O Filho do Homem será levantado

Imagem ilustrativa de Frei Fábio Melo Vasconcelos

Por Frei Almir Guimarães

 

Quem age conforme a verdade, aproxima-se da luz para que se manifeste que suas ações que são realizadas em Deus
João 3,21

♦ A vida continua. Continuamos nossa caminhada quaresmal. A liturgia da Igreja interrompe por um momento a austeridade deste tempo e convida-nos à alegria. Atenua até a cor dos paramentos, passando do roxo para o rosáceo. Com isso quer apontar para a alegria da Páscoa que se aproxima. Não podemos nos deter num dolorismo. Não se trata de um convite a uma alegria de eufórica e superficial. Necessitamos do anúncio de uma verdadeira alegria. A razão da alegria é, pois, a vitória do bem contra o mal, da vida sobre a morte. Ele, aquele que morreu na tarde de sexta-feira das dores, vive e está em nosso meio. Esta a razão mais densa e profunda de nossa alegria. “Deu amou tanto o mundo que deu o seu Filho unigênito para que não morra quem nele crê…” A estupenda alegria da fé no Ressuscitado. Ele nos arranca do fracasso de viver. O motivo de nossa alegria é ressurreição do Senhor e a certeza de que somos amados. Jesus, morrendo na cruz, está a perguntar: “Adão onde estás? Homem, onde tu estás? Venho ter contigo.

♦ Não poucas vezes pensamos que a alegria nos vem de um certo bem estar, de poder aproveitar a vida, comprar a tal maquininha, de usar um certo depilador ou de uma nova fórmula para melhorar a performance sexual masculina ou ainda de fazer uma viagem e ver as muralhas da China. Somos invadidos pela propaganda na intimidade de nosso quarto. Ela não para. Interrompe até mesmo um concerto de música clássica. O homem e a mulher consumistas são constrangidos a uma corrida para realizar e satisfazer qualquer desejo, envolvidos numa espiral irrefreável de amor por si próprio que é sempre raiz de violência. Contentam-se com uma sucessão de pequenas felicidades. Esquecem que a única felicidade e dar a vida.

⇒ O evangelho deste domingo é uma conversa de Jesus com Nicodemos, aquele que anteriormente havia procurado Jesus à noite para saber como ingressar no mundo novo do Reino. Jesus fala para ele e para nós:

⇒ O texto lembra um episódio que havia acontecido no passado. Moisés levantara uma serpente de bronze no deserto para curar os que haviam sido mordidos por serpentes. Agora o Filho do Homem será elevado para que quem nele crer tenha a vida, o que acontece na sexta-feira das dores, em toda crueldade e luminosidade. Os soldados haverão de elevar a cruz com o corpo de Jesus nela já imobilizado por pregos. Elevação, sair do chão, de toda banalidade, estar mais perto das Alturas celestes. Mostrar dor e júbilo. Lá do alto, enquanto possível, no meio de dores, ele contempla ainda uma vez o mundo.

⇒ Este domingo nos aponta a direção de uma outra colina em que o mais belo de todos os filhos dos homens fez a oferenda da vida. A cruz levantada no Gólgota é resposta às serpentes de hoje e de sempre, ao desnorteamento e à confusão, ao ódio entre irmãs e irmãos. A cruz plantada no Gólgota é fonte de vida, fonte generosa, gratuita, abundante.

⇒ O sentido da vida (nossa salvação) não podemos nos proporcionar a nós mesmos. A salvação é dada pelo Alto. A presença do mal é persistente. Mal que praticamos e que rompe a ordem do Amor de Deus, desrespeita o divino que há em cada irmão e irmã. Mal tão fundo e tão intenso que não temos condições de extirpar com meia dúzia de bons propósitos. Essa impotência diante do mal pode nos induzir a um pessimismo. O mal nasce da obscuridade profunda do príncipe do mal e de suas obras de morte.

⇒ Aos homens não é pedida a obra da autoliberação do mal. O que se lhes pede e erguer os olhos para um pouco mais alto, de não permanecerem nas trevas do egocentrismo e acolher uma luz que Deus enviou ao mundo, de não fechar-se ao amor e compreender que o verdadeiro amor de Deus e desce na terra. “A luz veio à terra mas os homens preferiram as trevas”.

Concluindo

Também o apóstolo Paulo, na carta aos efésios, nos lembra a irrupção deste amor: “Deus é rico em misericórdia. Por causa do grande amor com que nos amou quando estávamos mortos por causa de nossas faltas, ele nos deu a vida em Cristo. É por graça que sois salvos! Deus nos ressuscitou com Cristo e nos fez assentar no céus”(2,4). Como não alegrar-nos com estas palavras? A liturgia deste domingo, repleta da alegria do amor de Deus, continua a guiar-nos ao acontecimento da salvação, o mistério pascal da morte e ressurreição do Senhor.


Para reflexão

Ele morre de amar

Jesus morre.
Enquanto houver um sofrimento na terra
e que houver um semblante cavado pela dor,
enquanto houver em algum lugar uma criança que morre e uma mãe enlouquecida dizendo que não pode ser verdade,
enquanto oprimidos, famintos e vidas tortas,
enquanto uma prostitua é presa à noite,
enquanto houver um homem humilhado,
enquanto houver o grito de um homem sendo torturado,
enquanto a morte estiver enfiada como um animal nas dobras do tempo Jesus não cessa de morrer: ele morre de amar.

Jacques Leclerc

Fonte: Franciscanos


FREI ALMIR GUIMARÃES, OFMingressou na Ordem Franciscana em 1958. Estudou catequese e pastoral no Institut Catholique de Paris, a partir de 1966, período em que fez licenciatura em Teologia. Em 1974, voltou a Paris para se doutorar em Teologia. Tem diversas obras sobre espiritualidade, sobretudo na área da Pastoral familiar. É o editor da Revista “Grande Sinal”.

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