Maria: a alegria da fé

“Feliz a que acreditou!”

No dia da Visitação, assim que Nossa Senhora chegou à casa de Isabel, houve uma verdadeira explosão de alegria: Mal Isabel ouviu a saudação de Maria, a criança [o futuro São João Batista] estremeceu de alegria no seu seio; e Isabel ficou cheia do Espírito Santo. Movida por Deus, louvou Maria “com voz forte”, chamando-a “bendita entre todas as mulheres”; ficou comovida “por vir a mim a mãe do meu Senhor”; e manifestou que, “assim que a voz da tua saudação chegou aos meus ouvidos, o menino pulou de alegria no meu ventre” (Lc 1, 41-44).

A seguir, inspirada pelo Espírito Santo, proclamou mais uma “bem-aventurança” de Maria: Feliz a que acreditou, pois se hão de cumprir as coisas que da parte do Senhor lhe foram ditas! (Lc 1, 45). A felicidade da fé!

Se você ler devagar os Evangelhos, perceberá que a vida de Maria não foi fácil. Desde o começo, ela sabia que seu filho seria o Messias sofredor – o Servo sofredor – de que haviam falado os profetas (cf. Is 53, 7-8). Isso mesmo lhe foi lembrado pelo ancião Simeão no dia da apresentação de Jesus no Templo: Uma espada atravessará a tua alma (Lc 2, 35). Ela sabia disso. Mas não sabia onde, nem quando, nem quantas vezes, nem de que modo essa espada de dor a feriria.

Por isso, é assombrosa a serenidade com que ela passou por tantas provações, sem que a sua fé se abalasse. Foi realmente a sua fé no amor de Deus o que a sustentou e a encheu de paz, com plena confiança, quando seu Menino nasceu no desamparo de Belém; quando teve de fugir com ele para o Egito porque Herodes queria matá-lo; quando, aos doze anos, Jesus ficou perdido no Templo; quando soube das conspirações armadas para matá-lo; e, enfim, quando o contemplou morrendo destroçado na Cruz.

“Avançou na peregrinação da fé”

A Igreja vê a vida de Maria, tão cheia de incidentes perturbadores, como uma “peregrinação de fé”. «A bem-aventurada Virgem – diz o Concílio Vaticano II – avançou em peregrinação de fé, e sustentou fielmente a sua união com o Filho até a Cruz… Com ânimo materno se associou ao seu sacrifício» (Const. Lumen gentium, n. 58).

São João Paulo II retomou a reflexão do Concílio na sua encíclica A Mãe do Redentor, e dizia: «Ela é feliz porque acreditou; e acredita dia a dia, no meio de todas as provações e contrariedades… Dia a dia cumprem-se nela as palavras abençoantes pronunciadas por Isabel no dia da Visitação: “Feliz aquela que acreditou”» (n. 17).

Com os olhos da fé, ela sempre viu os acontecimentos como se fossem novos “anjos Gabriel”, que continuavam a explicitar a mensagem da Anunciação: Darás a luz um filho… Será chamado Filho do Altíssimo… Seu Reino não terá fim (Lc 1, 31-33). Acolhia essas “mensagens” com a segurança da fé, e esforçava-se por entendê-las com a ajuda da oração: Maria guardava todas estas coisas, meditando-as no seu coração (Lc 2, 19).

Daí lhe vinham luzes para corresponder às novas exigências divinas com a mesma generosidade do primeiro dia: Eis aqui a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra.

Essa “tua palavra”, que na Anunciação fora verbal e explícita, continuou a interpelá-la com a linguagem silenciosa dos fatos. E assim, em todas as circunstâncias, sem nunca ceder à dúvida ou ao desespero, ela soube “ouvir” a voz de Deus.

Tal como nos lembram os mistérios do Rosário, umas vezes essa voz era gozosa (alegria dos anjos e dos pastores adorando o Menino); outras, luminosa (como quando em Caná viu Jesus realizar seu primeiro milagre atendendo a um pedido dela); outras dolorosa (toda a Via Crucis da Paixão e morte do Filho), e finalmente gloriosa, quando a Redenção realizada pelo Filho desembocou na Ressurreição, na Ascensão, na vinda do Espírito Santo e na glorificação dela mesma em corpo e alma no Céu.

Pensando nela e em nós – que tão facilmente perdemos a fé nas contrariedades –, o Papa Bento XVI, no dia da Assunção de 2006 dizia: «”Bem-aventurada aquela que acreditou”. O primeiro e fundamental ato para se tornar morada de Deus e para assim encontrar a felicidade definitiva é crer, é a fé, a fé em Deus, naquele Deus que se manifestou em Jesus Cristo … Se Deus existe, tudo se transforma, a vida é luz, o nosso futuro é luz e temos orientação para toda a nossa vida» (Homilia, 15/08/2006).

“Felizes os que ouvem a Palavra de Deus”

Uma cena profundamente humana nos é contada por São Lucas no capítulo 11 do seu evangelho. Estava certa vez Jesus rodeado por uma multidão, como em tantas ocasiões, e o povo o escutava fascinado. De repente, uma mulher – sem dúvida uma boa mãe –, levantou a voz do meio da multidão e lhe disse: “Feliz o ventre que te trouxe e os seios que te amamentaram”. Aquela boa mulher deve ter pensado: “Como deve ser feliz a mãe que tem um filho assim”. Era um elogio carinhoso a Maria, que provavelmente ela nem conhecia.

E Jesus respondeu com umas palavras que nem sempre as traduções da Bíblia refletem com clareza: Diz, melhor, felizes os que ouvem a Palavra de Deus e a põem em prática. Um dos mais prestigiosos especialistas na Santa Escritura, Ignace de la Potterie, traduziu as duas primeiras palavras dessa frase assim: “Muito bem, felizes”, ou “’É isso mesmo, felizes”. Assim se esclarece que Jesus não contradisse a boa mulher, mas completou seu elogio conduzindo-o ao verdadeiro motivo de louvor: Maria foi feliz, mais do que pela sua maternidade física, por ter acolhido no coração as palavras de Deus e as ter levado à prática. Mais uma vez o Espírito Santo, pela boca de uma boa mulher, louvou a fé de Maria.

Esse elogio nos move a perguntar-nos: “Eu, a quem escuto mais, a Deus ou a mim?”

Infelizmente, a nossa tendência é postergar o que Deus diz e dar ouvidos aos nossos desejos, às nossas ambições, às nossas cobiças. Custa-nos dizer: “Meu Deus e meu amor, não eu, mas Tu…”. Custa-nos orar como o menino Samuel: Fala, Senhor, que o teu servo escuta (1 Sm 3, 10). Maria orou assim, a voz de Deus essa era a única que desejava ouvir: Eis a escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra.

Pobre ouvido o nosso, tão cheio de barulhos! Gritos de paixões, clamores de protesto, reclamações ansiosas, estrépitos de raiva … Quantas vezes não é um coração ensurdecido, incapaz de ouvir a voz de Deus. E assim, a nossa vida não é um diálogo com Deus, mas um monólogo com as nossas ânsias e as nossas frustrações… Será que isso nos faz felizes?

Fixemos o olhar em Nossa Mãe. Felizes os que ouvem a Palavra de Deus. É coisa que ela nos pede, porque nos quer alegres. É como se nos dissesse: “Ouve o que Deus te diz! Procura nas palavras da Sagrada Escritura a luz que deves projetar sobre todos os teus problemas, sobre todas as tuas dúvidas, sobre todos os teus desconcertos… Olha para meu filho Jesus, porque só ele é a luz do mundo (Jo 8, 12), só ele tem palavras de vida eterna (Jo 6, 68). Nele e com ele verás tudo claro e alcançarás a paz. Faz, para isso, muita oração, reza e medita recolhido em silêncio e com calma, e verás como ele te fala ao coração (Os 2, 16)”.

Se agirmos assim, seremos, como filhos de Maria, uma alma feliz “que ouve a Palavra de Deus e a põe em prática”.

«Mãe nossa – rezava São Josemaria –, tu, que trouxeste à terra Jesus, por quem nos é revelado o amor do nosso Pai-Deus, ajuda-nos a reconhecê-lo no meio das ocupações de cada dia; remove a nossa inteligência e a nossa vontade, para que saibamos escutar a voz de Deus, o impulso da graça» (É Cristo que passa, n. 174).

Texto de Pe. Francisco Faus

 

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