O plano de vida espiritual: finalidade

Um fim ou um meio?

 

Na reflexão anterior, começamos a falar do Plano de vida espiritual. Vimos o que é e lembramos a importância de vencer algumas tentações, dificuldades e desculpas que atrapalham o seu cumprimento.

Depois de termos refletido sobre o que é, vamos perguntar-nos agora a respeito do para que, quer dizer, sobre a finalidade do Plano de vida espiritual.

Como fizemos em outras reflexões, acho bom começarmos com um «esclarecimento prévio». É o seguinte: o Plano de vida espiritual não é um fim em si mesmo, mas um meio (veremos para quê).

a) Muitos erram transformando, sem reparar, o Plano de vida em um fim. Acham que o mais importante é cumpri-lo, não deixar de praticar as «normas espirituais» que o integram (oração, leitura, Terço, etc.). Por isso, ficam aflitos se alguma vez chega a noite e percebem que deixaram penduradas algumas das «normas» do Plano. Então, afobados e ansiosos por completá-lo, fazem-nas atabalhoadamente, distraídos ou sonolentos, só para cumprir.

Não vou lhe dizer que não seja importante o empenho por cumprir o Plano de vida completo. É importante. Os cristãos responsáveis deveriam colocar todo o empenho em não deixar de fazer essas «normas espirituais», ainda que muitas vezes custem e exijam sacrifícios. Mas cumprir não é a finalidade. Também o fariseu da parábola do capítulo dezoito do Evangelho de São Lucas «cumpria» – Jejuo duas vezes na semana e pago o dízimo de todos os meus lucros, etc. (Luc 18,12) -, mas fazia-o só para ficar «quites» com Deus. Por isso, Jesus diz que saiu do Templo reprovado.

b) Com o que acabamos de lembrar, você compreenderá melhor algo que, no íntimo, já sabia: que o Plano de vida é um meio.

Mas… um meio para que? Para a única coisa que importa, aquela que Jesus, falando com Marta na casa de Betânia, chamou a única coisa necessária (cf. Lc 10,42): amar a Deus!

Entende-se, por isso, que São Paulo, falando de oração, de fé e de alguns sacrifícios heroicos, diga: Se não tiver amor, nada disso me aproveita (1 Cor 13, 1-3).

 

Um meio para amar e viver com Deus

Eu diria que o Plano de vida é um grande meio para viver algo que Jesus nos pedia na Última Ceia: Como o Pai me ama, assim também eu vos amo. Permanecei no meu amor (Jo 15, 9). Este é o fim: permanecer no seu amor. O Plano de vida é, portanto, um meio – eficaz, praticado desde o começo do Cristianismo – para amar a Deus, para amar a Cristo e para perseverar sempre nesse amor.

Lembre-se de que o amor que Jesus nos pede é muito grande, e requer muita intimidade com Ele, com Deus. Baste agora recordar algumas palavras de Nosso Senhor. Por exemplo: Se alguém me ama, guardará a minha palavra e meu Pai o amará, e nós viremos a ele e nele faremos a nossa morada (Jo 14,23). E ainda essas outras: Se me amais, guardareis os meus preceitos. E eu rogarei ao Pai e ele vos dará outro Paráclito [o Espírito Santo], para que fique eternamente convosco […], Ele permanecerá convosco e estará em vós (Jo 14, 16-17).

Como é maravilhoso o que Cristo nos promete, se lhe formos fiéis, se o amarmos e cumprirmos os seus mandamentos: chegar a ter uma intimidade de amor intensíssima, incrível, com o Pai, o Filho e o Espírito Santo; viver de modo a termos Deus – a Trindade Santíssima – dentro de nós, sendo o seus «templos» vivos (ver 1 Cor 3,16 e 6,19).

Pois bem, é justamente para alcançar essa maravilhosa realidade que procuramos ter e viver um Plano de vida espiritual.

Tudo é «coisa» de amor

Não custa muito perceber como é que as «normas» do Plano de vida nos levam a fazer o que acabamos de comentar.

Dizíamos que tudo é questão de amor, «coisa» de amor. Vamos pensar, então, no ideal do amor humano como um guia para entender isso.

O amor, todo grande amor humano, requer:

1) Aprofundar no conhecimento da pessoa amada.  Que os que se amam se conheçam cada vez mais e melhor. É claro que essa é, em grande parte, a finalidade de várias «normas» do Plano como a leitura meditada da Bíblia (especialmente do Evangelho)a leitura de livros de formação e de espiritualidade cristã; meditação…? Meios para conhecer a Deus, conhecer a Cristo, conhecer a Palavra de Deus, não só teoricamente, mas também com o coração, com um carinho vivo e prático.

2) Para amar, é preciso ganhar sensibilidade a fim de ir evitando tudo o que possa magoar ou ofender a pessoa querida. Aí está a razão dos exames de consciência, da confissão frequente, das mortificações que fazemos para vencer – com a ajuda da graça – defeitos e indelicadezas que ofendem a Deus.

3) O amor exige dialogar, conversar com o coração aberto e sincero, ouvir com carinho e falar com carinho, oferecer e pedir com confiança. Isso é o que nos propomos com a meditação, a oração mental, a visita ao Santíssimo Sacramento…; e, em geral, com todo tipo de orações, dentre as quais merece um especial destaque o Santo Rosário.

4) Não existe amor sem que os que se querem bem tenham, um para com o outro, muitos detalhes delicados, como palavras afetuosas, pequenos presentes e atenções. As «normas» que cumprem essa finalidade são, entre outras, o oferecimento do dia a Deus, a recitação do Anjo do Senhor pelo menos ao meio-dia, as jaculatórias e outras orações breves espalhadas ao longo do dia, as pequenas mortificações “de aperfeiçoamento”, que ajudem a fazer melhor o que já fazemos por Deus, etc.

5) O máximo anseio dos que se amam é chegarem a ser um só coração, uma só vida, a terem uma união perfeita e feliz. Para nós, não há maior união com Deus – com Jesus – do que a Eucaristia: a Santa Missa e a Comunhão.

Você percebeu? Falando de «coisas de amor», como diz «A banda» do Chico Buarque, foram aparecendo, como práticas naturais e muito convenientes (em maior ou menor medida, conforme as pessoas), as «normas» que constituem um bom Plano de vida espiritual. Meios, em suma, para um único fim: amar a Deus e, com a força de seu amor, amar ao próximo. Isto é a santidade.

Fonte: Padre Francisco Faus

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