“A fé na Igreja não se restringe à fé no Papa e nos bispos. É o Espírito Santo quem a dirige. A Igreja professa a fé verdadeira, porque toda ela é dirigida pelo Espírito Santo. O Espírito Santo não vem apenas para dar vigor à estrutura da Igreja. É, junto com Cristo, verdadeiramente co-fundador da Igreja. O Espírito Santo anima a Igreja por dentro. A relação não é mera “assistência” à Igreja, mas é essencial, a ponto de constituí-la. O Espírito Santo constitui a Igreja, a comunidade de fé.”
Por Jackson Erpen
Anunciado em 25 de janeiro de 1959, a festa da conversão de São Paulo Apóstolo, o Concílio Ecumênico Vaticano II foi aberto pelo Papa São João XXIII em 11 de outubro de 1962.
“Pode dizer-se que o céu e a terra se unem na celebração do Concílio – afirmou no discurso inaugural – os santos do céu, para proteger o nosso trabalho; os fiéis da terra, continuando a rezar a Deus; e vós, fiéis às inspirações do Espírito Santo, para procurardes que o trabalho comum corresponda às esperanças e às necessidades dos vários povos. Isto requer da vossa parte serenidade de espírito, concórdia fraterna, moderação nos projetos, dignidade nas discussões e prudência nas deliberações.”
Neste ano de 2022, a Igreja recorda os 60 anos deste grande evento também com uma Missa a ser presidida pelo Papa Francisco na Basílica de São Pedro, no próximo dia 11 de outubro, às 17 horas, horário de Roma. No âmbito deste aniversário, Pe. Gerson Schmidt* nos propõe hoje a reflexão “O Espírito Santo dirige o Concílio Vaticano II”:
“É o Espírito Santo que dirige a Igreja. No século XIX, o Papa Pio IX, convocava o Concilio Vaticano I. Recebeu o nome de Vaticano porque foi realizado no Vaticano, na Basílica de São Pedro. Era o Período do Racionalismo, com enorme incidência da Revolução Francesa. O grande tema, acuradamente preparado foi a Fé e a Razão. Em 1870 aconteceu a primeira sessão do Concilio. Foi única, porque a questão romana, com a iminência de um ataque das tropas de Garibaldi à cidade eterna, impediu sua continuação. O Concílio Vaticano I definiu a infabilidade do Papa, nas questões de fé e moral. Diante dessa proclamação, muitos pensaram que o Papa deveria, por assim dizer, resolver tudo sozinho porque é infalível e, tudo seria daqui pra frente redundante. Mas não foi essa visão de João XXIII. “Percebia claramente que assim como o Corpo não pode agir sem a cabeça – a Igreja sem o Papa – também a cabeça não pode agir sem o Corpo – o Papa sem a Igreja” [1]. “Diante do volume de consultas, que chegavam ao Papa, S. João XXIII sentiu-se pequeno. Confessou que não era capaz de resolver tudo sozinho. Conclamou toda a Igreja a se tonar ativa e colaborar eficazmente com ele, na direção da Igreja. Foi sua motivação para a convocação de um Concilio Ecumênico”[2].
Não temos dúvidas que foi o Espírito Santo que inspirou o Papa São João XXIII a convocar o Concílio Vaticano II em 1959 que iria se realizar nos anos de 1962 a 1965. Sem sombra de dúvida que a realização do concílio Vaticano II constituiu o evento eclesial mais significativo e profundo do século XX. O Papa João XXIII, eleito já idoso, como sucessor do grande Pio XII, sentiu-se pequeno diante da figura excelsa do antecessor. Previa-se uma duração breve de seu pontificado. Projetou um Sínodo da Igreja de Roma, a reforma do Direito Canônico e um Concilio Ecumênico, esse último um marco decisivo na Igreja atual.
A fé na Igreja não se restringe à fé no Papa e nos bispos. É o Espírito Santo quem a dirige. A Igreja professa a fé verdadeira, porque toda ela é dirigida pelo Espírito Santo. O Espírito Santo não vem apenas para dar vigor à estrutura da Igreja. É, junto com Cristo, verdadeiramente co-fundador da Igreja. O Espírito Santo anima a Igreja por dentro. A relação não é mera “assistência” à Igreja, mas é essencial, a ponto de constituí-la. O Espírito Santo constitui a Igreja, a comunidade de fé. Por isso, a Igreja é o que é pela ação do Espírito Santo. Nele, ela adquire o seu “eu”, a sua identidade[3].
O Espírito Santo age em toda a comunidade. Torna a comunidade coesa, unida num só corpo e comunhão. Não se pode entender a ação do Espírito Santo como uma operação e atuação somente nos leigos e nos clérigos. A primeira carta aos Coríntios descreve que o Espírito Santo pode atingir todos os que pertencem à comunidade de Cristo. Mais ainda. Pode atuar onde e quando quiser, nos dons que bem lhe aprouver. O Espírito Santo não só santifica e conduz o Povo de Deus por meio dos sacramentos e ministérios e o adorna com virtudes, mas «distribuindo a cada um os seus dons como lhe apraz» (1 Cor 12,11).
Na abertura do concilio Vaticano II, o Papa S. João XIII fez sua profissão de fé no poder do Espírito Santo. “Na véspera realizou uma hora santa, com os padres conciliares. Confessou-lhes que alguns lhe estavam segredando que, naquela noite, ele não dormiria. A preocupação de convocar e realizar um concílio ecumênico, reunindo em Roma toda essa gente, era grande demais. Na oração, referiu que Cristo lhe perguntara: Papa João, quem dirige a Igreja: és tu, ou o Espírito Santo? A resposta lhe parecia evidente: é o Espírito Santo. Daí a repreensão: então porque te preocupas? O papa bom concluiu: já que o Espírito Santo dirige a Igreja, o resultado está garantido. Podemos dormir tranquilos. E devemos fazê-lo, porque nossos assessores prepararam amplo material – 75 anteprojetos, para estudo. Precisamos estar bem descansados!”[4].
Fonte: Vatican News
*Padre Gerson Schmidt foi ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.
________________________
[1] GRINGS, Dadeus. A Igreja de Cristo no Brasil, Evangraf, 2021, 170.
[2] Ibidem.
[3] HACKMANN, Geraldo B. Concílio Vaticano II. 40 anos da Lumen Gentium (Coleção Teologia 27). Porto Alegre: EDIPUCRS, 2005, p.95.
[4] GRINGS, Dadeus. A Igreja de Cristo no Brasil, Evangraf, 2021, 172.