Dom José Gislon
Bispo de Caxias do Sul (RS)
A esmola, a oração e o jejum são atos que nos ajudam a restabelecer uma relação correta com as coisas, com o próximo e com Deus, e nos levam a valorizar o essencial em nossa vida.
Por esse motivo, a quaresma faz um apelo ao coração, às convicções de fé íntimas da pessoa, para que não se deixe sufocar pelas convenções, mas se torne fonte de um sentir, falar e agir cheio de virtudes humanas e divinas. Viver a caminhada penitencial da Quaresma na presença de Deus, nos liberta do risco de ficarmos condicionados pela opinião dos outros, que geralmente não ajudam a nossa relação direta com o Pai e a nossa vontade de dar razão a ele, fonte de amor e misericórdia.
O caminho de conversão proposto pela Quaresma nos pede para voltarmos ao “coração”, para podermos recomeçar a partir deste lugar onde se agitam as nossas emoções e os nossos pensamentos mais desordenados, e talvez mais atordoantes da nossa vida. O coração é aquela parte do corpo que remete á totalidade da pessoa chamada a ser capaz de refletir e retornar sobre os próprios passos para percorrer continuamente um caminho de conversão interior, que procura aproximar-se de Deus, sem medo, com humildade, tendo presente o seu amor de Pai que nos acolhe como filhos e filhas, mesmo conhecendo nossas fragilidades.
Para os cristãos, a Quaresma é realmente um tempo favorável, que nos indica a estrada para o renascimento espiritual à semelhança do Senhor ressuscitado. É uma estrada concreta, humilde, que todos nós podemos percorrer, cada um segundo a necessidade da sua vida. É uma estrada penitencial porque pede a cada um de nós de reduzirmos a pó o homem velho que existe em nós, fechado em si mesmo, no seu egoísmo, na sua indiferença e autossuficiência. Mas como toda prática penitencial cristã, ela não é destinada a uma auto realização, que deixa vazio e insatisfeito o nosso coração. É um caminho que abre em nós o espaço para a ação do Espírito do Senhor. O homem novo renascido pela caminhada quaresmal, que se prepara com alegria para celebrar a paixão, morte e ressurreição do Senhor na Páscoa, é alguém que foi reconciliado consigo mesmo, com Deus e com os irmãos e que vive os seus dias na justiça e no amor.