Advento da fraternidade

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Por Dom Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo de Belo Horizonte e presidente da CNBB

 

Cantada em verso e em prosa, a trilogia igualdade, fraternidade e liberdade precisa inspirar e desafiar, cotidianamente, os cidadãos. Desafio e inspiração que equilibram e fecundam a identidade e a missão das instituições responsáveis por configurar as feições da sociedade. Desconsiderar os princípios da igualdade, fraternidade e liberdade é enfraquecer a democracia. Significa também distanciar as relações sociais, políticas e econômicas dos parâmetros de inegociável racionalidade e sustentabilidade. As deteriorações humanas, comprovadas pelos cenários de desigualdade social e violência, são consequências desse distanciamento. Por isso mesmo, os princípios essenciais à democracia permanecem consolidados por legislações em cartas magnas, incorporados em indispensáveis e arrojadas políticas públicas, fecundados por valores culturais. Trata-se, pois, de uma luta prioritária trabalhar pela garantia e exequibilidade dessas importantes bases que são também horizontes inspiradores. Ressalte-se: dentre essas bases, o princípio da fraternidade tem peculiaridades e dinâmicas próprias. É determinado por modos de agir que se relacionam com o que cada pessoa leva no coração, sustentando o exercício cidadão nos parâmetros da vocação missionária de se promover o bem comum, a justiça e a paz. O ser humano é instado a ter no horizonte de seu caminho a responsabilidade de manter acesa a chama do advento da fraternidade.

O advento da fraternidade depende de práticas e de referências importantes, inspiradoras e impulsionadoras de novos ciclos, novas dinâmicas. Assim, é capaz de ajudar a construir novos tempos, qualificando o ser humano para se relacionar com o seu semelhante. Isto significa também gerar mais equilíbrio e justiça social na sociedade. No horizonte do advento da fraternidade surge a pessoa de Jesus Cristo, conforme sempre evidencia a Igreja, de modo novo e apaixonado, especialmente no tempo de preparação para o Natal. A pessoa de Jesus Cristo é a centralidade da celebração do Natal, oportunidade para encontrá-lo. O Mestre é Aquele que vem, inspirando a ida de todos ao encontro Dele. A presença de Jesus carrega, no seu significado e alcance, tudo o que se pode encontrar de bom, propício e fecundo em igualdade, liberdade e fraternidade. Sua mensagem condensa as bases da experiência da fraternidade, que alavanca a vivência da liberdade e da igualdade.

Magistral e oportuna, para fecundar a experiência da celebração do advento do Salvador do mundo, Jesus Cristo, é a Carta Encíclica Fratelli Tutti, do Papa Francisco: convocação para que a humanidade invista no advento da fraternidade. E o advento do Menino Deus é o advento da fraternidade, que tem a sua fonte e ápice na vinda do Salvador. Há de se compreender, pois, que o advento da fraternidade se dará por meio de uma vida vivida com o sabor do Evangelho de Jesus Cristo. Conforme sublinha o Papa Francisco, trata-se de aceitar o convite a um amor que ultrapassa as barreiras geográficas e espaciais, sem preconceito algum e sem qualquer abominável discriminação, encontrando a felicidade maior, mais completa e duradoura, aquela que vem da alegria de amar o outro como irmão e irmã. A fraternidade tem uma essencialidade simples. Permite, a partir do coração, reconhecer, valorizar e amar todas as pessoas independentemente de sua proximidade física, do ponto da terra onde nasceu ou reside, ressalta a Carta Encíclica.

Legislações indispensáveis, para garantir a defesa de direitos e a promoção da justiça, são muito importantes, e precisam de redação assertiva ancoradas nos princípios da igualdade e da liberdade. De modo ainda mais profundo, a fraternidade exige o coração humano, que precisa ser berço-fonte de uma espiritualidade que fecunde a interioridade, produzindo convicções capazes de efetivar a longanimidade de um querer bem universal. Universal sem generalizações, mas abrangente na especificidade de ser irmão e irmã de verdade e efetivamente de todos. O advento do Natal do Senhor carrega a força transformadora da fé, garantindo, incondicionalmente, a competência de enxergar o próximo para além de eventuais afinidades, interesses, programas ou projetos partilhados. A fraternidade humana constitui capítulo central na vida dos discípulos de Jesus, comprometidos com a salvaguarda da criação, unidos a todas as pessoas, especialmente aos mais pobres e necessitados. A fraternidade humana é, pois, um valor transcendente, que fortalece a indispensável e urgente solidariedade, inspirando profecia, lucidez das escolhas e respostas para problemas sociais.

O advento do Natal é convocação para investir na conquista e na efetivação do advento da fraternidade – remédio para o descompasso do mundo, equilibrando interioridades e a rede de relações humanas. O projeto de consolidação do advento da fraternidade é grandioso, inigualável em importância, mas é construído a partir de pequenos passos no dia a dia, superando litígios, não se permitindo agir agressivamente, revestindo-se de humildade. Confrontos raivosos ou imposições não comunicam o amor de Deus, não curam feridas e nem levam a entendimentos iluminadores. A fraternidade é o caminho certo e singular para se alcançar a verdadeira paz interior. Uma fonte de sabedoria que conduz o ser humano à justiça, na via da igualdade e da liberdade. Com o advento do Natal do Senhor fecunde-se a efetivação do advento da fraternidade.

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