Os mistérios de Cristo unidos um ao outro

Imagem de Gime Salvatelli em Cathopic

“Cada mistério da vida de Cristo é interligado um ao outro, tendo o Mistério Pascal como vínculo e eixo de todos os outros, dando-lhes um sentido novo e rico de significado. O Domingo, Dia do Senhor, é o eco perpetuado da Páscoa, o canto prolongado, durante o ano litúrgico, do Aleluia Pascal”.

 

Por Jackson Erpen – Cidade do Vaticano

Os mistérios da vida de Jesus Cristo indicam todos os acontecimentos de sua vida, incluindo os da sua Infância e a sua glorificação – Ressurreição e Ascensão -, testemunhados no Novo Testamento. Uma teologia dos mistérios da vida de Jesus Cristo é, portanto, uma cristologia concreta que reflete sobre os acontecimentos da vida de Jesus testemunhados na Bíblia, procurando destacar deles, de forma argumentativa e narrativa, o significado permanente para a salvação e a vida do cristão e para a salvação de todos os homens.

“Os mistérios de Cristo unidos um ao outro” é o tema da reflexão de hoje do Pe. Gerson Schmidt*:

“Santo Tomás de Aquino diz que o mistério “atinge presencialmente todos os lugares e todos os tempos” – presencialiter attingit omnia et tempora. Isso permite de todos nós sermos contemporâneos do evento que se celebra, ou seja, vivenciarmos o mistério como atual, integrando-o no hoje de nosso tempo e de nossa vida. É o Mistério presente em todo o tempo, em cada momento pontual da história. Por isso diz a SC, 102:

“(A Igreja) Distribui todo o mistério de Cristo pelo correr do ano, da Encarnação e Nascimento à Ascensão, ao Pentecostes, à expectativa da feliz esperança e da vinda do Senhor. Com esta recordação dos mistérios da Redenção, a Igreja oferece aos fiéis as riquezas das obras e merecimentos do seu Senhor, a ponto de os tornar como que presentes a todo o tempo, para que os fiéis, em contato com eles, se encham de graça.”

Jesus não veio para fazer turismo na terra e fazer simplesmente uma visitinha ao ser humano. Encarnou-se para morrer; morre para ressuscitar. Ressuscita para ascender ao céu e para, de lá, enviar o Espírito de Amor. Cada mistério da vida de Cristo é interligado um ao outro, tendo o Mistério Pascal como vínculo e eixo de todos os outros, dando-lhes um sentido novo e rico de significado. O Domingo, Dia do Senhor, é o eco perpetuado da Páscoa, o canto prolongado, durante o ano litúrgico, do Aleluia Pascal.

Nos cadernos do Concílio ainda se aponta que “o mistério Pascal, centro e fundamento do ano litúrgico, sintetiza toda a história da salvação: a que precede a Encarnação e a que vem depois da Ascensão até a vinda definitiva de Cristo. Os mistérios da vida de Jesus não são independentes uns dos outros, mas estão unidos pelo Mistério Pascal que os vincula: assim, por exemplo, o nascimento do Senhor recebe dele e o seu significado salvífico; a Encarnação do Filho de Deus refere-se à Paixão e à Redenção. Todos os mistérios e todos os acontecimentos da vida de Jesus, evocados ao longo do ano litúrgico, recebem pleno significado a partir da Páscoa”[1].

Alberto Beckäuser, da Ordem dos Frades Menores, teólogo especialista em liturgia pela faculdade de Santo Anselmo de Roma, comentando o sentido do ano litúrgico da

Sacrosanctum Concilium número 102, escreve assim: “na experiência Pascal do tempo, a Igreja celebra com piedosa recordação a Obra Salvífica de seu divino Esposo. Primeiramente, da experiência do tempo lunar, que forma as semanas nesta experiência semanal do tempo semanal da Páscoa, o Dia do Senhor, o domingo. A primeira expressão do ano litúrgico é o domingo, a soma de todos os domingos do ano. E celebra a Obra da Salvação também solenemente na solenidade máxima da Páscoa, juntamente com sua sagrada Paixão. Temos então a celebração semanal da Páscoa, o Domingo, e a celebração manual da Páscoa, o tríduo Pascal. Mas, no decorrer do ano a Igreja revela e vive comemorando-o, todo o mistério de Cristo, desde a Encarnação e Natividade até a Ascensão, o dia de Pentecostes e a expectação da feliz esperança e vinda do Senhor. O último parágrafo deste número (referindo-se ao número 102 da SC) reconhece a sacramentalidade do ano litúrgico. A celebração dos mistérios de Cristo durante o ano apresenta uma eficácia da Graça: “Com esta recordação dos mistérios da Redenção, a Igreja oferece aos fiéis as riquezas das obras e merecimentos de seu Senhor, a ponto de os tornar como que presentes a todo tempo, para que os fiéis sejam postos em contato com eles, e sejam repletos da Graça da salvação”. Temos aqui caracterizada a espiritualidade do ano litúrgico”[2]. O teólogo liturgista destaca aqui a importância da solenidade máxima da Páscoa e do Tríduo Pascal que a prepara, do Domingo, e de todo o mistério de Cristo, desde sua encarnação até sua Vinda Gloriosa, interligados entre si.

Interessante que na edição anterior brasileira do Missal Romano, após a oração do Pai-Nosso na Liturgia, a oração do sacerdote rezava “enquanto, vivendo a esperança, aguardamos a vinda do Cristo Salvador”. Beckäuser no comentário acima fala da “expectação da feliz esperança e vinda do Senhor”, termo tirado e citado na Sacrosanctum Concilium. Pois, a nova fórmula da Terceira Edição do Missal Romano no Brasil reza com esse adjetivo “feliz esperança”, quando formula assim a nova oração sacerdotal: “Livrai-nos de todos os males, ó Pai, e dai-nos hoje a vossa paz. Ajudados pela vossa misericórdia, sejamos sempre livres do pecado e protegidos de todos os perigos, enquanto aguardamos a feliz esperança e a vinda do Nosso Salvador, Jesus Cristo”. A nova fórmula é significativa porque nossa esperança da segunda Vinda e vinda definitiva do Salvador não é triste, angustiante e desesperadora. Mas é alegre, tal como celebramos todas as liturgias dominicais, atualizando a alegria pelo vencedor da morte e que pela sua presença atual contagia nossas liturgias. Os liturgistas do Brasil propuseram que a oração do sacerdote após a oração do Pai-Nosso repita as mesmas palavras da Sacrosanctum Concilium – feliz esperança e Vinda do Nosso Salvador.”

Fonte: Vatican News

*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.
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[1] BECKÄUSER, Alberto. Sacrosanctum Concilium – Texto e Comentário, Paulinas, 2012, p. 125-126.
[2] Cadernos do Concílio, Jubileu 2025, n.13. Os tempos fortes do Ano Litúrgico, Edições CNBB, p. 52.

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