Por Frei Clarêncio Neotti
Os textos litúrgicos do início da Quaresma sugerem, como ajuda de conversão e como expressão concreta de nosso esforço, a esmola, o jejum e a oração intensa. O jejum se refere em primeiro lugar à boca. Há um pecado capital chamado gula. O jejum não é apenas o contrário da gula, é também um abster-se, propositadamente, de alimentos e bebidas ou coisas que satisfazem o sentido do gosto (cigarro, por exemplo). Quando nos privamos de determinado alimento todos os dias da Quaresma ou em determinados dias (de carne, por exemplo), praticamos a abstinência. O jejum de alimentos recorda a frase dita por Jesus ao demônio, que o tentava pela gula: “Não só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus” (Mt 4,4), uma citação do Antigo Testamento (Dt 8,3). Quaresma é um tempo de alimentar a alma por meio da escuta da Palavra de Deus.
A esmola extingue a avareza. Ela mexe com o nosso bolso. Ela lembra que não somos donos de coisa nenhuma, que tudo pertence a Deus. Que somos uma fraternidade, cujos bens devem ser condivididos. Ela nos recorda de que a criatura apegada às coisas terrenas não consegue alçar-se ao céu. É dando aos necessitados, que recebemos de Deus. Dizia Santo Antônio: “Assim como fechamos instintivamente muitas vezes as pálpebras para conservar límpidos os olhos, também devemos dar esmola com frequência para conservar a beleza da graça de Deus em nós”. A esmola deve refletir essa beleza de graça divina, que está em nós; por isso o carinho com que damos a esmola é mais importante que a soma que desembolsamos. A Quaresma é um tempo especial de partilha do que temos e somos.
A oração se faz com os lábios, sim. Mas se for feita só com os lábios será como a fumaça dos sacrifícios de Caim: não sobe para o alto (Gn 4,5). Nossa oração deve partir do coração e ser participada pelo coração, isto é, pelo nosso ser inteiro. Nossa oração é como música envolvente que acompanha nosso jejum, nossa esmola, nossa abertura aos outros e ao mesmo tempo nosso elevamento a Deus. A Quaresma é um tempo privilegiado de oração.
Fonte: Franciscanos
FREI CLARÊNCIO NEOTTI, OFM, entrou na Ordem Franciscana no dia 23 de dezembro de 1954. Durante 20 anos, trabalhou na Editora Vozes, em Petrópolis. É membro fundador da União dos Editores Franciscanos e vigário paroquial no Santuário do Divino Espírito Santo (ES). Escritor e jornalista, é autor de vários livros e este comentário é do livro “Ministério da Palavra – Comentários aos Evangelhos dominicais e Festivos”, da Editora Santuário.