igrejas particulares. Desde a vida cotidiana de uma diocese, em suas paróquias e seminários, até a formação de catequistas, professores e outros agentes pastorais, a importância da proteção de menores e pessoas frágeis deve ser uma norma para todos.”
Fonte: Vatican News