Inauguração da missão do Messias

Imagem ilustrativa de Frei Fábio Melo Vasconcelos

Por Frei Almir Guimarães

 

O Senhor vem se fazer batizar junto com os servos, o juiz junto com os réus.  Que isso não te perturbe, pois é justamente em tais humilhações que a grandeza dele mais resplandece. Por que te surpreenderias com o fato de ele consentir em receber o batismo e se aproximar de seu servidor com os outros, visto que ficou tanto tempo no seio virginal, saiu dele revestido de nossa natureza, deixou-se esbofetear e crucificar, e se submeteu a tantos outros sofrimentos?  O mais estupendo é que ele, sendo Deus, tenha desejado se fazer homem; o resto é apenas  consequência lógica disso.

São João Crisóstomo

Lá estava ele, esse João, conhecido como o “batizador” João Batista.  Estava às margens do Jordão.  Costumava administrar um rito de purificação e de expressão de mudança do coração  que  chamamos de conversão. Levava as pessoas a celebraram nas águas a vontade de mudar. Houve até  quem pensasse que João fosse o Messias.  Havia uma expectativa do povo nesse sentido.  O evangelista procurará  colocar as coisas claras.  João não é Messias e ele diz mesmo  que não é digno de desamarrar as correias de suas sandálias.

João contemplava os que vinham. Iam se adentrando nas águas, molhando os pés, as pernas, o corpo todo e chegando a purificar o ser inteiro, o corpo e o espírito.  Nesse momento o filho da velhice de Isabel e Zacarias prefigurava,  de alguma maneira,  o estilo de pregação de  Jesus: a urgência da conversão,  do doce se transformar em amargo e o amargo, em doce.  Seu batismo era um batismo de conversão.

De repente,  Jesus se associa ao cortejo dos pecadores.  João acha estranho. Não quer aceitar de colocar o gesto de batizar Jesus.  Jesus insiste.  É preciso que tudo se cumpra. Aquele seria o rito e momento de inauguração da  missão do Messias.  Mais tarde o batismo de Jesus seria na água e no Espírito.  Mas agora Jesus queria se associar visivelmente ao cortejo dos pecadores.  Não conhecendo o pecado se juntou aos pecadores.

Santo Efrém  escreve  como que um diálogo entre João e Jesus. Assim fala  Jesus: “Pelo meu batismo é que as águas serão santificadas recebendo de mim  o fogo e o Espirito. Se eu não receber o batismo nas águas elas  não terão o poder de gerar  filhos imortais. É absolutamente   necessário que me batizes, sem discussão, como te ordenei.  Eu te batizei no seio materno;  batiza-me no Jordão”.  Belas, da mesma maneira, as palavras que Efrém coloca nos lábios do Batista:  “Sou um servo totalmente indigente. Tu, que a todos libertas, tem piedade de mim. Não sou digno sequer de desatar as correias de tuas sandálias. Quem me tornará digno de tocar tua sublime cabeça?  Obedeço  Senhor, segundo a tua palavra; vem, pois, ao batismo ao qual o teu amor te impele. Com suma veneração, o homem pó se vê chegar ao extremo de impor a mão àquele que o plasmou”.

“Quando todo o povo  estava sendo batizado, Jesus também recebeu o batismo. E enquanto rezava o céu se abriu e o Espírito  Santo desceu sobre Jesus em forma visível, como pomba. E do céu veio uma voz: “Tu és o meu Filho amado, em ti ponho o meu bem querer”. A partir desse momento Jesus começará sua vida pública, seu ministério. Os céus se rasgam e o Pai  unge o  Filho amado.  Nele  o Pai coloca todo o seu agrado e a partir desse momento  Jesus haverá de falar.  O Filho amado do Pai vai começar a falar e felizes os que ouvirem a sua palavra ungida.  Os discípulos de Jesus haverão de colocar como ponto de honra de seu viver escutar o Filho amado do Pai.

“A experiência  vivida  por Jesus  ao ser batizado  é modelo de toda experiência  cristã de Deus. Quando em algum momento de nossa vida  – cada qual sabe o seu  –  “o céu se rasga” e as trevas nos permitem ver algo do mistério que nos envolve, o cristão,  da mesma forma  que Jesus, só ouve uma voz que pode transformar  sua vida inteira; “Tu és o meu filho amado”. No futuro   será difícil haver cristãos que  não tenham tido a  experiência  pessoal  de sentir-se filhos amados de Deus”  (Pagola, Lucas p.  66).

Quanta profundidade  nessas reflexões de  Pedro Crisólogo  sobre a festa do batismo do Senhor: “ Hoje o Espírito Santo, em forma de pomba, paira sobre as águas:  assim como uma pomba anunciou a Noé o fim do dilúvio, por sua presença os homens saberiam que havia terminado o ininterrupto naufrágio do mundo. Esta pomba não trouxe, como a outra, um ramo da antiga oliveira, mas derramou sobre a cabeça do Senhor, toda a riqueza do novo óleo,   cumprindo assim  o que o profeta anunciara:  “É por isso  que  Deus te ungiu  com seu óleo, deu-vos mais alegria que aos vossos amigos (Sl 44,8)”  (Lecionário Monástico I, p. 458).

A partir desse momento Jesus não voltará mais para  Nazaré, nem permanecerá com os discípulos do Batista.  Ele é o  Filho Amado do Pai que vai realizar sua missão evangelizadora.  Ninguém poderá segura-lo.  Para isso ele veio?


Textos  para a reflexão

Que batismo é este?

Hoje o Cristo é batizado no Jordão. Que batismo é este, em que o batizado é mais puro do que que a fonte?  Onde a água que lava o corpo não se torna impura, mas enriquecida de bênçãos?  Que batismo é este o do Salvador, no qual as águas, em vez de purificar, são purificadas?  Num novo gênero de santificação,  a água não lava,  mas é lavada.  Desde o momento em que imergiu na água, o Salvador  consagrou todas as fontes no mistério do batismo, para que todo aquele que desejar ser batizado  em nome do Senhor seja lavado não pela água do mundo, mas purificado pela água de Cristo.  Assim,  o Salvador  quis ser batizado não visando adquirir pureza para si, mas a fim de purificar as águas para nós.

São Máximo de Turim, Lecionário Monástico  I, p.526-527

Fonte: Franciscanos


FREI ALMIR GUIMARÃES, OFMingressou na Ordem Franciscana em 1958. Estudou catequese e pastoral no Institut Catholique de Paris, a partir de 1966, período em que fez licenciatura em Teologia. Em 1974, voltou a Paris para se doutorar em Teologia. Tem diversas obras sobre espiritualidade, sobretudo na área da Pastoral familiar. É o editor da Revista “Grande Sinal”.

 

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