Por Dom João Santos Cardoso
Arcebispo de Natal (RN)
Na Mensagem para o 58º Dia Mundial das Comunicações Sociais, celebrado neste domingo, 12 de maio, o Papa Francisco discute os impactos e os desafios éticos trazidos pela inteligência artificial na comunicação e na sociedade e nos convoca a ponderar sobre seu papel e influência em nossa compreensão do mundo e na forma como nos comunicamos. Ele enfatiza a necessidade de uma “sabedoria do coração” para guiar o uso ético e humano dessas tecnologias, destacando os riscos associados, como desinformação e manipulação, e a importância de regulamentações éticas e transparência.
A denominação “inteligência artificial” (IA) é considerada por muitos, incluindo o Papa Francisco, como falaciosa. A IA, apesar de sua capacidade avançada de processar e analisar grandes quantidades de dados rapidamente, carece de consciência, emoção e moralidade—atributos essenciais da verdadeira inteligência humana. Segundo o Papa Francisco, o termo “aprendizado de máquina” (machine learning) é tecnicamente mais preciso, pois descreve melhor a capacidade dos sistemas de IA de melhorar seu desempenho sem programação explícita. A inteligência humana é caracterizada por qualidades que as máquinas não possuem, como a capacidade de sentir, amar, e experimentar o mundo de maneira subjetiva e moral.
A IA, como qualquer tecnologia, apresenta dois lados: pode ser uma força para o bem ou para o mal, dependendo de como é usada. Esta dualidade reflete o ensino católico sobre a natureza ambivalente da tecnologia. Ferramentas técnicas podem ser usadas para promover o bem-estar humano ou podem ser abusadas de maneiras que desumanizam e controlam. Como o Papa Francisco aponta, o coração humano—o centro moral e espiritual da pessoa—determina a utilização de tais ferramentas.
Um dos maiores perigos apresentados pela IA é sua capacidade de distorcer a realidade, criando “poluição cognitiva”. Isto se manifesta na forma de desinformação e “fake news”, onde narrações falsas são apresentadas de forma convincente como verdadeiras, influenciando indevidamente a opinião pública. Tecnologias como “deep fake” exacerbam esse problema, criando representações falsas que podem ser indistinguíveis da realidade. Esta capacidade de distorcer a verdade apresenta desafios significativos para a comunicação e a sociedade, exigindo um rigoroso escrutínio e regulamentação ética.
O Papa Francisco salienta a necessidade de uma regulação ética da IA. Sem uma governança adequada, a IA pode aprofundar desigualdades sociais, invadir privacidades e potencializar abusos de poder. As regulamentações devem garantir que a IA seja usada de forma justa e ética para que proteja a dignidade humana e promova o bem comum.
Apesar dos riscos, a IA também pode oferecer contribuições significativas para a comunicação. Ao apoiar o jornalismo, melhorar a precisão e a relevância da informação, e permitir uma comunicação mais eficaz, a IA pode enriquecer a sociedade. “A utilização da inteligência artificial poderá proporcionar um contributo positivo no âmbito da comunicação, se não anular o papel do jornalismo no local, antes pelo contrário se o apoiar; se valorizar o profissionalismo da comunicação, responsabilizando cada comunicador; se devolver a cada ser humano o papel de sujeito, com capacidade crítica, da própria comunicação.” (Papa Francisco). No entanto, para que esses benefícios sejam realizados, a IA deve ser usada de maneira que respeite e promova a dignidade humana e a liberdade, sem substituir o papel crítico do discernimento humano.
A mensagem do Papa Francisco nos convida a refletir sobre a maneira como a IA está moldando nosso mundo e nossas interações. Enquanto exploramos as capacidades desta tecnologia, devemos também considerar suas implicações morais e éticas, garantindo que ela sirva ao bem comum e enriqueça, ao invés de diminuir, nossa humanidade. A “sabedoria do coração”, como propõe o Papa, deve orientar a utilização dessas tecnologias de maneira que priorize a integridade humana, a compaixão e a verdade, em vez de se deixar levar apenas pela eficiência tecnológica ou pela maximização de lucros.
Fonte: CNBB