Por qual motivo deve o bispo de Roma ser o Papa, e não o de alguma outra sede episcopal antiga e também importante? A resposta está na tradição ininterrupta da Igreja, desde os tempos apostólicos.
Por Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo metropolitano de São Paulo
No dia 13 de março passado, lembramos o 9º aniversário da eleição do Papa Francisco como sucessor do apóstolo Pedro na sede de Roma e como pastor universal da Igreja de Cristo. No dia 19 de março, lembramos o aniversário do início solene de seu pontificado, que ele dedicou ao patrocínio de São José, “guardião e provedor da família de Deus”. Que Deus conserve o Papa Francisco com saúde e lhe conceda todos os dons necessários para o desempenho de sua imensa missão na Igreja e no mundo.
Lembramo-nos bem do destaque dado por ele mesmo, logo após sua eleição, ao fato de ser o “bispo de Roma”. Parecia uma novidade e, para alguns, até um pouco estranho e uma diminuição da importância do papa. Mas não há que estranhar e não se trata de um detalhe secundário. De fato, somente o bispo eleito para a sede de Roma é também Papa e Sumo Pontífice de toda a Igreja Católica. Qualquer bispo de outra sede episcopal, que se apresentasse por sua própria conta como “Papa”, seria ilegítimo. Também seria ilegítimo se fosse apresentado ou escolhido por algum poder ou grupo não legitimado para fazer essa escolha. Não desejo entrar aqui em discussão com quem ainda insiste em afirmar que a renúncia de Bento XVI não foi legítima ou com quem prefere acreditar em teorias da conspiração, sem o menor fundamento, para deslegitimar a eleição do Papa Francisco.
Por qual motivo deve o bispo de Roma ser o Papa, e não o de alguma outra sede episcopal antiga e também importante? A resposta está na tradição ininterrupta da Igreja, desde os tempos apostólicos: o apóstolo Pedro, que recebeu de Jesus o poder das chaves e a missão universal de apascentar as ovelhas e os cordeiros do rebanho de Jesus (cf. Jo 21,15-17), foi o primeiro bispo de Roma, onde ele também deu o testemunho derradeiro de sua fé e da missão de “confirmar os irmãos na fé em Cristo” (cf. Lc 22,31-32), mediante o martírio. Desde então, os sucessores de São Pedro na sede de Roma receberam esse reconhecimento de continuadores da missão especial e única confiada por Jesus ao apóstolo Pedro. Por isso, são sucessores do apóstolo Pedro na sua sede episcopal e na sua missão perante toda a Igreja.
Ao longo da história da Igreja, houve períodos breves em que o Papa passou algum tempo fora da sede de Roma, como aconteceu ao longo do século XIV. Vários papas viveram em Avinhão, no sul da França, por circunstâncias históricas específicas. Mas essa ausência da sede de Roma sempre foi entendida como uma situação anômala, criando até mesmo a situação de dois “papas” na Igreja: um legítimo e outro, ilegítimo. Tão logo as circunstâncias adversas permitiram, o Papa legítimo voltou a Roma.
O fato de nossa Igreja, além de católica e apostólica, também ser “romana” diz respeito a essa relação que ela tem com o Bispo de Roma, chamado também Papa, Sucessor do Apóstolo Pedro e Sumo Pontífice de toda a Igreja. O Sucessor do apóstolo Pedro tem a missão de anunciar e defender a integridade da fé e de manter a Igreja unida na fé apostólica e eclesial. Ele também confirma na fé os irmãos, ou seja, mostra com segurança a reta interpretação do patrimônio da fé da Igreja, animando-a a viver e transmitir esse rico patrimônio da fé e da vida da Igreja. Entendemos assim o motivo por que o Papa fala e escreve muito e seus documentos e pronunciamentos sobre questões de fé e moral têm valor de magistério, ou seja, de ensinamento que deve ser aceito e seguido pelos irmãos na fé.
Mas ainda há outro aspecto na missão do Bispo de Roma, o Papa. Ele é o primeiro missionário da Igreja e, portanto, anima a Igreja no cumprimento da missão que os apóstolos receberam de Jesus, que passou aos sucessores dos apóstolos e à Igreja inteira. O Evangelho precisa ser anunciado, vivido e transmitido em todos os tempos e em todo o mundo, “até os extremos da terra” (cf. Mc 16,15-16). Essa missão do Papa está implicada no fato de, em Roma, também o apóstolo Paulo ter dado o seu testemunho por Cristo mediante o martírio. Paulo, o grande missionário, mais que os outros apóstolos, abriu as fronteiras dos povos e culturas ao Evangelho e à participação na vida da Igreja. O túmulo de Paulo, em Roma, lembra que o Bispo de Roma também assume a missão de Paulo na animação missionária da Igreja. Entendemos bem, portanto, os constantes apelos do Papa para que sejamos uma Igreja “em saída missionária”, em estado permanente de missão.
É preciso dizer, ainda, que o Papa não é o único a desempenhar essa missão: todos os bispos que estão em comunhão com ele também têm parte nessa mesma missão e responsabilidade na Igreja. Cada um deles, em sua diocese, desempenha essa missão com responsabilidade pessoal, mas em comunhão com os demais bispos e com o Papa. Em tempos de “Igreja sinodal”, é oportuno recordar que a “comunhão” na Igreja se expressa também nessas formas bem perceptíveis de vivência da comunhão sinodal. Não bastaria viver uma doutrina, de forma abstrata e subjetiva, sem estar em comunhão com o Papa e com os bispos que estão em comunhão com ele. Nossa Igreja católica é “romana” e isso significa que ela está com o Papa, que hoje tem o nome de Francisco.
Fonte: Vatican News