Dom Pedro Brito Guimarães
Arcebispo de Palmas (TO)
“Não se perturbe o vosso coração! Credes em Deus, credes também em mim” (Jo 14,1).
É consenso entre nós, cristãos, que a Igreja nasceu da Páscoa de Cristo. Na cruz Jesus inclinou sua cabeça, entregou o seu espírito e na manhã da Páscoa ressurgiu vivo e vencedor da morte. Por isto a Páscoa é o centro da vida cristã. E a Semana Santa é o grande Retiro Espiritual para o povo de Deus. Embora na literatura teológico-litúrgica não exista esta expressão, na prática, ultimamente é largamente utilizada: “o feriadão de páscoa”: tempo de descanso, de passeio, de curtir, de turismo… Parece com um ditado italiano “o Natal com os seus e a Páscoa com quem quiser”. Este ano, ao que parece, a Páscoa será celebrada, em casa, com os seus e não aonde quiser e com quem quiser.
Do Domingo de Ramos ao Domingo da Páscoa há a oportunidade de se viver dos grandes retiros: o primeiro, de Domingo de Ramos à Quinta-feira Santa, complementamos o Retiro Quaresmal; e o segundo, da Quinta-feira Santa ao Domingo da Páscoa, iniciamos o Retiro Pascal.
A seguir, proponho um breve guia litúrgico-espiritual para viver a Semana Santa, em casa, para quem certamente, não poderá ir à Igreja:
Comece lendo, ruminando, saboreando, até à jubilação, este poema de São João Crisóstomo, como o Cartão de Páscoa, deste ano de 2021: “Venha gozar do encanto desta festa quem tem piedade e quem ama o Senhor. Entre alegre na alegria do seu Mestre quem é servidor fiel! Quem suportou o peso do jejum: venha agora pegar o seu pagamento! Quem trabalhou desde a primeira hora, receba hoje o justo salário! Quem chegou na terceira hora: celebre a festa na ação de graças! Quem chegou somente após a sexta hora: não tenha medo, pois, não será prejudicado! Se alguém se atrasou até a sexta hora: aproxime-se sem hesitar! O operário da undécima hora não sofrerá por seu atraso! (…) Entrem todos na alegria de nosso Senhor! Vocês que são os primeiros e vocês que chegaram por último: venham receber o salário! Vocês que jejuaram e vocês que não jejuaram. O novilho gordo está servido: que ninguém saia com fome! Alegrem-se todos com o banquete da fé!”
Adote como lema da sua Semana Santa o que Jesus disse aos seus discípulos, quando, em oração, no Getsêmani: “vigiai e orai para não cairdes em tentação” (Mt 26,41). As tentações serão muitas. A carne é fraca, mas sempre se vence pela Páscoa da Ressureição.
Comece o seu retiro vivendo o Domingo de Ramos, como a porta de entrada da Semana Santa. Ele é carregado de sentidos e de significados e rico de simbolismos populares, que estão nas mentes e nos corações de muitos católicos: a procissão, o jumentinho, os lenços, os ramos e o gritos de hosana. E todos os outros dias da Semana Santa são também cheios desses simbolismos populares: a toalha, a bacia, o lava-pés, o pão, o vinho, a eucaristia e a adoração, o sangue, a cruz, o beijo e a adoração, o fogo, o círio, a água, as promessas batismais e cantos de exultação, de glória e de aleluia. Muitos destes símbolos poderiam estar presentes, em vários momentos e em várias partes da casa, enfeitando e simbolizando cada dia da Semana Santa.
Relembre, revisite, retome e ressignifique as rezas, as orações, os benditos, os cantos, os ritos, as devoções, as comidas, os costumes e as manifestações populares da sua infância, da sua família e da sua comunidade.
Adote, em toda a Semana Santa, um clima de silêncio, de escuta, de oração e de súplicas pelo fim da pandemia.
Mantenha ao alcance das mãos, dos olhos e do coração os textos das Liturgias da Palavra, para cada dia da Semana Santa.
Escolher um horário, um lugar e uma posição do corpo que melhor facilite a sua respiração e a sua concentração, e seja fiel a estas suas escolhas.
Associe as cruzes, as dores, os sofrimentos e a morte de Jesus às cruzes, às dores, aos sofrimentos e às mortes de muitos de nossos irmãos e irmãs, neste tempo de pandemia. A paixão de Cristo está disseminada na paixão do mundo.
Pratique gestos de solidariedade e de fraternidade para com alguém que você conhece e que, certamente, está mais sofrido, mais carente e mais necessitado do que você. A coleta da Sexta-feira Santa, para os cristãos da Terra Santa, é uma das propostas que faço.
Não deixe de participar, por nenhum motivo, mesmo que não seja presencial, das celebrações da Semana Santa.
Plante, regue, pode, cuide e colha algo ligado à natureza, a nossa casa comum, a fim de transformar a sua Semana Santa ecológica, numa Laudato Si, numa Querida Amazônia e numa Fratelli Tutti.
E, por fim, contemple e celebre, como Maria Madalena e as outras mulheres, João, Pedro e os outros apóstolos, o Dia da Ressurreição de Jesus. Não chegar à Páscoa é parar no meio do caminho cristão e não chegar ao seu final. A Páscoa é a Festa da Vida e não da morte. Com este espírito, vamos celebrá-la.