Texto do Patriarca Ecumênico Bartolomeu de Constantinopla, Bartolomeu I no aniversário da abertura do Concílio Ecumênico Vaticano II. Citando João XXIII o Patriarca afirma que o Concílio foi “a consequência lógica de toda a vida do Papa João, seus anos no Oriente foram uma escola de ecumenismo”.
Bartolomeu I, Patriarca Ecumênico de Constantinopla
Quando o Papa João XXIII anunciou a convocação de um grande concílio de todos os cristãos, surgiu a esperança no mundo ortodoxo, especialmente em nosso abençoado predecessor, o Patriarca Athenagoras, de que um grande concílio ecumênico de todas as Igrejas cristãs estava prestes a ser convocado, com o objetivo de encontrar caminhos para a unidade do Corpo de Cristo. Por outro lado, a experiência de João XXIII com o Oriente tinha sido consolidada com sua presença, como delegado apostólico, primeiro na Bulgária e depois na Grécia e na Turquia. O primeiro encontro do futuro Papa com o então Patriarca Ecumênico Basílio III, que lhe confiou sua preocupação pela desunião do mundo cristão e seu desejo de um concílio geral de todo o cristianismo, data de março de 1927.
Roncalli no Oriente
Seus anos passados na Turquia e na Grécia foram decisivos para encontrar estes dois mundos tão próximos na época, mas também tão diferentes, distantes após as dolorosas experiências que os afetaram e prestes a viver ainda novas preocupações, novas rupturas, novos conflitos. Na Turquia e na Grécia, o futuro João XXIII tornou-se um pescador de homens, seguindo a Cristo, ele se sentiu um pescador ativo, observando o trabalho árduo dos pescadores no Bósforo e se tornou um homem de caridade evangélica ao ajudar os muitos refugiados de vários grupos étnicos que se acumulavam em Istambul, em Constantinopla. Mas também sempre foi um homem espiritual na acolhida e na escuta das liturgias gregas e armênias, por causa de seu grande amor pela liturgia. Porém nem sempre foi compreendido pelos seus irmãos, nem sempre foi apoiado nesta experiência de vida, cujos frutos serão vistos durante seu pontificado e na sua visão do Concílio Vaticano II. Como foi escrito, “para Roncalli o Oriente foi uma escola de ecumenismo”. Naqueles tempos difíceis, ele conseguiu criar uma atmosfera de confiança com todos.
Concílio para os Ortodoxos
O Concílio Vaticano II era de grande interesse para o mundo ortodoxo, seus teólogos e pastores, e foi seguido em todas as suas fases e documentos. A Igreja de Roma entrou no movimento ecumênico com plenos direitos, superando a teoria do retorno, mas, sobretudo, este concílio foi verdadeiramente “a consequência lógica de toda a vida do Papa João”. Histórica foi a sua saudação no final do dia após a abertura do concílio: “Olhemo-nos assim, no encontro, para colher o que nos une, deixando de lado o que pode nos desunir…”. Portanto, recordando este Concílio do lado ortodoxo, seriam muitos os temas que despertaram vivo interesse, mas gostaríamos de lembrar um deles que pareceu importante para as sensibilidades ortodoxas, a saber, a Constituição sobre a Sagrada Liturgia e sua referência à tradição, não como um arqueologismo, mas como uma expressão viva da Igreja, enunciando o princípio do retorno “ad pristinam Sanctorum Patrum normam“, o retorno às fontes mais antigas das diversas liturgias da Igreja, destacando sua espiritualidade mais fecunda na participação ativa dos fiéis, uma comunidade que celebra, um ato pastoral que nasce da obra de Redenção de Cristo, desprovido de funções sociológicas ou psicológicas, sempre una, mesmo na diversidade dos ritos. A liturgia volta a ser uma “obra do povo” na qual o colégio sacerdotal e os fiéis formam um único corpo litúrgico, no qual cada um tem sua função particular.
São João Crisóstomo
A centralidade da Eucaristia, a oração comum, as leituras bíblicas, a concelebração, o uso da linguagem viva, a possibilidade de comunhão nas duas espécies, tudo isso remete às palavras de São João Crisóstomo: “Toda a Eucaristia foi oferecida uma vez e nunca se esgota. O Cordeiro de Deus, sempre comido e nunca consumido”. (In Epist. Ad Hebr., Hom. 17; pg 63, 131). O Papa João XXIII, já dissemos, amava a liturgia como a mais alta forma de oração da Igreja; a liturgia é um sinal de unidade entre Deus e o homem e entre o homem e Deus. Em cada rito da liturgia encontramos aquilo que une acima de tudo e para todas as coisas. O Concílio Vaticano II restaurou essa centralidade à liturgia romana; é dever de todos nós cristãos de hoje trabalhar para redescobrir nossa unidade naquele único Pão e naquele único Cálice, o Cristo “aquele que está partido sem ser dividido, que é sempre comido e nunca consumido, mas que santifica aqueles que dele participam” (Divina Liturgia de São João Crisóstomo).
Fonte: Vatican News