Por Dom Antônio de Assis Ribeiro
Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém/PA
Introdução
Estamos iniciando mais um tempo quaresmal e, com ele, somos chamados a promover a Campanha da Fraternidade (CF). O tempo quaresmal nos estimula à conversão, à melhoria de nós mesmos, e isso não é possível sem revermos a qualidade da nossa relação com os outros. Eis porque fica bem o compromisso de Fraternidade. Não devemos reduzir essa mobilização numa perspectiva social. A fraternidade é, antes de tudo, um compromisso pessoal.
A cada ano a Igreja do Brasil assume um aspecto desse compromisso de promoção da fraternidade e da justiça, como caminho de exercício de conversão. Neste ano nos é proposto o tema “fraternidade e educação” e o lema “fala com sabedoria, ensina com amor” (cf. Pr 31,26).
- Quaresma: educar-se para a fraternidade
A quaresma é tempo favorável para conversão do coração para não cairmos no individualismo, na violência, na indiferença aos outros. Assim como não existe verdadeiro amor a Deus sem o amor ao próximo, também não existe autêntica conversão sem nos educarmos para a fraternidade.
A conversão profunda passa por um processo de educação de cada um de nós como mudança de mentalidade que reorienta a nossa vida, que gera atitudes novas e promove o nosso desenvolvimento integral. A educação tem uma profunda relação com a conversão da mente (nosso modo de pensar) e do coração (gestão da nossa afetividade). A educação que não gera conversão, como mudança positiva de mentalidade e estilo de vida, é estéril.
Nesta CF somos chamados a olhar para a educação com um olhar mais profundo, muito além de uma pura questão social. A educação vista à luz da fé, iluminada pela Palavra de Deus, tem uma enorme profundidade e amplitude.
A Palavra de Deus nos educa para a prática de boas obras (cf. 2Tm 3,17) que nos leva a promover a cultura do diálogo, da paz, da justiça, da fraternidade, do perdão, da solidariedade.
- Os objetivos da Campanha da Fraternidade
O texto base deste ano nos apresenta como objetivo geral da CF: “promover diálogos a partir da realidade educativa do Brasil, à luz da fé cristã, propondo caminhos em favor do humanismo integral e solidário”.
Objetivos específicos: analisar o contexto da educação e da cultura atual com seus desafios; verificar o impacto das políticas públicas na educação; identificar valores e referências da Palavra de Deus e da tradição Cristã para a educação humanizadora; pensar o papel da família, da comunidade de fé e da sociedade no processo de educação; incentivar propostas educativas; estimular a organização da Pastoral da Educação; promover uma educação comprometida com novas formas de economia, política e de progresso a serviço da Vida, em especial dos mais pobres…
- A importância da escuta
Para podermos falar com sabedoria e ensinar com amor, é necessário nos educarmos para a escuta. A educação profunda pressupõe uma atitude de escuta por parte do educador. A experiência da escuta é de fundamental importância nas relações interpessoais e na educação. Podemos dizer que não há educação onde se negligência a experiência da escuta. Aprendemos e ensinamos através da escuta, interativa.
A escuta faz parte da comunicação e isso supõe proximidade. Da mesma forma a educação. A educação é um encontro de sujeitos. Escutar é uma condição básica para a qualidade das nossas relações interpessoais, mas também para a compreensão do que se passa na sociedade; somos chamados também a “escutar” a sociedade que nos fala através dos acontecimentos.
Quem não sabe escutar também não será capaz de discernir e nem de comunicar com sabedoria. Sem a escuta que proporciona o justo diagnóstico da realidade, não será possível ensinar com amor. O amor pressupõe a acolhida do outro com suas necessidades e recursos.
Por tudo isso é de fundamental importância a pedagogia da escuta, sinal de amor e que pressupõe o silêncio.
- A educação está em muitos contextos
A educação não é uma realidade específica das escolas. Por isso, para melhor sabermos como vai a educação é necessário um amplo olhar sobre todas as realidades onde acontece a educação.
A educação de uma sociedade está na cultura, na vida das pessoas, nas relações interpessoais. A educação está por de trás dos acontecimentos e nos sinais dos tempos. Neste tempo de pandemia surgiram novos dramas humanos, mudanças sociais, desafios e conquistas. As circunstâncias sociais nos educam, exigem de nós novas atitudes e nos desafios continuamente.
A educação está na família, que é o seu berço; está nas escolas com seus múltiplos desafios pedagógicos, técnicos e profissionais; a educação está também, muitas vezes, com muita evidência nas Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, ONGs, movimentos sociais, associações; a educação está nas Instituições de Ensino superior etc. A educação ultrapassa os limites e interesses das escolas.
- Desafios da educação
A educação enquanto processo de promoção do desenvolvimento integral do ser humano enfrenta muitos desafios em todas as dimensões. Antes de tudo, a educação saudável pressupõe uma visão profunda (holística) do ser humano, acolhendo-o como um ser com muitas dimensões a serem desenvolvidas. O reducionismo é um dos mais fortes desafios para a educação em nossos dias.
Outro grande desafio da educação é aquele de pensar um projeto social amplo que implica a promoção de projeto de vida dos indivíduos. Toda educação deve mirar um ideal de sociedade. A construção de uma sociedade melhor que implica a superação dos problemas concretos, é consequência de um projeto. A educação deve estimular a cultura de processos, superando o imediatismo, o presentismo, a fragmentação; isso significa estimular a cultura do cuidado, da preventividade, do senso coletivo e estimular a elaboração de políticas públicas de desenvolvimento humano integral.
A educação é um direito humano, um bem público, por isso, não deve ser tratada como objeto de comércio. O Estado tem a responsabilidade, em parceria com a sociedade, em preservar o caráter de bem público da educação. Por isso, um plano de educação que não considera os legítimos direitos e anseios do povo é deficitário.
A educação alicerçada na dignidade humana enfrenta o desafio da promoção da cultura do encontro estimulando a superação de preconceitos, barreiras, ódio, indiferença porque a meta da educação é promover autênticas relações de fraternidade e justiça na sociedade. Isso pressupõe, portanto, a superação de uma pedagogia tecnicista.
PARA REFLEXÃO PESSOAL:
- Qual é a relação entre quaresma, educação e fraternidade?
- Por que não é possível a educação sem a escuta?
- Quais desafios da educação você percebe hoje?
Fonte: CNBB Norte 2