Por Dom Antônio de Assis Ribeiro
Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém
Introdução
Parece uma questão desnecessária, mas na verdade, os fatos que contemplamos na sociedade e na vida pastoral da Igreja nos dizem que o conceito de liderança não é bem claro para muitas pessoas. Muitas vezes, não avançamos nas bases, sobretudo no dinamismo das comunidades, pastorais, grupos e movimentos, porque carecemos de líderes.
Devido a muitos sinônimos equivocados de líder e liderança, somos convocados a aprofundar essa questão tão importante. A sociedade, em geral, vive atualmente numa situação de crise de lideranças, sobretudo na área da política tanto partidária, quanto de governo. Mas a liderança vai além da política e se faz necessária em todas as dimensões da vida da sociedade.
1. O que não é liderança?
Muitas vezes o povo, de modo geral, identifica liderança com cargo, encargo, função, serviço de coordenação, missão recebida! Mas será que é isso mesmo? Há pessoas que tem cargos e não são líderes; há quem tem funções e atribuições e, no entanto, não sabem liderar. Há indivíduos com sérias responsabilidades de coordenação, mas são passivas e só agem quando empurradas!
Também não devemos confundir liderança com status, pois nem todo líder tem posição de destaque, expressividade social, reconhecimento. Por outro lado, tampouco devemos identificar liderança com poder e nem com autoridade jurídica. Há muitos que tem poder mas carecem de liderança, bem como há autoridade reconhecidas legalmente, mas vivem na mesma situação. Enfim, liderança não é cargo, não é coordenação, não é poder, não é uma responsabilidade específica, nem atribuição delegada. Liderança não é um sujeito! Não é uma realidade que vem de fora, que depende de uma situação, nem das circunstâncias…
2. O que é liderança?
Liderança é, antes de tudo, a capacidade que qualifica uma pessoa, um sujeito em qualquer contexto, profissão, vocação, idade. Liderança é um dinamismo pessoal, um conjunto de habilidades, virtudes e atitudes que destaca a vida de uma pessoa no onde vive com seus semelhantes. Trata-se de uma realidade existencial, interna que que anima e sensibiliza uma pessoa e não a deixa viver acomodada.
A liderança por ser um conjunto de virtudes e atitudes, não depende de um cargo, função, responsabilidade particular. Ninguém se torna líder por causa de um cargo, pelo contrário, é o seu caráter de liderança que o capacita a gerir responsabilidades.
A liderança é algo da pessoa e não uma realidade delegada. Ninguém delega a “liderança” a ninguém! Pode, sim, delegar um cargo, uma função, uma tarefa, atribuições. A liderança é muito mais que um serviço conferido, é um modo de ser testemunhado que depende do carisma da pessoa e seu caráter. Os cargos são temporários, periódicos, mas a liderança nos acompanha sempre enquanto temos vida, saúde e consciência.
Dessa forma, quem é líder o será sempre e em todas as circunstâncias, também estando sem função específica conferida por alguém, estando desempregado, ou aposentado. A liderança é sensibilidade, ardor interior, vivacidade mental, vigor espiritual, energia pessoal, sensibilidade socioafetiva, inquietude. Tudo isso leva a pessoa do líder a ser e viver de um modo diferente.
3. O lugar da liderança
Muitas pessoas para justificarem seus fracassos na função de coordenar determinadas funções, quando cobradas, apelam para as condições inadequadas de trabalho, falta de colaboração, lugar inadequado, carência de incentivos, rejeição dos outros, dificuldade financeira etc. São justificativas externas. Mas na verdade, na maioria das vezes, falta na pessoa o senso de liderança. O foco das preocupações do líder são as pessoas.
Visto que liderança não depende de cargos, não vem de fora, mas é um complexo de sensibilidades, virtudes e atitudes que distinguem um sujeito e que o acompanham sempre e o seguem dinamismo existencial, então, ela reside em sua mente (inteligência), nos olhos (visão), no coração (sentimentos), na língua (palavras) e em seus membros (gestos, atitudes…); ou seja, em sua pessoa e pode ser estimulada, promovida, desenvolvida. A capacidade de testemunhar liderança é fruto de conquistas, crescimento, formação pessoal. Isso não significa estudo acadêmico. Há muitas pessoas com múltiplos títulos de PhD e não são líderes!
Não há exercício de liderança sem o desenvolvimento humano pessoal. Dessa forma, liderança se aprende, não se compra, não se vende, não se empresta; liderança não se aluga, não se delega, não se negocia, não se inventa, não se doa, não se transmite! Onde não há investimento no desenvolvimento das pessoas, há uma grave limitação no serviço de liderança.
4. Manifestações de liderança
Quando observamos o relacionamento entre crianças, logo somos capazes de perceber o dom da liderança de alguns em relação aos seus colegas. Quem trabalha em escola, ou contextos semelhantes, percebe muito bem esse fenômeno. Há crianças que desde cedo já manifestam forte espírito de liderança: vão ao encontro das outras, conversam, envolvem, reúnem, animam, reclamam, falam, inventam, questionam, tomam decisões… São crianças desembaraçadas! O “desembaraço” é uma das primeiras manifestações da beleza da liderança! Assim sendo, a liderança se manifesta desde a mais tenra idade em nós como maneira de ser, pensar, agir, sentir a própria vida, relacionarmo-nos com os outros e buscar soluções para os problemas.
A liderança se manifesta, preliminarmente, na relação da pessoa consigo mesma! O líder é um sujeito que vive internamente num barulhento solilóquio! Ou seja, em contínuo monólogo, antes do diálogo. O líder desenvolve continuamente a virtude da reflexibilidade. O líder é “sujeito” da própria história e não nega a sua subjetividade onde chega e dá a sua contribuição para melhoria do seu ambiente de vida e no cuidado com os outros.
O senso de alteridade é uma das mais significativas demonstração de autêntica liderança. Consequentemente, liderar é cuidar dos outros. Nesse compromisso de atenção para com os outros o líder testemunha e estimula atitudes como a promoção do sentido de pertença, comunhão, solidariedade, ação conjunta, corresponsabilidade, proteção, unidade estimulando os liderados à consecução de um objetivo comum, beneficiando a todos. A liderança humanista torna-se virtuosa e se alicerça em princípios éticos como o zelo pela justiça, a paz, o respeito etc.
A liderança se manifesta através do espírito de iniciativa. O líder é uma pessoa proativa, que está sempre antenada às necessidades e age em favor dos outros, sobretudo, quando surgem situações imprevistas, dramas, ameaças, crises. O líder tem espírito de iniciativa porque é portador de uma profunda sensibilidade perceptiva. Dessa maneira, o líder é sujeito, não é um expectador da realidade que passivamente espera solução. Mas tendo consciência das possibilidades e recursos dá sua contribuição para transformação do mundo em que vive. A inquietude se revela como um importante aspecto da identidade de um líder!
PARA A REFLEXÃO PESSOAL:
- O que não é liderança?
- Por que liderança não é um cargo?
- Quais outras manifestações de liderança você percebe nas pessoas com as quais convive?
Confira também:
Liderança: Necessidade e Importância (Parte 1)
Fonte: CNBB Norte 2