Por Dom Antônio de Assis Ribeiro
Bispo Auxiliar da Arquidiocese de Belém/PA
Introdução
Foi muito significativa a contribuição dos profetas para a saúde religiosa, moral e política do povo de Israel. Eles foram profundamente sensíveis aos temas sociais; não só denunciaram problemas, mas foram propositivos nos ensinamentos, alertando, inspirando e educando o povo à superação dos problemas.
O fio condutor e referência de confronto proposto para o povo em todos os contextos era a Aliança do Amor de Deus para com o povo. Para todos os profetas “amor com amor se paga!”, mas nem sempre o povo foi capaz de viver esse compromisso de reciprocidade (cf. Baruc, 1-5). Por isso a palavra educativa dos profetas está nessa perspectiva de educar o povo para a fidelidade a Deus através da prática das virtudes.
Esta breve apresentação é simplesmente uma pequena amostra da densidade educativa dos ensinamentos dos profetas. Apesar da diversidade de contextos históricos e das áreas de atuação, a postura educativa deles foi sempre provocante. Por isso podemos afirmar que o profeta é educador, porque movido por nobres ideias e, alimentado pela esperança, estimula novas atitudes e sonha com a transformação da realidade.
Essa é uma das mais significativas insistências do profeta Isaías. Diz o profeta: “quando vocês estão jejuando, só cuidam dos próprios interesses e continuam explorando quem trabalha para vocês. Vejam! Vocês jejuam entre rixas e discussões, dando socos sem piedade. Não é jejuando dessa forma que farão chegar lá em cima a voz de vocês. O jejum que eu quero é este: acabar com as prisões injustas, desfazer as correntes do jugo, pôr em liberdade os oprimidos e despedaçar qualquer jugo; repartir a comida com quem passa fome, hospedar em sua casa os pobres sem abrigo, vestir aquele que se encontra nu, e não se fechar à sua própria gente” (Is 58,4.6-7).
Vivendo num mundo marcado pela violência da qual também ele foi vítima, o profeta Jeremias educa as autoridades dizendo: “pratiquem o direito e a justiça. Libertem o oprimido da mão do opressor; não tratem com violência, nem oprimam o imigrante, o órfão e a viúva; não derramem sangue inocente neste lugar” (Jr 22,2-3). “Ai daquele que constrói a sua casa sem justiça e seus aposentos sem direito, que faz o próximo trabalhar por nada, sem dar-lhe o pagamento” (Jr 22,13).
O profeta Jeremias foi também muito sensível às questões religiosas, observou em seu tempo muitos falsos profetas e sacerdotes interesseiros que os chamava de “vendedores de ilusões”. Preocupado com o povo para que não se deixassem enganar dizia: “Não dêem atenção às palavras dos profetas que profetizam para vocês. Eles enganam vocês, a visão que eles anunciam é fruto da imaginação, e jamais saiu da boca de Javé” (Jer 23,16). Muito sensíveis à dimensão religiosa também foram os profetas Malaquias e Zacarias. Malaquias acusou o povo e a negligência sacerdotal e os educou para a honestidade religiosa, pois não podemos trapacear a Deus (cf. Ml 1,12-14;3,6-9). Na perspectiva desses profetas a fé deve ser educada para a retidão, pois há uma íntima relação entre ética e vida religiosa. Não se pode cultuar a Verdade enganando a si mesmo e aos outros.
Essa é uma significativa sensibilidade do profeta Ezequiel que, estando na casa de um oleiro e observando o seu trabalho com o barro dando forma aos objetos, questiona o povo: “Por acaso será que não posso fazer com vocês, ó casa de Israel, da mesma forma como agiu esse oleiro? – oráculo de Javé. Como barro nas mãos do oleiro, assim estão vocês em minhas mãos, ó casa de Israel” (Ez 18,6). O processo de formação que percorremos vai moldando as nossas atitudes e assim crescemos nas virtudes. Por isso precisamos nos educar para obediência tanto a Deus quanto às exigências civis.
A sensibilidade educativa do profeta Ezequiel nos leva à convicção de que cada um é responsável pela própria história com suas múltiplas escolhas. O profeta afirma a existência da nossa liberdade e da responsabilidade. Havia entre os Israelitas um provérbio que dizia que se os pais comessem uvas verdes os filhos nasceriam com a boca defeituosa (cf. Ez 18,2-3). Todavia o profeta contestou esse modo de pensar. O erro dos pais não gera pena para os filhos, cada um deve ser livre e responsável por seus atos (cf. Ez 18,1-18). “O indivíduo que age de acordo com os meus estatutos, que guarda as minhas normas, praticando corretamente a verdade, esse indivíduo é justo, e certamente permanecerá vivo!” (Ez 18,9).
Após desenvolver a doutrina da responsabilidade individual o profeta Ezequiel também apresenta ao povo a necessidade da corresponsabilidade comunitária. Cada indivíduo na comunidade, além de cuidar de si mesmo da melhor maneira possível fazendo o bem e evitando o mal, é chamado também a cuidar dos outros e ajudá-los para que não caiam no mal. Diz o profeta: “se você não avisa o injusto para que mude de comportamento, o injusto morrerá por causa de sua própria culpa, mas é a você que eu pedirei contas do sangue dele. Ao contrário, se você prevenir o injusto para que ele mude de comportamento, e ele não mudar, ele morrerá por causa de sua própria culpa, mas você terá salva a sua própria vida» (Ez 33,8-9). A sensibilidade comunitária visa prevenir o mal.
O profeta Elias, fugindo do Rei Acab que queria matá-lo, recebeu a Palavra de Deus dizendo-lhe que deveria ir à cidade de Sarepta onde seria alimentado por uma pobre viúva. Chegando lá, encontrou uma senhora muito pobre com seu filhinho; mas além de pobre, era pessimista, egoísta e estava fechada a qualquer forma de partilha do pouco alimento que tinha. Negando-se a compartilhar o seu alimento com o profeta, este a educa a ser generosa confiando na providência Divina. A mulher foi convencida e fez o que Elias tinha mandado. E comeram, tanto ele como também ela e o filho, durante muito tempo. A vasilha de farinha não se esvaziou e a jarra de azeite não se esgotou (cf. 1Re 17,7-16). Também o profeta Zacarias, refletindo sobre a importância do dízimo convoca o povo a dar a própria contribuição para que nada faltasse na Casa do Senhor (cf. Zc 3,6-12). Apesar do sofrimento, mas com o povo arrependido no exílio da Babilônia, o profeta Baruc mobiliza uma campanha em prol da ajuda dos irmãos judeus que tinham ficado em Jerusalém (cf. Br 1,1-12).
O profeta Amós, concentrou o seu olhar sobre a questão da justiça social. Observando a injustiça dos governantes declara a necessidade de mudanças de atitudes “porque esmagam o fraco, cobrando dele o imposto do trigo, eles poderão construir casas de pedras lavradas, mas nelas jamais irão morar; poderão plantar vinhas de ótima qualidade, mas do seu vinho não beberão” (Am 5,11-12). Vendo a injustiça nos tribunais chama os juízes à conversão: “Convertam-se! Procurem o bem e não o mal; então vocês viverão. Quem sabe, assim – como vocês dizem – Javé, Deus dos exércitos, estará com vocês. Odeiem o mal e amem o bem; restabeleçam o direito no tribunal!” (Am 5,13-15). Os ricos e opressores são acusados e educados para a prática da justiça (cf. Am 5,4-8).
No livro do profeta Daniel temos uma concepção de educação como instrumento de promoção da dominação. Nabucodonosor, rei da Babilônia, domina Jerusalém, se apossa dos seus bens e investe na promoção de uma cultura dominadora através da educação dos jovens. Os jovens selecionados deveriam ser preparados durante três anos e depois passariam a servir aos interesses do rei (cf. Dn 1,3-7).
O profeta Oseias chama a atenção do povo para a reflexão e a experiência da misericórdia e a ternura divina. Segundo o profeta Deus não é alheio aos sofrimentos humanos (cf. Os 6,1-2). Mas é necessário que haja esforço pessoal para conhecer a Deus (cf. Os 6,3), pois o que ele quer é o amor e não sacrifícios, o conhecimento da sua ternura, mais do que holocaustos (cf. Os 6,6).
PARA REFLEXÃO PESSOAL:
Fonte: CNBB Norte 2