Na reflexão sobre a celebração da Palavra de Deus, dissemos que Deus nos toca através de sua Palavra. Nesta reflexão queremos aprofundar a questão da linguagem do toque na Sagrada Liturgia em geral.
Trata-se de um toque divino. Deus toca a humanidade em Jesus Cristo. Primeiramente, no mistério da Encarnação. Deus Filho assume a natureza humana. Depois, ele toca as águas do rio Jordão. Vários Padres da Igreja consideram que, tocando as águas, Jesus, o Filho de Deus, santificou todas as águas. Eles compreendem que, pelo mistério da Encarnação, Jesus veio santificar e, de certa maneira, divinizar toda a realidade criada. Deixando-se tocar pelas águas, Jesus deixou lavar em si todos os pecados do mundo. Ele assume a humanidade pecadora. Na Sexta-feira Santa, Jesus toca a natureza humana mortal destruindo a morte e tornando a natureza humana imortal por sua ressurreição.
Jesus usa o toque em sua ação messiânica, curando os enfermos, perdoando os pecados e ressuscitando os mortos. Todos queriam tocá-lo, ao menos nas suas vestes para que fossem curados. E Jesus, ao ser tocado, sentia sair dele uma força (cf. Mc 5,28-34). Jesus toca as crianças, abraçando-as, abençoando-as impondo as mãos sobre elas (cf. Mc 10,13-16).
Também na vida da Igreja, Deus quer tocar a humanidade através dos sacramentos da salvação, através de sinais sensíveis e significativos dos toques salvadores de Jesus Cristo. Valeria a pena analisar os sacramentos nesta perspectiva da linguagem do toque. No batismo se vê isso de maneira muito forte. O primeiro toque de bênção e salvação é a marca do sinal da cruz na fronte. Em seguida, a unção do peito da criança com o óleo dos catecúmenos. A própria Palavra de Deus constitui um modo de Deus tocar as pessoas. No rito sacramental, temos o grande toque do mergulho na água. Finalmente, temos os ritos que desdobram este rito essencial do toque divino pelas águas do batismo: a unção com o óleo do Crisma no alto da cabeça; a vela acesa nas mãos dos pais; a veste batismal com a qual a criança é revestida e o éfeta, tocando os ouvidos e a boca para abri-los à escuta da Palavra de Deus e à profissão de fé para a glória de Deus Pai.
Em todos os sacramentos temos, de alguma maneira, o toque, mesmo que seja pela imposição das mãos ou pelas unções. Na Eucaristia o Senhor não se deixa tocar apenas, mas deixa-se comer. Ele nos recebe e nos transforma nele, divinizando-nos. Na Eucaristia, Jesus toca e tocando assume o pão e o vinho, transformando-os no seu Corpo e no seu Sangue. A linguagem do toque ou a comunicação pelo toque tem lugar especial no sacramento do Matrimônio. A linguagem do amor conjugal, fonte de vida, não são propriamente as palavras, mas é a linguagem do toque, a linguagem do corpo, onde os dois corpos se tocam e se tornam uma só carne, fonte de vida. A realidade terrestre do amor humano entre um homem e uma mulher torna-se, no mistério do amor de Cristo, amor fiel, amor de aliança, linguagem de glorificação do Deus amor e do amor de Deus à humanidade.
Devemos convencer-nos de que, na Liturgia, a comunicação pela palavra não é a única nem a mais importante. A linguagem litúrgica vai muito além. Trata-se de uma comunicação com Deus através de todos os sentidos. Ela consiste numa linguagem que atinge os sentidos, causando emoções. A linguagem falada pode tornar-se por demais racional, nocional. A linguagem litúrgica é, antes de tudo, ação que passa por todos os sentidos e, particularmente, pelo tato. Ela passa pelo corpo todo, levando mais à emoção do que ao intelecto.
Deixemo-nos tocar por Deus, procuremos tocar as chagas gloriosas do Cristo ressuscitado, a exemplo de Tomé na manhã da ressurreição. Este toque divino nos diviniza.
Fonte: Franciscanos – Especial Gotas de Liturgia /Frei Alberto Beckhäuser