Por Dom Pedro Carlos Cipollini – Bispo de Santo André (SP)
Ser jovem sempre foi desafio, mas nos dias de hoje o desafio ficou mais sério e complexo. Sobe para 142% o número de abstenções, entre jovens do Grande ABC, na última eleição (cf. Diário do Grande ABC – 17/1/2021). A luta pelo futuro, muitas vezes sem perspectivas, com a desorganização de nosso sistema educacional a nível nacional, está expressa na angústia do ENEM, incerto e insuficiente.
É necessário falar dos jovens, ajudá-los e dialogar com eles. Os jovens precisam de espaço para se manifestar. Precisam de oportunidade. Precisam pais responsáveis que cuidem deles, não os abandonem ou sirvam de forma compulsiva. Um celebre escritor disse que “a juventude é a embriaguez sem vinho” (J.W. Goethe). Será?
Refletir sobre a juventude se impõe! Nosso País ainda é um País de jovens. A juventude contagia, ilumina, tem o dom de revirar as coisas. Foi assim que no ano de 1968, a “revolução dos jovens”, a partir de Paris, se espalhou pelo planeta. Foram os primeiros a perceber que um mundo velho terminava. Iniciava-se naquele período uma mudança de época.
O potencial da Juventude é imenso, os jovens são capazes de generosidade incrível, de criatividade admirável, quando unidos por uma causa. Foram eles que ajudaram a exorcizar os demônios da ditadura militar, que por longos anos amordaçaram os anseios de liberdade e participação na América Latina. A campanha pelas diretas-já, movimento pelo impedimento de Collor (os caras-pintadas), foram momentos da Juventude unida mostrar seu potencial aqui no Brasil.
A juventude é a fase da vida em que se concentram os maiores desafios e problemas, mas também, a fase de maior energia, criatividade, generosidade. As mudanças rápidas que passamos nestes últimos anos tem marcado profundamente a juventude, não raro de forma negativa. A subjetividade está na ordem do dia, ela faz os jovens substituírem a preocupação por um mundo melhor, pela preocupação com as necessidades pessoais. A vivência religiosa, que espelhava o desejo de justiça, foi substituída pela busca de espiritualidade individualista. Os jovens antes viviam a exaltação da razão, hoje acentua-se o primado das emoções e até se parte para recusa da ciência.
É difícil para os jovens lidar com tantas mudanças em meio a uma realidade na qual o dinheiro se tornou o valor único que se impõe, Há uma marca de desânimo e desespero na juventude que transparece na ansiedade. É comum encontrar jovens tristes, deprimidos, desanimados. Cresce o consumo de álcool e drogas entre os jovens, consequentemente a violência, da qual são autores e na maior parte das vezes vítimas. De fato, vivemos uma espécie de extermínio da juventude tanto fora como dentro das prisões superlotadas deles.
Reportamo-nos às chacinas de jovens, torturados e mortos. Caso de jovens assaltantes que roubam carros, matam pessoas. A crise dos jovens reflete a crise da sociedade sem ideais e sem lideranças. É o desemprego, a desintegração das famílias, a coisificação do ser humano (BBB/Tv-Globo), negação da dignidade da pessoa e por aí vai. O que nós adultos podemos fazer pelos jovens? Que caminho poderemos indicar, mais com exemplo do que com palavras?
A juventude hoje é muito sensível ao fenômeno do poder. Está chocada pelo abuso do poder que constata na realidade social. Também a autoridade constitui um problema quando não é exercida como busca do bem comum, mas como usufruto pessoal, mesclado com corrupção. O desinteresse pela política, para muitos jovens, é uma forma de protesto.
Para os jovens, o desafio de dar sentido à vida é patente. A juventude precisa reaver-se na alegria perdida. Buscar sair do relativismo para abraçar uma ética da solidariedade e do cuidado para com o próximo e com a Natureza. Voltar-se para Deus, conhecer Jesus Cristo e sua mensagem para os jovens, expressa pelo apóstolo Paulo: “Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos, renovando vossa maneira de pensar e julgar” (Rm 12,2). Onde isso já acontece, percebe-se que um novo dia amanhece carregado de esperança.
A transformação, para melhor, da sociedade globalizada e urbana, plural e ao mesmo tempo individualista, tecnológica e ao mesmo tempo espiritualista, passa pela juventude. A juventude é um desafio e uma responsabilidade para a sociedade e seu futuro.