As palavras do Papa Francisco às autoridades de Malta: a guerra não eclodiu de repente, mas foi preparada há algum tempo com grandes investimentos e tráfico de armas
“Na noite da guerra que caiu sobre a humanidade, não façamos evaporar-se o sonho da paz”. O Papa Francisco também em Malta fala do que está acontecendo no coração da Europa. Ele pediu “por favor” para não deixar apagar o sonho da paz, a esperança de paz. Ele fala, ecoando Jorge La Pira, de uma “agressividade infantil e destrutiva que nos ameaça”, e o risco de uma “guerra fria alargada” que pode sufocar a vida de “de gerações e povos inteiros”. Não apenas daqueles que vivem em nossa terra hoje, mas daqueles que virão depois de nós.
Mais uma vez, enquanto muitos poderiam esperar que o Pontífice “abençoasse” a guerra ou pelo menos mitigasse suas palavras incômodas contra a corrida ao rearmamento que parece urgente e não pode ser adiada, Francisco profere palavras incômodas. Palavras que não são instrumentalizáveis ou redutíveis a simplificações de alinhamento. O Papa diz claramente que está ressurgindo um infantilismo nas ” seduções da autocracia, nos novos imperialismos, na difusa agressividade, na incapacidade de lançar pontes e começar pelos mais pobres”. Ele reconhece como hoje é tão difícil pensar com a lógica da paz porque “nos acostumamos a pensar com a lógica da guerra”.
Em seguida, ele fala sobre o “vento gelado” da guerra, que “também esta vez foi alimentado ao longo dos anos”. Também desta vez. Assim aconteceu no passado, naquele passado que esquecemos, mas que nossos pais ou avós conheceram, o das guerras fratricidas na Europa que se transformaram em conflitos de dimensões globais. Também desta vez, como em tempos mais recentes, quando guerras aparentemente distantes de nós foram travadas, matando centenas de milhares de pessoas inocentes e causando milhões de refugiados.
Sim, Francisco repete com convicção: a guerra não estourou de repente, mas vem sendo preparada há algum tempo. De que modo? “Com grandes investimentos e tráfico de armas”. Por isso o Sucessor de Pedro definiu como loucura a corrida armamentista, por isso nos convida a entrar em uma lógica diferente e nova, uma lógica de paz e de uma paz que não se baseia no medo e na dissuasão, mas na justiça, no diálogo, sobre um novo sistema de relações internacionais. É triste constatar como o entusiasmo pela paz, surgido após a Segunda Guerra Mundial, se desvaneceu nas últimas décadas. Não é com arsenais excessivamente carregados, nem com dispositivos extremamente poderosos e destrutivos que se constrói um futuro de convivência pacífica.
Assim, além da paz, muitos outros grandes temas, como o combate à fome, à pobreza e à desigualdade, foram de fato “desclassificados” das principais agendas políticas.
Disto, o apelo que Francisco lança de Malta: “Ajudemo-nos a auscultar a sede de paz das pessoas, trabalhemos por colocar as bases dum diálogo cada vez mais alargado, voltemos a reunir-nos em conferências internacionais pela paz, onde seja central o tema do desarmamento, com o olhar fixo nas gerações vindouras! E os enormes fundos que continuam a ser destinados para armamentos sejam aplicados no desenvolvimento, na saúde e na nutrição”
ANDREA TORNIELLI
Foto: Vatican Media