“O Espírito é o protagonista e é bom hoje, no dia do nascimento do sacerdócio, reconhecer que Ele está na origem do nosso ministério, da vida e da vitalidade de cada Pastor. Sem Ele, nem sequer a Igreja seria a Esposa viva de Cristo, mas, no máximo, uma organização religiosa”, disse Francisco em sua homilia.
O Papa Francisco celebrou a Missa do Crisma, na manhã desta quinta-feira (06/04), na Basílica de São Pedro.
«O Espírito do Senhor está sobre mim». Com este versículo do Evangelho de Lucas, teve início a homilia do Pontífice. Francisco refletiu com os sacerdotes e fiéis, presentes na missa, sobre o Espírito do Senhor, “pois sem ele não há vida cristã e, sem a sua unção, não há santidade”.
“O Espírito é o protagonista e é bom hoje, no dia do nascimento do sacerdócio, reconhecer que Ele está na origem do nosso ministério, da vida e da vitalidade de cada Pastor.”
Sem Ele, nem sequer a Igreja seria a Esposa viva de Cristo, mas, no máximo, uma organização religiosa; não seria o Corpo de Cristo, mas um templo construído por mãos humanas. Então como edificar a Igreja senão a partir do fato de sermos «templos do Espírito Santo» que habita em nós? Não podemos deixá-Lo fora de casa ou arrumá-Lo em qualquer área devocional.
“Cada um de nós pode dizer: O Espírito do Senhor está sobre mim. Não é presunção, mas a realidade, já que cada cristão, e de modo particular cada sacerdote, pode fazer suas as palavras: «porque o Senhor me consagrou com a unção». Irmãos, sem mérito nosso, por pura graça, recebemos uma unção que nos fez pais e pastores no Povo santo de Deus”, sublinhou Francisco, detendo-se neste aspecto do Espírito: “A unção“.
“Depois da primeira «unção» que aconteceu no ventre de Maria, o Espírito desceu sobre Jesus no Jordão. Jesus e o Espírito trabalham sempre juntos, como se fossem as duas mãos do Pai que, estendidas para nós, nos abraçam e levantam. E, por elas, foram marcadas as nossas mãos, ungidas pelo Espírito de Cristo. Sim, meus irmãos, o Senhor não Se limitou a escolher-nos e chamar-nos, mas infundiu em nós a unção do seu Espírito, o mesmo que desceu sobre os Apóstolos”, disse o Pontífice.
Três tentações perigosas
“Fixemos então o nosso olhar nos Apóstolos”, disse o Papa. “Jesus sabia que eles, sozinhos, não conseguiriam e, por isso, prometeu-lhes o Paráclito. E foi aquela «segunda unção», no Pentecostes, que transformou os discípulos, levando-os a apascentar o rebanho de Deus, e não a si mesmos. Foi aquela unção de fogo que extinguiu uma religiosidade centrada neles mesmos e nas próprias capacidades: acolhido o Espírito, evaporam-se os medos e as hesitações de Pedro, Tiago e João, consumidos pelo anseio de dar a vida, deixam de procurar lugares de honra, o carreirismo, nosso, irmãos, os outros deixam de estar fechados e temerosos no Cenáculo, mas saem e tornam-se apóstolos pelo mundo inteiro”.
Irmãos, um itinerário semelhante abraça a nossa vida sacerdotal e apostólica. Também para nós houve uma primeira unção, com início num chamado cheio de amor que nos arrebatou o coração. Por ele, soltamos as amarras e, sobre um genuíno entusiasmo, desceu a força do Espírito que nos consagrou. Depois, segundo os tempos de Deus, havia de chegar para cada um a etapa pascal, que marca a hora da verdade. Trata-se de um momento de crise, que possui várias formas. A todos acontece, mais cedo ou mais tarde, experimentar desilusões, cansaços e fraquezas, com o ideal que parece diluir-se perante as exigências da realidade, substituído por uma certa rotina; e algumas provações – difíceis de imaginar antes – fazem aparecer a fidelidade mais incômoda do que outrora. Esta etapa, desta tentação, desta provação que todos nós tivemos, temos e teremos, esta etapa é, para quem recebeu a unção, um cume decisivo.
Segundo o Papa, desse cume decisivo “pode-se sair mal, deixando-se planar rumo a uma certa mediocridade, arrastando-se cansado numa «normalidade» cinzenta onde se insinuam três tentações perigosas : a da acomodação, em que a pessoa se contenta com o que pode fazer; a de substituição, em que se tenta «recarregar» o espírito com algo diferente da nossa unção; a do desânimo, em que, insatisfeitos, se avança por inércia”.
Aqui está o grande risco: permanecem intactas as aparências, enquanto a pessoa se fecha em si mesma e conduz a vida na apatia; a fragrância da unção deixou de perfumar a vida, e o coração, em vez de se dilatar, restringe-se, envolvido pelo desencanto. É um destilado, sabe? Quando o sacerdócio desliza lentamente para o clericalismo, e o sacerdote se esquece de ser pastor do povo, para se tornar um clérigo de Estado.
Crise, um ponto de virada no sacerdócio
A seguir, o Pontífice disse que a “crise pode tornar-se também um ponto de virada no sacerdócio, a «etapa decisiva da vida espiritual, em que se deve efetuar a última escolha entre Jesus e o mundo, entre a heroicidade da caridade e a mediocridade, entre a cruz e um certo bem-estar, entre a santidade e uma honesta fidelidade ao compromisso religioso»”. Francisco recomendou a leitura do livro “O segundo chamado”, um clássico do pe. Voillaume que aborda este problema. “Todos nós precisamos refletir sobre este momento do nosso sacerdócio”, sublinhou.
“Irmãos, a maturidade sacerdotal passa pelo Espírito Santo, realiza-se quando Ele se torna o protagonista da nossa vida. Então tudo muda de perspectiva, inclusive as desilusões e amarguras, porque já não se trata de procurar aperfeiçoar-se ajustando qualquer coisa, mas de nos entregarmos, sem nada reter para nós, Àquele que nos impregnou com a sua unção e quer descer até ao fundo de nós mesmos”, disse ainda o Papa.
Construir a harmonia
De acordo com Francisco, tudo o que o Espírito Santo deseja “é criar harmonia, principalmente através daqueles sobre quem derramou a sua unção. Irmãos, construir a harmonia entre nós não é tanto um método bom, para que a comunidade eclesial caminhe melhor, nem é questão de estratégia ou de cortesia, mas é sobretudo uma exigência interna na vida do Espírito. Peca-se contra o Espírito, que é comunhão, quando nos tornamos, mesmo por frivolidade, instrumentos de divisão, de fofoca, e faz-se o jogo do inimigo, que nunca sai a descoberto, mas gosta de boatos e insinuações, fomenta partidos e fações, alimenta a nostalgia do passado, a desconfiança, o pessimismo, o medo. Por favor, estejamos atentos a não manchar a unção do Espírito e o vestido da Mãe Igreja com a desunião, com as polarizações, com qualquer falta de caridade e comunhão. Recordemos que o Espírito, «o nós de Deus», prefere a forma comunitária: a disponibilidade acima das exigências próprias, a obediência acima dos próprios gostos, a humildade acima das próprias pretensões”.
Gentileza do sacerdote
“Penso também na gentileza do sacerdote“, disse o Papa, acrescentando que muitas vezes os sacerdotes são “mal-educados”: “Pensemos na gentileza do sacerdote, se encontram até em nós pessoas insatisfeitas e descontentes, solteirões, que criticam e apontam o dedo, onde verão a harmonia?
Por fim, o Papa agradeceu aos sacerdotes pelo “seu testemunho e serviço, pelo bem oculto que fazem, pelo perdão e a consolação que oferecem em nome de Deus: perdoar sempre, por favor, nunca negar o perdão“. Agradeceu também “pelo seu ministério, que muitas vezes se realiza no meio de tantas fadigas e pouco reconhecimento”. O Espírito de Deus, que não desilude quem coloca n’Ele a própria confiança, os encha de paz e leve a bom termo aquilo começou em vocês, para serem profetas da sua unção e apóstolos de harmonia”, concluiu.
Mariangela Jaguraba – Vatican News