“A nova visão dos padres conciliares é de uma pirâmide invertida, onde o Papa e os bispos são servos e estão colocados na base da pirâmide. Por isso a Constituição sobre a Liturgia, antes mesmo que as discussões conciliares chamassem a atenção sobre o assunto, se colocara instintivamente no ângulo visual oposto.”
“Antes do Concílio Vaticano II se pensava a Igreja como uma pirâmide, onde o Papa e os bispos estivessem no topo da pirâmide, do qual não só a construção recebia coesão como, ao que parece, derivariam todas as estruturas e linhas de ação. Daí resultava uma ilusão ótica não só de que todo o ser da Igreja se concentraria na hierarquia, da qual o povo de Deus seria um simples apêndice, um objeto e nunca protagonista na ação eclesial. Nessa visão, todo o poder derivaria imediatamente do Papa, do qual os bispos pareceriam simplesmente funcionários delegados.
A nova visão dos padres conciliares é de uma pirâmide invertida, onde o Papa e os bispos são servos e estão colocados na base da pirâmide. Por isso a Constituição sobre a Liturgia, antes mesmo que as discussões conciliares chamassem a atenção sobre o assunto, se colocara instintivamente no ângulo visual oposto. Somente nesta perspectiva é valorizada e compreendida a doutrina que afirma que a hierarquia e os seus poderes (entenda-se carismas), embora derivados de Deus e não do povo, estão todos a serviço do povo de Deus (plebs Dei), que é a do sacerdócio universal dos fiéis, cujas celebrações litúrgicas são de natureza comunitária, embora hierarquicamente estruturadas.
Segundo a terminologia usada por São Cipriano, a Igreja é “sacramento de unidade” (unitatis sacramentum), porque é causa, expressão e símbolo da unidade que liga os homens com Deus e entre si por participação na unidade que existe entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Nessa perspectiva entende-se melhor a constituição Sacrosanctum Concilium, no artigo 26, quando fala assim: “As ações litúrgicas não são ações privadas, mas celebrações da Igreja, que é “sacramento de unidade”, povo santo reunido e ordenado sob a direção dos bispos. Por isso, estas celebrações pertencem a todo o corpo da Igreja, manifestam-no e implicam-no; mas atingem a cada um dos membros de modo diferente, conforme a diversidade de ordens, dos ofícios e da atual participação”.
A Igreja Universal é constituída pela união das Igrejas locais em virtude da comunicação dos bispos entre si e da unidade que daí resulta, e que a comunhão com o Papa, como diz São Cipriano, é um princípio insubstituível.
Por isso, o chamado que o Senhor faz aos pastores não é uma glória ou um cargo, um posto elevado, mas uma humilde missão recebida para servir o Povo Santo de Deus. A Constituição Dogmática Lumen Gentium, no número 24, fala assim em relação a missão dos bispos: “Este encargo que o Senhor confiou aos pastores do Seu povo é um verdadeiro serviço, significativamente chamado «diaconia» ou ministério na Sagrada Escritura (cf. At 1, 17 e 25; 21-19; Rom 11, 13; 1 Tim 1,12).”. Nesse contexto, entenda-se que o Papa não é um rei, um imperador ou príncipe com poder de mando, mas o “servo dos servos”, em sua missão de governar a Igreja. Os ministros ordenados estão a serviço de todo o Povo de Deus.”
Fonte: Vatican News – por Padre Gerson Schmidt, ordenado em 2 de janeiro de 1993, em Estrela (RS). Além da Filosofia e Teologia, também é graduado em Jornalismo e é Mestre em Comunicação pela FAMECOS/PUCRS.