Por Dom Antônio de Assis Ribeiro
Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém – PA
Introdução
Há uma íntima relação entre a celebração do Natal do Senhor e a família. Não devemos nos deixar cair na tentação de celebrar o Natal sem pensar no contexto em que nasceu o Salvador da humanidade. Não devemos centrar o nosso olhar na pessoa do menino Jesus esquecendo o seu contexto familiar.
Deus para salvar a humanidade começa a partir da família. É dentro de uma família que o filho de Deus assume a humanidade; é no contexto familiar que o divino se humaniza, sem deixar de ser Deus. Dessa forma, Deus dignifica e santifica extraordinariamente a beleza da família.
Tudo isso deve ser matéria para a nossa reflexão no tempo do advento e do Natal. É uma maravilhosa oportunidade que temos para relançar os nossos ideais familiares e, ao mesmo tempo, restaurar tudo aquilo que está enfraquecido, frio, fragmentado, distorcido. Deus não desiste da família.
Jesus Cristo não nasceu numa maternidade ou hospital como acontece hoje com a maioria dos bebês. O filho de Deus não nasceu sendo assistido por profissionais da saúde, como médicos e enfermeiras. Os evangelhos também não mencionam nem mesmo a presença de parteiras no nascimento de Jesus. Não sabemos, de fato, como tudo aconteceu em seus detalhes, mas o certo é que lá estava Maria e seu esposo José; eis o núcleo central da sagrada família de Nazaré.
Deus Pai, ao enviar o seu Filho ao mundo contou com uma condição e estrutura essencial que foi poder contar com colaboração de um homem e uma mulher, Maria e José. E eles nem casa tinham em Belém!
A família foi o ambiente e o lugar onde Jesus Cristo nasceu, foi cuidado, educado e cresceu. A família, portanto, é o lugar por excelência, para a celebração do Natal. E quem pensa que, para celebrar o Natal em família, festivamente ou não, é necessário contar com especiais condições estruturais e confortável situação financeira está certamente muito enganado. A primeira festa de Natal aconteceu num estábulo! Num ambiente de absoluta pobreza, carência de condições dignas, numa total ausência de conforto de infraestrutura técnica. Todavia, havia algo em abundância: o afeto, o cuidado, o carinho, a atenção pela vida, a harmonia, a fé, a alegria.
É maravilhosa a narração de Lucas quando afirma: “Enquanto estavam em Belém, se completaram os dias para o parto, e Maria deu à luz o seu filho primogênito. Ela o enfaixou, e o colocou na manjedoura, pois não havia lugar para eles dentro da casa” (Lc 2,6-7). Essa cena nos fala de cuidado, criatividade, espírito de adaptação, privação, zelo materno. O espírito de ternura que brota da maternidade está no centro da celebração do Natal.
As primeiras pessoas que testemunharam e participaram da alegria pelo Natal do Filho de Deus, foram os pastores e são eles que testemunharam que “encontraram Maria e José, e o recém-nascido deitado na manjedoura” (Lc 2,16-17).
Somos convocados, portanto, a refletir sobre o que nos impede de celebrarmos festivamente e com fé o Natal do Senhor. Isso mesmo significa que a verdadeira celebração do Natal não depende de infraestrutura técnica e nem de boas condições ambientais, mas essencialmente se celebra Natal quando temos fé e reconhecemos o dom do Senhor da Vida entre nós.
Observamos, a partir dos evangelhos, que aquele estábulo onde nasceu o menino Jesus, tornou-se centro de peregrinação, de convergência, de encontro de pessoas (pastores e magos), anjos e animais!
A celebração do Natal nos chama a atenção para a necessidade do reencontro das pessoas entre si, mas não só, também nos fala da necessária harmonia entre as criaturas, por isso, também lá se encontram animais e os anjos. O presépio é símbolo harmonia da casa comum.
A celebração do Natal em família deve ser caracterizada pela busca da restauração da harmonia entre todos. Deve ser uma “experiência sabática”, ou seja de restauração e perdão de todas as dívidas afetivas dentro da família. Em muitas ocasiões, ao longo do ano, de acordo com a maturidade as pessoas, as relações familiares passam por fortes crises consequentes dos desentendimentos, da falta de paciência, da intolerância, da falta de sensibilidade para com o outro e da dificuldade de perdão. Não poucas vezes, o amargo clima familiar é consequência de problemas não resolvidos e, dessa forma, muitas vezes entre irmãos, se carrega fortes sentimentos de mágoas, ressentimentos, desejos de vingança, frieza no trato.
A celebração do natal é uma oportunidade ímpar para que tudo seja resolvido e restaurado o clima de harmonia e paz onde todos possam se dar o perdão, o abraço fraterno, um presente e renovar a beleza da fraternidade que traz alegria, paz e sossego para a alma.
No primeiro Natal, que deve ser parâmetro para todos os outros, Jesus estava ao centro. Na festa do Natal a centralidade da pessoa de Jesus Cristo só é possível se houver fé no coração das pessoas. A fonte promotora da transformação da qualidade das relações no nobre estábulo de Belém foi a presença do menino Jesus, o Salvador Criança.
Isso significa que, sem fé, não há a celebração do verdadeiro Natal. A celebração do Natal é a acolhida da vida divina em nosso coração que nos enche de esperança e nos traz paz e alegria. No nascimento de Jesus tudo fala de alegria e se reveste de um novo dinamismo. Ninguém criticou as condições técnicas e nem higiênicas do “barraco” do Salvador. O essencial estava presente que era o amor entre as pessoas da família.
Em qualquer barraco onde houver o mesmo clima de acolhida, cuidado, calor humano, alegria, perdão, respeito, partilha e harmonia ali haverá as condições essenciais para a celebração do Natal.
Lamentavelmente, hoje o paganismo move a celebração de muitas festas natalinas, como um evento puramente sociocultural. Todavia, a bem da verdade, por coerência histórica e religiosa, não há autêntica celebração do Natal sem a pessoa de Jesus Cristo. O aniversário é dele! Como podemos participar da celebração do aniversário de alguém, sem estarmos em comunhão com ele? Logo a celebração do Natal sem Jesus, se resume em comida, bebida, música, presentes! Perdendo a dimensão religiosa, ética e afetiva, torna-se um evento profundamente materialista, sem espiritualidade, sem esperança, sem renovação da vida interior, sem mudança positiva, sem propósitos de renovação!
PARA REFLEXÃO PESSOAL:
3. Como se manifesta hoje o natal pagão e materialista
Fonte: CNBB Norte 2