Por Dom João Justino de Medeiros Silva
Administrador Apostólico da Arquidiocese de Montes Claros (MG)
A sensação de que o tempo passa cada vez mais rápido é uma observação comum. Do ponto de vista cronológico, as horas, os dias, os meses e os anos têm a mesma medida. A referida sensação é resultado não da aceleração do tempo, mas da velocidade sempre maior com que se obtém os resultados de grande parte dos trabalhos. Se pensamos a comunicação, logo se percebe como os avanços tecnológicos dispensaram, entre outros, os telégrafos, as cartas manuscritas, os telefones públicos. Grande parte da população lida diariamente com redes sociais e por elas bilhões de mensagens são trocadas todos os dias em todo o mundo. Se pensamos o transporte, em especial a tecnologia da aviação, é possível fazer viagens intercontinentais em menos de doze horas. Essas conquistas da contemporaneidade tornaram o mundo uma aldeia global.
Ao comunicar-se e ao locomover-se cada vez com maior rapidez, a pessoa tem a impressão de que o tempo corre demais, passa mais depressa. Acumula-se nas agendas um número maior de compromissos e atividades em períodos menores. E deseja-se sempre mais tempo para ser preenchido com mais atividades. Sabe-se que tal frenesi causa cansaço, estresse e desgastes físico e emocional. Mesmo assim a maioria das pessoas parece querer alongar as horas para desfrutar mais do tempo.
O tempo toca diretamente a experiência existencial de cada pessoa. Exemplo são as crianças, quando desejam que o tempo passe mais rápido para que alcancem a vida adulta. Ou os idosos, que lamentam ter o tempo de suas vidas passado tão rápido. Ou os jovens, que estão a planejar seu futuro, uma questão nítida e pertinente ao tempo. O tempo de validade não se restringe apenas a produtos a serem consumidos, mas também inclui capacidades, como a habilitação para a direção de veículos que, de tempos em tempos, precisa ser renovada. Ou exames médicos que se deve fazer com certa periodicidade. E a chamada “prova de vida”, que deve ser feita anualmente pelos que recebem benefícios previdenciários.
Começo a entender que a maturidade humana passa pela boa relação com o tempo. Superar a visão do tempo como algoz que estaria a castigar-nos com o irrefreável tique-taque dos minutos, com uma percepção mais amiga da condição temporal da existência. Numa linguagem, franciscana, alcançar a liberdade de tratar o tempo como irmão. Nesse sentido, é de estupenda beleza o que escreve Raduan Nassar em sua obra Lavoura Arcaica: “…rico não é o homem que coleciona e se pesa no amontoado de moedas, e nem aquele, devasso, que se estende, mãos e braços, em terras largas; rico só é o homem que aprendeu, piedoso e humilde, a conviver com o tempo, aproximando-se dele com ternura, não contrariando suas disposições, não se rebelando contra o seu curso, não irritando sua corrente, estando atento para o seu fluxo, brindando-o antes com sabedoria para receber dele os favores e não a sua ira; o equilíbrio da vida depende essencialmente deste bem supremo, e quem souber com acerto a quantidade de vagar, ou a de espera, que se deve pôr nas coisas, não corre nunca o risco, ao buscar por elas, de defrontar-se com o que não é; porque só a justa medida do tempo dá a justa natureza das coisas…”. O ano novo seja tempo para você conquistar essa riqueza: saber conviver com o tempo. Feliz 2022!
Fonte: CNBB