A Sagrada Escritura

Imagem: “The Unjust Judge” (1628), por Pieter de Grebber - Museu de Belas Artes, Budapeste

Por Pe. Johan Konings

 

Antigamente os protestantes se distinguiam dos católicos porque “liam a Bíblia”, como se dizia. De uns tempos para cá, isso mudou. A Bíblia faz parte também do lar católico e, espera-se, não só para ficar exposta sobre um belo suporte de madeira entalhada… O Concílio Vaticano II nos exorta a ler a Sagrada Escritura, usando as mesmas palavras de Paulo na 2ª Leitura de hoje: a Escritura “comunica a sabedoria que conduz à salvação”, “é inspirada por Deus e pode servir para denunciar, corrigir, orientar”.

Ora, essa recomendação de Paulo e do Concílio deve ser interpretada como convém. Não significa que cada palavrinha isolada da Sagrada Escritura seja um dogma. A Escritura é um conjunto de diversos livros e textos que devem ser interpretados à luz daquilo que é mais central e decisivo, a saber, exemplo de vida e o ensinamento de Jesus.

O centro e o ponto de referência de toda a Sagrada Escritura são os quatro evangelhos. Em segundo lugar vêm os outros escritos do Novo Testamento (as Cartas e os Atos dos Apóstolos), que nos mostram a fé e a vida que os discípulos de Jesus quiseram transmitir. A partir daí podemos compreender como a Bíblia toda deve ser interpretada, para ser “sabedoria que conduz à salvação”, tanto o Novo Testamento como o Antigo (ou Primeiro), que nos mostra o caminho de vida que Jesus, como verdadeiro “filho de Israel”, levou à perfeição.

A recomendação de Paulo significa que a nossa fé deve ser entendida à Luz das Escrituras. Jesus usou as palavras do Antigo Testamento para rezar e para anunciar a boa-nova do Reino. Sem conhecer o Antigo Testamento, não entendemos a mensagem de Jesus conservada no Novo. Jesus é a chave de leitura da Bíblia. Isso é muito importante para não fazermos de qualquer frase do Antigo Testamento um dogma definitivo! A lei do sábado, por exemplo, deve ser interpretada como esse profundo senso da humanidade que tem Jesus. As ideias de vingança, no Antigo Testamento, à luz de Jesus aparecem como atitudes provisórias e a serem superadas. Todos os trechos da Bíblia, por exemplo, as parábolas de Jesus, devem ser entendidos dentro do seu contexto e conforme seu gênero e intenção. Não devem ser tomados cegamente ao pé da letra. Muitas vezes apresentam imagens que querem exemplificar um só aspecto, mas não devem ser imitados em tudo (cf. o administrador esperto, no 25º dom. T.C).

Também importa ler a Sagrada Escritura no horizonte do momento presente, interpretá-la à luz daquilo que estamos vivendo hoje. Sem explicação e interpretação, a Bíblia é como faca em mão de crianças, ou como remédio vendido sem a bula: pode até matar! Ora, a interpretação se deve relacionar com a vida do povo. Por isso, o próprio povo deve ser o sujeito desta interpretação, mediante círculos bíblicos e outros meios adequados.

Fonte: Franciscanos


PE. JOHAN KONINGS nasceu na Bélgica em 1941, onde se tornou Doutor em Teologia pela Universidade Católica de Lovaina, ligado ao Colégio para a América Latina (Fidei Donum). Veio ao Brasil, como sacerdote diocesano, em 1972. Em 1985 entrou na Companhia de Jesus (Jesuítas) e, desde 1986, atuou como professor de exegese bíblica na FAJE, Faculdade Jesuíta de Filosofia e Teologia, em Belo Horizonte. Faleceu no dia 21 de maio de 2022.  Este comentário é do livro “Liturgia Dominical, Editora Vozes.

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