A dificuldade de enxergar o “Jesus da gente”

Imagem ilustrativa de Frei Fábio Melo Vasconcelos

Por Frei Gustavo Medella

 

Para quem pensa a partir do centro, seja do poder, da política e da economia, torna-se inimaginável conceber que a salvação venha da periferia. É difícil admitir que a solução venha de uma pequena vila em vez de surgir no coração da metrópole, que a resposta não venha de Dubai, mas do Paraguai. Por isso, o Messias proveniente de Nazaré era um escândalo para quem tinha os olhos voltados a Jerusalém. Mais de 2000 anos se passaram desde que Deus pregou esta peça na humanidade. No entanto, ainda que o Cristianismo apresente considerável número de adeptos no mundo, a mentalidade preponderante, inclusive dentre os que se dizem seguidores do Mestre, ainda é aquela regida pelos sonhos de grandeza que a lógica do centro inspira.

No Carnaval de 2019, a Estação Primeira de Mangueira trouxe para a Avenida o enredo que descrevia um tal “Jesus da Gente”, Messias identificado com as camadas mais invisíveis da sociedade, gente paupérrima, anônima, lutadora, assolada por sofrimentos de toda sorte. Atualização sintonizada com a lógica proposta pelo Evangelho, mas ainda difícil de ser aceita e digerida, tanto que a Escola de Samba carioca chegou a ser acusada, inclusive, de desrespeitar a religião. Difícil mudar a cabeça de quem se nega a dar um passo além do solo onde pisa.

O discipulado, no entanto, é um convite constante à desinstalação geográfica e existencial. É um desafio permanente ao cristão reconhecer que o Mestre sempre será capaz de surpreendê-lo, revelando-se nas situações mais inusitadas. Vencer o estranhamento inicial para abraçar o Cristo onde quer que Ele se apresente é um gesto que liberta e dá um novo sentido para vida. Francisco, por exemplo, deixou-se alcançar pelo Cristo que se apresentou a ele na figura de um leproso. E a nós, onde e em quem Jesus estará se apresentando?

Fonte: Franciscanos


FREI GUSTAVO MEDELLA, OFM, é o atual Vigário Provincial e Secretário para a Evangelização da Província Franciscana da Imaculada Conceição. Fez a profissão solene na Ordem dos Frades Menores em 2010 e foi ordenado presbítero em 2 de julho de 2011. 


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