“Somos irmãos não apenas a título de criação, mas também de redenção; não só porque todos temos o mesmo Pai, mas porque todos temos o mesmo irmão, Cristo, ‘primogênito entre muitos irmãos’.
A homilia da celebração da Paixão do Senhor da Sexta-feira Santa 2021 foi feita pelo cardeal Frei Raniero Cantalamessa, o pregador da Casa Pontifícia. O tema da sua homilia foi centralizado na recente encíclica sobre a fraternidade do Papa Francisco “Fratelli tutti” destacando que em pouco tempo “fez renascer em tantos corações a aspiração quanto a este valor universal, trouxe à luz tantas feridas contra ela no mundo de hoje, indicou algumas vias para se chegar a uma verdadeira e justa fraternidade humana”.
Significado de “irmão” para o cristão
“O mistério da cruz que estamos celebrando – disse o cardeal – nos obriga a nos concentrarmos justamente neste fundamento cristológico da fraternidade, que foi inaugurado na morte de Cristo”. “No Novo Testamento”, continua, “‘irmão’ significa, em sentido primordial, a pessoa nascida do mesmo pai e da mesma mãe. ‘Irmãos’, em segundo lugar, são chamados os membros do mesmo povo e nação”. E amplia o conceito: “Neste alargamento de horizonte, chega-se a chamar de irmão cada pessoa humana, pelo fato de ser tal. Irmão é aquele que a Bíblia chama de “próximo”. Ponderando em seguida: “Mas, ao lado destes significados antigos e conhecidos, no Novo Testamento a palavra “irmão” tende sempre mais a indicar uma categoria particular de pessoas”. (…) Porque “Todo aquele que faz a vontade do meu Pai, que está nos céus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe” (Mt 12,48-50).
Primogênito entre muitos irmãos
“Nesta linha, a Páscoa marca uma etapa nova e decisiva. Graças a ela, Cristo se torna ‘o primogênito entre muitos irmãos’ (Rm 8,29). Os discípulos se tornam irmãos em sentido novo e profundíssimo: compartilham não apenas o ensinamento de Jesus, mas também seu Espírito, sua nova vida de ressuscitado”. Frei Cantalamessa esclarece: “Depois da Páscoa, este é o uso mais comum do termo irmão; indica o irmão de fé, membro da comunidade cristã. Irmãos ‘de sangue’, também neste caso, mas do sangue de Cristo! Isso faz da fraternidade de Cristo algo de único e transcendente, em relação a qualquer outro gênero de fraternidade, e deve-se ao fato de que Cristo é também Deus”. Conclui este pensamento sobre a fraternidade afirmando: “Ela não se substitui aos demais tipos de fraternidade, baseados em família, nação ou raça, mas coroa-os”.
A fraternidade se constrói a partir de nós, sem divisões
“À luz destes conceitos pode-se fazer algumas reflexões atuais: A fraternidade se constrói (…) começando de perto, a partir de nós, não com grandes esquemas, com metas ambiciosas e abstratas”. E especifica “na Igreja Católica”. “A fraternidade católica está dilacerada!” adverte Cantalamessa, “a túnica de Cristo foi cortada em pedaços pelas divisões entre as Igrejas; (…) cada pedaço da túnica, por sua vez, é frequentemente dividido em outros pedaços. Naturalmente, falo do elemento humano dela, porque a verdadeira túnica de Cristo, seu corpo místico animado pelo Espírito Santo, ninguém jamais poderá dilacerar”. E continua “Isto, contudo, não desculpa as nossas divisões, mas as torna ainda mais culpáveis e deve nos impulsionar, com mais força, a restaurá-las”.
Não sobrepor a política à religião
“Isto é um pecado, no sentido mais estrito do termo. Significa que o ‘o reino deste mundo’ se tornou mais importante, no próprio coração, do que o Reino de Deus. Creio que sejamos todos chamados a fazer um sério exame de consciência sobre isso e a nos convertermos” conclui o cardeal.
Pastores de todo o rebanho
E sugere aprender com Jesus no Evangelho quando encontra uma forte polarização política e não fica do lado de nenhum deles. “Este é um exemplo”, explica Cantalamessa, “sobretudo para os pastores que devem ser pastores de todo o rebanho, não apenas de uma parte dele. São eles, por isso, os primeiros a ter que fazer um sério exame de consciência e se perguntar aonde estão conduzindo o próprio rebanho: se à própria parte (ou ao próprio “partido”), ou à parte de Jesus.
Por fim, o cardeal recorda “Se há um dom ou carisma próprio que a Igreja Católica deve cultivar em benefício de todas as Igrejas, este é a unidade”.