Apresentação do Senhor: delicada polifonia dos sons da vida

Por Frei Almir Guimarães

 

O ancião calara-se e, com a criança nos braços, ficara absorvido  em contemplação interior.

Apresentação do Menino  Jesus no Templo:  um quadro encantador e cheio de suspiros e delicadas filigranas. Hino de gratidão e de  despedida da vida do velho Simeão e  o  futuro do Menino que nasceu no  Natal. Uma família de Deus,  Simeão,  um homem de Deus.

Um homem, uma mulher e o Menino.  Pessoas de fé vão ao templo para apresentar ao Senhor seu Filho. Chegam a pé  caminhando pelo poeira dos caminhos. A mãe, carregando o filho todo envolvido em panos para que não resfrie.  O pai levando uma gaiola  com um par de rolas ou dois pombinhos.   Esse rito era ordenado pela lei do  Senhor.

A porta do templo encontram Simeão,  um ancião cheio de anos, de olhos brilhantes,  barba branca e um ar de confiança no amanhã, apesar do tempo de vida.  Simeão gostava de estar ali ruminando as coisas de  Deus.  Que bom quando as pessoas de idade avançada  conseguem ainda  deixar transparecer a alegria de viver! Ele, esse ancião esperava a consolação de  Israel.

Ele esperava o Messias salvador, não como um herói nacional e vitorioso  que sacudiria o jugo do ocupante romano e restituiria a Israel sua independência.  O Messias seria um homem do  Espírito.  Sua  vinda aconteceria sem  ostentação externa.  Ele seria o Servo de Javé. Atuaria sem espada,  mas com  a palavra.  Viria como o desejado das colinas eternas.  Diria palavras que salvam e libertam.  Dirigiria uma palavra também aos povos pagãos.  Mas seria contestado.  Conheceria um destino trágico, rejeitado, injuriado, reduzido ao silêncio e seria condenado à morte.   Esta era, para  Simeão,  a Consolação de Israel.  O Espírito garantia ao ancião que esse acontecimento estava para se dar.

Simeão chegava ao templo e também o casal com a criança.  Ninguém os notara.  Era gente comum. Simeão estava convencido de aquele era um evento do  Espírito.  Assim descreve a cena  Éloi  Leclerc: “Eram gente  comum sem séquito.  Gente simples que ninguém distinguia.  O velho Simeão observou-os.  Não os conhecia.  Mas subitamente invadiu-o  uma certeza. Aproximou-se da mãe, fixou os olhos na criança e docemente, com infinita precaução, tomou-a nos braços.  E pôs-se a orar em voz alta, o rosto extasiado: “Agora, Senhor, segundo a tua palavra, podes deixar partir em paz o teu servo:  porque os meus olhos viram a salvação,  que preparaste para todos os povos, luz para iluminar as nações e glória de teu povo Israel”.

Havia uma nota de tristeza naquele encontro.  Simeão,  pela convivência com as Escrituras conhecia o trágico destino do  Messias.  Voltando-se  para a  mãe  sussurrou-lhe ao ouvido:  “Vês o teu filho: está aqui para queda e reerguimento de muitos em Israel.  Será sinal de contradição.  Uma espada trespassará a tua alma. Assim serão revelados os  pensamentos de muitos corações”.

Não podemos deixar  de mencionar a presença no episódio  de  uma outra mulher  também toda de Deus.  Uma viúva de oitenta anos que não saia do templo.  O evangelista nos informa que  vivia na prática de orações e jejuns e andou  anunciando a boa  nova  a todos os que esperavam a libertação de Jerusalém. Um missionária antes da hora.  Essas pessoas simples do povo,  por via da  simplicidade  são porta-vozes de  Deus.

A  vida precisava continuar: o casal e o menino  voltaram para  Nazaré.  E  conclusão de tudo: “O menino crescia  e tornava-se forte, cheio de sabedoria; e a graça de Deus estava com ele”.


Texto para  meditação

Naquele  momento  Maria sentiu  apertar-se-lhe o coração.  Viera muito feliz, apresentar o filho ao Senhor  e oferecer-lhe o sacrifício de duas rolas.  Mas as palavras do ancião e o Espírito  que o inspirava  projetaram  de súbito em sua alma  uma luz trágica.  Não, ela não ficava desobrigada com as duas rolinhas  brancas.  Essas eram apenas uma figura pálida. A realidade era outra.  “Não quisestes  sacrifício  nem oblação, mas preparaste-me um corpo. Os holocaustos e sacrifícios pelo pecado não te agradaram.  Então eu disse;  Eis-me aqui porque de mim está escrito no livro:  Venho, ó Deus, para fazer a tua vontade” (Sl 40,7-9). Maria contemplava o filho nos braços do ancião.  A carne de sua carne seria um dia vítima.  O seu  filho seria o  Servo desfigurado  que se obstinariam em abater e que se ofereceria à morte  para a salvação de todos. Oh!  Por que nela essa dilaceração entre a carne e o  espírito?  O silêncio era completo.  Maria ouvia apenas as palpitações de seu coração. Acabava de entrar  na noite de Deus.  Jamais se sentira  tão pobre, tão afastada do Senhor.  E contudo  nunca estivera dele tão próxima.


Oração

Senhor,

nós te pedimos

por todos os que colocaram sua esperança em ti,

pelos que duvidam de poder colocar em ti sua esperança,

por aqueles que deixaram de esperar em ti,

por todos os que vivem sem esperança porque não te conhecem.

Ajuda-nos a ser portadores de esperança e a anuncia-la ao mundo  por nossos  pensamentos, palavras e atos.

Nós te pedimos em nome do Senhor Jesus,

nossa esperança viva.

Jacques Bénignus

 

Fonte: Franciscanos


FREI ALMIR GUIMARÃES, OFMingressou na Ordem Franciscana em 1958. Estudou catequese e pastoral no Institut Catholique de Paris, a partir de 1966, período em que fez licenciatura em Teologia. Em 1974, voltou a Paris para se doutorar em Teologia. Tem diversas obras sobre espiritualidade, sobretudo na área da Pastoral familiar. É o editor da Revista “Grande Sinal”.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui