Teóloga iraniana explica porque encontro entre Francisco Al-Sistani é histórico
Shahrazad Houshmand, iraniana, a primeira mulher muçulmana a fazer uma Licenciatura em Teologia Fundamental Cristã, descreve a figura do Aiatolá Al-Sistani, com quem o Papa se encontrou no sábado, em Najaf, como um homem de diálogo inter-religioso. Ele é a mais alta autoridade xiita iraquiana.
Há expectativa em Najaf, a terceira cidade sagrada para os muçulmanos xiitas depois de Meca e Medina, e que abriga o túmulo de Ali, genro e primo de Maomé, para o encontro privado de sexta-feira entre o Papa Francisco e o Aiatolá Sayyid Ali Al-Husayni Al- Sistani.
Líder dos xiitas iraquianos, que são mais de 60% da população, é uma figura influente para o xiismo em todo o mundo e em todo o país. Pregando a abstenção das autoridades religiosas da atividade política direta, é considerado um valioso interlocutor das várias correntes políticas e religiosas do país.
Homem de paz
Entre seus pronunciamentos pela unidade nacional iraquiana, recordamos o apoio às eleições livres em 2004, o que levou ao primeiro governo democrático do país; o convite em 2014 para se juntar à luta contra o autoproclamado Estado Islâmico e, no ano passado, o apelo para manter a calma e não recorrer à violência nas manifestações contra o alto custo de vida e a instabilidade política nacional.
Para o Papa Francisco, após o encontro em 2019 com o Grão Imame de Al-Azhar Ahmed Al-Tayyeb, um dos mais prestigiosos líderes do Islã sunita, aquele com Al-Sistani é um novo grande passo no diálogo com o Islã, como explica ao Vatican News a teóloga iraniana Shahrazad Houshmand, a primeira mulher muçulmana a obter uma Licenciatura em Teologia Fundamental Cristã e membro do Conselho de Mulheres do Pontifício Conselho para a Cultura:
R.- Este encontro é certamente um encontro histórico. Al-Sistani é o maior ponto de referência religioso, teológico e jurídico para os muçulmanos no Iraque e não só ele cobre essa função para os xiitas do Paquistão, Índia, Golfo Pérsico e também para os xiitas na Europa e na América. O encontro entre esses dois grandes líderes religiosos, além de ser uma novidade absoluta no mundo, também é importante porque esses dois guias religiosos e espirituais têm pontos de vista comuns, já que o Aiatolá Al-Sistani nutre um grande respeito pelos fiéis de outras religiões, o mesmo observado no Bispo de Roma nos últimos anos. Nesta convergência espiritual e religiosa comum, eles têm no coração toda a humanidade e, sobretudo, irão querer certamente refletir sobre a situação na região. Como sabemos, o Papa Francisco recordará dos cristãos assassinados, mas encontrando Al-Sistani, quer lançar um grito ainda mais alto e fazer com que todos os homens de boa vontade, incluindo muçulmanos e cristãos, reflitam sobre a dor de toda a humanidade. Os dois, neste encontro fraterno, amigável e de grande empatia espiritual, vão querer pedir a todos os homens de boa vontade para pensarem na dor do ser humano, enquanto ser digno de ser respeitado e amado. Já vimos na assinatura do documento excepcional de 4 de fevereiro de 2019 em Abu Dhabi, que entre o Papa Francisco e o Grão Imame de Al-Azhar Al-Tayyeb nasceu um grande acordo sobre o sentido profundo religioso e sobre o ato religioso concreto. A primeira frase que abre esse documento é, de fato, precisamente a síntese do ato religioso: o crente e a sua fé devem levar a amar e a apoiar o próximo, mas é um amor que se torna também um apoio, sobretudo pelos mais necessitados. Eu penso que esse outro encontro com o Aiatolá Al-Sistani está exatamente na mesma sintonia.
Al-Sistani é conhecido por suas posições conciliatórias e por seus apelos pela reconstrução do Iraque …
Neste ulterior passo no diálogo com os muçulmanos, os pensamentos se voltam para a Encíclica Fratelli tutti e a Declaração de Abu Dhabi. Após o diálogo fraterno com o Grão Imame de Al-Azhar e o mundo sunita, agora prepara uma aproximação semelhante com o xiita. Que leitura você faz desse acontecimento?
Os xiitas iraquianos são a maioria da população. Qual é o seu papel, quer dentro do país, como com os outros crentes xiitas?
Qual é a diferença com as comunidades xiitas iranianas, onde o xiismo está intimamente ligado à vida política e social?
Quais são as diferenças com o xiismo iraquiano?
R.- Após a revolução de 1979, os ulemás e aiatolás xiitas, especialmente com a figura de Khomeini, desenvolveram uma nova tese no seu gênero de unidade entre política e religião. A liderança também política e social deve estar sob o olhar direto do mundo religioso. Por outro lado, essa teoria não chegou ao Iraque e não foi praticada. Existe uma distinção entre o poder religioso e aquele político. Apesar disso, como sabemos, o Aiatolá Al-Sistani também desempenha um papel chave na gestão política das coisas. Embora não tenha poder político, seu poder espiritual também influencia fortemente a ideia política e, sobretudo, a unidade nacional.
Michele Raviart – Vatican News