A linguagem corporal na liturgia

Imagem de Carlos Daniel em Cathopic

A Sagrada Liturgia é ação da Igreja, fazendo memória da ação ou da obra da salvação, realizada por Cristo. Deus tomou corpo em seu Filho e deseja que a humanidade toda se torne corpo de Deus. A festa do Santíssimo Corpo e Sangue de Cristo é chamada também “Corpo de Deus”. Em Cristo, Deus assumiu corpo humano. E é através do corpo que o ser humano pode comunicar-se com Deus, com o próximo e com todo o criado.

Este fato nos leva a refletir sobre a corporeidade na Liturgia. Como já vimos num artigo anterior, na Liturgia o ser humano age e se comunica através de suas faculdades, a inteligência, a vontade e o sentimento, e por todos os seus sentidos, isto é, o ouvido, a vista, o olfato, o paladar e o tato. O ser humano age e se comunica de corpo inteiro.

O ouvido: Talvez seja o sentido mais fundamental. A fé vem pelo ouvido. Através do ouvido tomamos conhecimento dos mistérios que são celebrados. Pomo-nos à escuta, abrimo-nos para o plano de Deus da criação e da salvação. Ouvir tem a ver com obedecer. Ouvir é obedecer. Ouvindo a Palavra de Deus na Liturgia, obedecemos, damos uma resposta positiva a Deus. Pensemos na Missa. Somos todo-ouvido: o diálogo com o sacerdote, a escuta da Palavra de Deus, fazendo nossas as orações proferidas pelo sacerdote, ouvindo. Ouvimos o canto com sua mensagem, sobretudo, um canto a mais vozes. Rezamos pelo ouvido.

A vista: Somos chamados a contemplar a face de Deus. Na Liturgia acompanhamos o drama sagrado que se desdobra diante de nós. Temos a arte da cor. A pintura, a escultura, a arquitetura, o espaço sagrado. Acompanhamos as ações do sacerdote, seus gestos, suas ações, suas posturas corporais. Pela vista acompanhamos as ações dos ministros, os movimentos das procissões de entrada, do Evangeliário, da apresentação dos dons, da Comunhão. Rezamos, entramos em comunhão com Deus através da vista.

O olfato: Demos como exemplo o incenso que não foi abolido. Pensemos também no óleo perfumado do Santo Crisma. O espaço celebrativo deveria transmitir um suave odor. Que possamos ser como Maria Madalena, que perfumou os pés de Cristo com precioso perfume. Somos chamados a perfumar o corpo de Cristo através dos gestos de amor. E que nossa oração seja como incenso perfumado que se eleva a Deus. Rezamos até pelo nariz.

O paladar: Este sentido está menos presente na Liturgia. Mas, encontra-se no coração da Liturgia, na Eucaristia. O Concílio manda os cristãos comerem a Ceia do Senhor, degustar Deus. Diz São Francisco nos Louvores ao Deus Altíssimo: “Vós sois toda a doçura”. Somos convidados a comer o Corpo do Senhor e a beber o seu Sangue. É o mais profundo ato de adoração, a mais intensa oração, a mais plena comunhão com Deus.

O tato: Outra forma de Deus se comunicar com o ser humano é o tato. Deus toca a humanidade, santificando-a. Toca a humanidade, assumindo-a pela encarnação do seu Filho Jesus Cristo. Toca a humanidade dando-se como comida e bebida. É muito ilustrativa a linguagem do toque na Liturgia do batismo. O primeiro toque acontece no rito de acolhida pela a assinalação com o sinal da cruz na fronte. Depois, temos a unção no peito, para que o batizando tenha a força do Espírito a fim de renunciar ao mal e professar a fé. O toque por excelência é o toque da água fecundada pelo Espírito Santo.

Finalmente, temos os ritos explicativos: a unção do vértice da cabeça, a veste branca, a vela acesa e o toque nos ouvidos e na boca para que o batizado possa ouvir logo a Palavra de Deus e confessá-la por sua vida. No matrimônio, sacramento do amor, fonte de vida, a linguagem sacramental é, sobretudo, a linguagem corporal do toque, banhada pelo gozo da sexualidade. Tudo o que é humano é valorizado na Liturgia, tudo é divinizado; tudo pode transformar-se em oração.

Fonte: Franciscanos – Especial Gotas de Liturgia /Frei Alberto Beckhäuser

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