Na escuta da humanidade além do fragor da guerra

Papa Francisco no centro de refugiados de Mitilene, em Lesbos - Vatican News

O Dia Mundial das Comunicações no próximo domingo (29/05) se concentra no tema da escuta e sublinha a urgência de colocar a pessoa no centro da informação. Como o Papa Francisco destacou, “o bom jornalismo não pode ser feito sem a capacidade de escuta”. Uma exigência que se tornou ainda mais evidente durante a pandemia e agora na trágica guerra na Ucrânia

 

Por Alessandro Gisotti

“Francisco é um homem que não só ouve, mas também escuta”. É significativo que esta definição do Papa tenha sido dada pelo secretário-geral da Caritas-Spes Ucrânia, Padre Vyacheslav Grynevych, após uma recente reunião com o Papa na Casa Santa Marta. O sacerdote palotino confidenciou que precisamente este – ‘escutar’ – seja de fato a tarefa mais importante que ele, como os outros agentes e voluntários da Cáritas Ucrânia, vem realizando, além do trabalho humanitário, desde 24 de fevereiro, o dia em que começou a invasão russa. Escutar o sofrimento das mães que perderam seus filhos, dos pais que combatem para defender sua pátria e não sabem se voltarão a ver sua família. Ouvir os gritos inconsoláveis de crianças que, por quase cem dias, vivem aterrorizadas, imersas em uma guerra cruel que interrompeu o curso natural de sua existência feita de jogos, escola e afeto familiar, como deveria ser a vida de toda criança. Portanto escutar. Não ouvir. Porque para ouvir, é suficiente o ouvido, para escutar precisa o coração. Aí está a sede da escuta.

Quando o Papa Francisco escolheu precisamente a escuta como tema do Dia Mundial das Comunicações Sociais deste ano, sua reflexão foi motivada principalmente pela experiência traumática da pandemia da Covid-19. Ele se referia à solidão existencial à qual uma parte da humanidade foi necessariamente forçada pelas restrições que paralisaram o que mais distingue o ser humano, a pessoa: as relações com os próprios semelhantes. Não é coincidência, lemos na Mensagem para o Dia que será celebrado no próximo domingo, que “a capacidade de escutar a sociedade é mais preciosa do que nunca, neste tempo ferido pela longa pandemia”. Para Francisco, “precisamos dar ouvidos e escutar profundamente, especialmente o mal-estar social aumentado pela desaceleração ou cessação de muitas atividades econômicas”. Devemos, portanto, ser capazes de captar o desejo de ser escutados, que cresceu de modo exponencial dentro daquele silêncio antinatural que desceu sobre nossas comunidades por tantos meses, fazendo-nos redescobrir a necessidade de fazer-se próximos uns dos outros (um tema, este último, da primeira Mensagem de Francisco para a Comunicação Social, em 2014). Só se aproximando do outro, só se mostrando vizinho, só se estiver a uma batida de coração de distância – o Papa parece sugerir – pode-se realmente escutá-lo.

Portanto, se o tema da escuta surge, antes de tudo, a partir da experiência da pandemia, o seu valor não é menor no contexto trágico da guerra na Ucrânia, como em qualquer conflito. De fato, se na pandemia, a capacidade de escuta tinha que encontrar as frequências certas no silêncio, agora é no fragor das armas, no barulho da guerra que esta atitude do coração deve saber interceptar a voz daqueles que sofrem. Segundo com uma visão funcionalista da comunicação, isto “acontece” se houver um remetente, um destinatário e um código compartilhado. Portanto uma comunicação centralizada em “dizer algo” em vez de “escutar alguém”. A guerra, assim como a pandemia, ao contrário, demonstrou o que já tinha indicado o filósofo Abraham Kaplan (nascido em Odessa), citado pelo Papa na Mensagem, ou seja, que a comunicação autêntica não se reduz à justaposição de dois monólogos (um duólogo), mas requer que o “eu” e o “você” sejam ambos “em saída”, inclinados um para o outro. “A escuta”, escreve Francisco, “é o primeiro indispensável ingrediente do diálogo e da boa comunicação. Não se comunica se não se é primeiro escutado e não se faz um bom jornalismo sem a capacidade de escuta”.

Aqui, nesta última afirmação, encontramos uma exortação e uma tarefa para os trabalhadores da informação, especialmente em um momento histórico tão delicado e imprevisível como o que estamos vivendo. Para fazer uma boa comunicação, um bom jornalismo, é preciso escutar. Antes de tudo, escutar os que têm a voz mais fraca. Uma tarefa que está sendo realizada, mesmo correndo risco de vida, por muitos jornalistas diretamente da Ucrânia, bem como por os que trabalham em muitos outros lugares onde guerras mais ou menos esquecidas estão sendo combatidas. A escuta requer paciência, humildade. Uma virtude que, como afirmou o Papa ao se encontrar com os jornalistas da Associação da Imprensa Estrangeira na Itália em 18 de maio de 2019, torna livre não medíocres. “O jornalista humilde”, afirmou na ocasião, “é um jornalista livre. Livre de condicionamento. Livre de preconceitos, e por esta razão corajoso”. Uma liberdade que hoje mais do que nunca deve ser preservada, na consciência de que a profissão dos trabalhadores da informação não é apenas uma profissão, mas uma missão ao serviço do bem comum.

Fonte: Vatican News

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui